Morreu Gene Wilder, o primeiro Willy Wonka do cinema

Gene Wilder, cúmplice de Mel Brooks nos seus melhores filmes e um dos actores mais populares da comédia americana dos anos 1970, morreu aos 83 anos em sua casa

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Gene Wilder Mychele DANIAU
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Gene Wilder com a sua mulher Gilda Radner, na 10.ª edição do Festival Americano de Cinema de Deauville, em Setembro de 1984 AFP/MYCHELE DANIAU
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O actor nos ensaios de uma das cenas do filme "Laughter on the 23rd Floor", em Outubro de 1996 Reuters/SHAWN BALDWIN
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Gene Wilder segura uma cópia do seu livro "The Woman Who Wouldn't", na livraria Barnes&Noble, na Califórnia, 2008 AFP/CHARLEY GALLAY

Gene Wilder, que morreu no domingo aos 83 anos em sua casa no estado americano do Connecticut, era um dos actores mais populares e mais reconhecíveis da comédia americana dos anos 1970. Foi cúmplice regular de uma das suas figuras mais importantes, Mel Brooks, a quem deve em grande parte a sua popularidade e as suas duas nomeações para os Óscares, e teve uma parceria fugaz mas de grande sucesso com outra estrela cadente da comédia americana desses anos, Richard Pryor. Wilder experimentou até por quatro vezes a realização, com níveis diferentes de sucesso e um filme que ficou na memória por razões alheias – A Mulher de Vermelho (1984), cuja banda-sonora, escrita por Stevie Wonder, incluia o mega-êxito I just called to say I love you.

Se o que recordamos de Wilder são as suas comédias dirigidas por Brooks – Por Favor Não Matem as Velhinhas (1971), Balbúrdia no Oeste (1974) e Frankenstein Júnior (1974) –, o actor, nascido Jerome Silberman em Milwaukee em 1933, tinha começado no teatro. Estudou primeiro com Herbert Berghof e depois no célebre Actors Studio, e representou Brecht, Shakespeare e Arthur Miller. (O seu encontro com Mel Brooks, aliás, derivou da sua contracena na Mãe Coragem de Brecht com a sua esposa, a actriz Anne Bancroft.) Estreou-se no cinema com um pequeno papel secundário em Bonnie e Clyde (1967) de Arthur Penn, mas seria à comédia que ficaria indelevelmente ligado, aperfeiçoando uma imagem de homem normal ou vizinho do lado atirado para situações completamente improváveis.

Primeiro, através de Brooks, com quem recebeu duas nomeações para o Óscar – melhor actor secundário, como um contabilista atraído pela Broadway, em Por Favor Não Matem as Velhinhas (que seria mais tarde transformado num musical de enorme sucesso sob o seu título original, Os Produtores); depois como co-argumentista da paródia aos filmes de terror Frankenstein Júnior, onde interpretava igualmente o papel do criador do monstro. Seguir-se-ia um dos sketches de O ABC do Amor, de Woody Allen (1972), no papel de um médico apaixonado por uma ovelha. Finalmente, Wilder fez uma dupla que parecia imparável com Richard Pryor, um dos mais controversos e aclamados comediantes stand-up americanos da década (e co-argumentista de Balbúrdia no Oeste, onde deveria ter interpretado um dos papéis principais). Filmaram juntos O Expresso de Chicago, de Arthur Hiller (1976), e Dois Amigos em Apuros, de Sidney Poitier (1980), dois grandes êxitos de bilheteira, mas os problemas de drogas e de saúde de Pryor impediram a continuação da dupla, com duas tentativas posteriores, em Cegos, Surdos e Loucos (1989) e Outra Vez Tu? (1991), a encontrarem o fracasso.

Foi também na comédia que Wilder passou para o outro lado da câmara dirigindo quatro longas-metragens no género, As Aventuras do Irmão Mais Esperto de Sherlock Holmes (1975), O Maior Amante do Mundo (1977), A Mulher de Vermelho (1984) e Lua-de-Mel com Fantasmas (1986). Infelizmente, nenhuma delas é hoje recordada, à excepção de A Mulher de Vermelhoremake americano da comédia francesa As Belas Mulheres dos Outros cujo sucesso comercial foi transportado pela banda-sonora escrita por Stevie Wonder.

Mas um dos papéis pelos quais é mais recordado só o seria a posteriori. Foi Wilder quem interpretou pela primeira vez no cinema Willy Wonka, o bizarro mestre chocolateiro criado pelo escritor Roald Dahl, em A Maravilhosa História de Charlie, de Mel Stuart (1971). Longe de ser um êxito aquando da estreia, o filme tornar-se-ia um clássico através da televisão e do vídeo, e a versão de Tim Burton com Johnny Depp (Charlie e a Fábrica de Chocolate) foi recebida com protestos de muita gente para quem Wilder era o único Willy Wonka possível.

Gene Wilder praticamente abandonou o cinema a partir de meados dos anos 1980 (voltando esporadicamente nos anos 1990 e terminando com duas participações especiais na série Will & Grace em 2003 que lhe valeram um Emmy), mas isso não se deveu ao insucesso de Lua-de-Mel com Fantasmas nem a qualquer tipo de frustração com Hollywood. O seu “desaparecimento” deveu-se à doença de Gilda Radner, a sua terceira mulher, contemporânea de John Belushi e Bill Murray no elenco original do célebre programa Saturday Night Live. Conheceram-se em 1982 nas rodagens de O Casal Trapalhão (uma paródia de Intriga Internacional pensada originalmente para Wilder e Pryor), e casaram-se em 1984, mas a actriz foi diagnosticada com cancro do ovário em 1986 e Wilder parou a carreira para tomar conta da esposa. Devastado pela sua morte em Maio de 1989, o actor dedicou-se à recolha de fundos e ao activismo contra a doença. Durante a década de 2000 virou-se para a escrita, publicando uma autobiografia, bem como três romances e uma colecção de contos.

Diagnosticado com linfoma não-Hodgkin em 1999, do qual recuperaria por completo, Wilder morreu de complicações da doença de Alzheimer na sua casa de Stamford a 28 de Agosto. Nas palavras do sobrinho, Jordan Walker-Pearlman, que anunciou a morte esta segunda-feira, o actor, casado desde 1999 com Karen Webb Boyer e sem filhos de nenhum dos quatro casamentos, mantinha a capacidade de raciocinar e de reconhecer os familiares.

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