Morreu Richard Attenborough, o realizador de Gandhi e o avô visionário de Parque Jurássico

Actor, realizador e produtor, Attenborough foi descrito como “o melhor e mais decente ser humano no negócio do cinema”.

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Attenborough em 2007, no Festival Internacional de Toronto Mike Cassese/Reuters
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Attenborough em 2007 com a sua mulher AFP
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Com o então primeiro-ministro britânico Gordon Brown e Nelson Mandela, em 2007 Reuters
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Richard Attenborough fora em tempos considerado pelo argumentista William Goldman “de longe o melhor e mais decente ser humano que alguma vez encontrei no negócio do cinema”. Actor, realizador e produtor, Attenborough morreu neste passado domingo, poucos dias antes de comemorar o seu 91º aniversário, na casa de saúde londrina onde residia com a mulher.

Ausente do olhar público há vários anos e confinado a uma cadeira de rodas, Attenborough é hoje recordado mais como o realizador de Gandhi (1982) e como o milionário fundador do Parque Jurássico de Steven Spielberg. Mas, antes de passar para trás da câmara (estreando-se em 1969 com a adaptação do musical satírico do West End londrino Oh! What a Lovely War), fora um dos mais populares e admirados actores britânicos do pós-II Guerra Mundial.

Formado pela Academia Real de Artes Dramáticas, estreou-se no cinema sob a batuta de David Lean e Noël Coward num pequeno papel em Sangue, Suor e Lágrimas (1942), mas foi a sua interpretação de um pequeno criminoso local em Morte em Brighton (1947), de John Boulting, baseado num guião de Graham Greene, que o popularizou. A sua fama britânica e europeia extravasaria finalmente para Hollywood ao contracenar com Steve McQueen em A Grande Evasão (1963), seguindo-se papéis de peso em filmes como Séance in a Wet Afternoon (1964), Revolta em Batasi (1964) ou O Violador de Rillington (1971).

Filho de um académico da universidade de Cambridge, era repetidamente chamado para papéis de aristocrata ou oficial colonial, e tratava do mesmo modo políticos, aristocratas, técnicos ou transeuntes – a todos, de Margaret Thatcher ao electricista do plateau, chamava “darling”. Como realizador, filmou a juventude de Winston Churchill (em O Jovem Leão, 1972) e uma desastrosa operação da II Guerra Mundial (Uma Ponte Longe Demais, 1977), bem como a vida do activista anti-apartheid sul-africano Steven Biko, interpretado por Denzel Washington (nomeado para o Óscar), em Grita Liberdade (1987).

Christopher Hart, escrevendo no jornal Sunday Times, chamara a Attenborough, que foi feito par do reino em 1993, “um esquerdista caviar à antiga, uma massa de boas causas e inconsistências”, partilhando uma visão do cinema que fosse simultaneamente entretenimento e comentário social. Amanda Nevill, directora do British Film Institute, define-o como “alguém que compreendia que o cinema podia ser uma ferramenta poderosa que podia conquistar corações e ajudar a mudar o mundo”.

A prova do seu empenho em está nos vinte anos em que batalhou incessantemente para levar a bom porto o projecto da sua vida, uma biografia de Mahatma Gandhi, o apóstolo da não-violência que liderou o movimento indiano pela independência do império britânico. Attenborough hipotecou a sua casa londrina e aceitou todo o tipo de papéis secundários a fim de poder financiar o filme. O filme em que nenhum estúdio acreditava acabaria por ser nomeado para onze Óscares da Academia, e Gandhi venceria oito estatuetas incluindo Melhor Filme, Melhor Realizador e Melhor Actor para Ben Kingsley. Num depoimento, Kingsley agradeceu a confiança que Attenborough havia colocado nele ao entregar-lhe o papel principal de um projecto que levara 20 anos a concretizar.

O sucesso de Gandhi não foi, contudo, igualado na sua obra posterior. Dirigiu a mal recebida adaptação para cinema do lendário musical da Broadway A Chorus Line (1985) e enfrentou um fracasso colossal com a sua biografia de Charles Chaplin, Chaplin (1992), um outro projecto longamente acarinhado, que valeu uma nomeação a Robert Downey Jr. para o Óscar de Melhor Actor mas foi destruído pela crítica. A ironia é que fora Chaplin a acordar a sua vocação de actor, após ter assistido a uma sessão de A Quimera do Ouro.

Dois Estranhos, um Destino (1993), sobre o romance entre a poetisa americana Joy Gresham e o escritor e académico britânico C. S. Lewis (interpretados respectivamente por Debra Winger e Anthony Hopkins), reconciliou Attenborough com a crítica e o público, mas nenhum dos seus filmes posteriores obteve grande repercussão. A sua última realização foi O Elo do Amor (2007), uma comédia romântica com Shirley MacLaine e Christopher Plummer, e surgira pela última vez no écrã como actor em Elizabeth (1998), de Shekhar Kapur, contracenando com Cate Blanchett.

Irmão mais velho do popular naturalista e apresentador televisivo David Attenborough, Attenborough deixa a esposa, Sheila, com quem era casado desde 1945, e dois filhos, o encenador Michael e a actriz Charlotte (a sua terceira filha, Jane, morreu em 2004, na sequência de um tsunami, na Tailândia).

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