Kirk Douglas faz cem anos

Uma festa oferecida pelo seu filho Michael Douglas assinala esta sexta-feira a chegada do icónico actor de Hollywood ao clube dos centenários.

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Kirk Douglas em 2008 Fred Prouser/ REUTERS
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Com a sua mulher, Ann Buydens, em 2013 em Hollywood /Danny Moloshok/ REUTERS
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Com o filho Michael Douglas, em 2009 Danny Moloshok/ REUTERS
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Com o realizador Quentin Tarantino, no Festival de Santa Bárbara, Califórnia, em 2009 Michael Buckner/ Getty Images/AFP

“Tive a sorte de encontrar a minha alma gémea há 63 anos, e acredito que o nosso maravilhoso casamento e as nossas discussões nocturnas me ajudaram a sobreviver a tudo”. É a justificação de Kirk Douglas, que celebra esta sexta-feira o seu centésimo aniversário, para a sua invulgar longevidade.

O icónico actor de Hollywood casou-se em segundas núpcias, em 1954, com a belga-americana Anne Buydens, que um dia comparou a vida com o marido a “estar num belo jardim ao pé de um vulcão que pode entrar em erupção a qualquer momento".  

Mas talvez haja alguma justiça poética no facto de um actor que tinha um talento particular para interpretar personagens intensas, tenazes, resilientes, ter tido direito a um suplemento de vida na sua existência civil.

Os cem anos de Kirk Douglas vão ser festejados esta sexta-feira com uma grande festa na Califórnia, oferecida pelo seu filho Michael, que lhe seguiu as pisadas no grande ecrã e lhe herdou a carismática covinha no queixo, e pela sua mulher, a actriz Catherine Zeta-Jones.  

Forçado a abrandar as suas aparições no cinema após um AVC sofrido em 1996, que o deixou com problemas de fala, o actor, confirmando que a sua proverbial determinação ainda não se extinguiu, tem estado a treinar-se com um terapeuta para ser capaz de fazer um breve discurso de agradecimento.

Filho de imigrantes russos de origem judaica, Issur Danielovitch, que o mundo viria a conhecer como Kirk Douglas, viveu uma infância pobre, entre seis irmãos, e já tinha 30 anos quando Hollywood lhe deu uma chance no filme O Estranho Amor de Martha Ivers, de Lewis Milestone, onde interpreta o marido alcoólico e não amado de Barbara Stanwyck, uma personagem que antecipa o extenso cortejo de figuras intensas, iradas, vulneráveis, contraditórias, que interpretará em mais de 90 filmes.

Fazendo de algum modo a transição dos actores clássicos de Hollywood para os papéis mais interiorizados e torturados da geração de Marlon Brando, Montgomery Clift ou James Dean, Kirk Douglas trabalhou com os melhores realizadores do seu tempo – Jacques Tourneur, Michael Curtiz, Billy Wilder, William Wyler, Howard Hawks, Vincente Minelli, Stanley Kubrick, Joseph L. Mankiewicz ou Elia Kazan, para citar apenas alguns – e recebeu a primeira de três nomeações para o Óscar ainda nos anos 40, com o seu papel de boxeur em O Grande Ídolo (1949), de Mark Robson. Dois anos antes contracenara com Robert Mitchum e Jane Greer num dos grandes filmes da época: O Arrependido, de Tourneur.

E entra na década seguinte com uma sucessão de papéis marcantes: o músico de jazz Rick Martin em Duas Mulheres, Dois Destinos (1950), de Michael Curtiz, o repórter frustrado e cínico à procura dum “furo” em O Grande Carnaval (1951), de Billy Wilder, o memorável polícia de História de Um Detective (1951), de William Wyler, o produtor de cinema sem escrúpulos em Cativos do Mal (1951), de Vincente Minelli, que lhe valeu a segunda nomeação para um Óscar, ou o protagonista do western A Céu Aberto, de Howard Hawks.

A terceira nomeação à estatueta dourada viria em 1956 com a A Vida Apaixonada de Van Gogh (1956), também de Minelli, onde dá corpo ao génio torturado do pintor. Teria de esperar mais 40 anos até receber finalmente um Óscar honorário por ter sido sempre “uma força criativa e moral na comunidade do cinema”.

Em 1957, Douglas filma com Stanley Kubrick, que não gozava ainda da notoriedade que adquiriria nos anos 60, Horizontes de Glória, e em 1960 volta a colaborar com o cineasta em Spartacus, um filme que ajuda a acabar com a "Lista Negra" de Hollywood ao referir o argumentista banido Donald Trumbo nos créditos oficiais do filme.

Embora contracenasse com grandes actrizes, de Laureen Bacall e Barbara Stanwyck a Jane Greer ou Faye Dunaway, talvez Douglas não tenha tido com nenhuma delas uma “química” cinematográfica tão óbvia como com Burt Lancaster, com quem entra em sete filmes entre 1948 e 1986, incluindo o western clássico Duelo de Fogo (Gunfight at the O.K. Corral, 1957), de John Sturges, e o thriller político Sete Dias em Maio (1964), de John Frankenheimer.

O Compromisso (1969), de Elia Kazan, O Réptil (1970), de Joseph L. Mankiewicz, e The Fury (1978), de Brian De Palma, são alguns entre muitos outros filmes interpretados por Kirk Douglas que mereceriam ser mencionados.

O actor continuou a representar mesmo depois de ter escapado à morte por uma unha negra em 1991, quando o helicópetro em que seguia embateu com um pequeno avião, acidente no qual morreram duas pessoas, e que levou Douglas a reaproximar-se do judaísmo no qual fora criado.  

Nos últimos anos, o actor e a sua mulher têm-se dedicado à filantropia, já anunciaram tencionar deixar a maior parte da sua fortuna a organizações de beneficência e financiaram recentemente a renovação dos recreios de 400 escolas californianas.

lmqueiros@publico.pt

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