O caderno de Dylan Thomas que a criada da sogra salvou das chamas

A leiloeira Sotheby's vai levar à praça em Dezembro um caderno com poemas manuscritos do autor galês, que se encontrava há décadas nas mãos dos herdeiros de Louie King, empregada doméstica em casa da sogra de Dylan Thomas, que lhe entregou o caderno para que o queimasse.

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Nenhum dos poemas agora descobertos é inédito DR

Um caderno do poeta, dramaturgo e ficcionista galês Dylan Thomas (1914-1953), com um extenso conjunto de poemas manuscritos, apareceu inesperadamente nas mãos dos herdeiros de Louie King, a empregada doméstica da sogra de Thomas, Yvonne Macnamara. O caderno, cuja descoberta está a entusiasmar os especialistas na obra de Dylan Thomas, de quem se comemora este ano o centenário do nascimento, vai ser leiloado em Londres pela Sotheby’s, no dia 9 de Dezembro, com um preço de base de 180 mil euros.

Juntamente com o caderno, a Sotheby’s vai leiloar uma carta escrita pelo punho de Thomas que mostra bem o pouco apreço que este nutria pela sogra: “Este pedaço de campo inglês aplana-te a inteligência (…)", diz o  poeta, lamentando-se de que a única coisa que tem para fazer é “ficar sentado a odiar a sogra” e “resmungar a respeito dela no silêncio triste e pegajoso do quarto-de-banho”.

A sogra, mãe de Caitlin Macnamara (1913-1994), uma dançarina de origem irlandesa com quem Thomas se casou em 1937, pagava-lhe na mesma moeda, como sugere o facto de ter dado ordens à criada para queimar o caderno do genro. Numa nota que deixou escrita na capa do caderno, Louie King, que morreria em 1984, explica: “Este livro de poemas de Dylan Thomas estava junto com um monte de papéis que me foram dados para queimar na caldeira da cozinha. Salvei-o e esqueci-me dele até ter lido a notícia da sua morte."

Dylan Thomas, que escreveu alguns dos mais célebres poemas da lírica inglesa do século XX, como And death shall have no dominion ou Do not go gentle into that good night, morreu precocemente em Novembro de 1953, quando se encontrava em Nova Iorque para uma digressão literária.

John Goodby, editor da sua poesia reunida, considerou já o aparecimento deste caderno “a mais importante descoberta” de manuscritos de Dylan Thomas, “talvez desde 1941, quando [o poeta] vendeu alguns dos seus cadernos à Universidade de Buffalo”.

Nenhum dos poemas é inédito, e todos eles aparecem nos primeiros livros de Dylan Thomas, 18 Poems (1934) e 25 Poems (1936). “Mas não se conhecia nenhuma versão manuscrita de alguns destes poemas”, sublinha Goodby. E se vários destes manuscritos são poemas passados a limpo, outros, diz ainda este especialista, “parecem-se mais com rascunhos e permitem-nos ver como ele chegou a uma determinada formulação”.

É o caso da sequência de sonetos Altarwise by Owl-light, considerada um dos mais complexos e obscuros poemas de Thomas, que surge no caderno com múltiplas anotações e alterações significativas face à versão publicada. “Este caderno pode ser-nos muito útil para estudarmos a evolução poética de Dylan Thomas”, garante Goodby, adiantando que “gostaria de ver” a Biblioteca Nacional do País de Gales ou a British Library a “fazer uma oferta” no leilão de 9 de Dezembro para evitar que o caderno saia do país.

O perito em manuscritos literários Gabriel Heaton já certificou a autenticidade do documento, comentando que se trata de “um achado inesperado", uma vez que ninguém sabia da existência deste caderno, nem sequer os maiores especialistas em Dylan Thomas.

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