Israel oferece viagens de luxo ao país aos nomeados para os Óscares

Estratégia publicitária está a motivar polémica, e levou já também a própria Academia de Hollywood a apresentar queixa em tribunal.

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Mark Ruffalo na cerimónia dos Óscares do ano passado MARK RALSTON/ AFP

A cerimónia dos Óscares de Hollywood não se resume, como sabemos, à mediática parada de estrelas entre a passadeira vermelha e o palco do Dolby Theater em Los Angeles, seguida dos discursos, lágrimas e aplausos para os vencedores. Acontecem muitas outras coisas nos bastidores desta festa da indústria americana do cinema. E mesmo os “perdedores” da cerimónia acabam por sair a ganhar, e não apenas pelos reflexos das nomeações nas suas carreiras. Há lucros imediatos, nomeadamente para o conjunto dos actores e realizadores nomeados, que normalmente são presenteados com uma suposta “caixa surpresa” de prendas de diferentes proveniências, e que nos últimos anos tem sido organizada pela empresa Distinctive Assets.

Viagens em primeira classe, aluguéis de carros topo-de-gama, packs de toilette e artigos e serviços de tratamento de pele, visitas guiadas a lugares de sonho… De tudo isto se faz normalmente este cabaz destinado às personalidades mais mediáticas dos Óscares: os 25 nomeados para melhor realizador e melhores actores principais e secundários, a que se acrescenta, este ano, o nome de Chris Rock, o anfitrião da cerimónia marcada para domingo, 28 de Fevereiro.

Mas esta prática, que já no ano passado tinha originado o protesto da própria Academia de Hollywood, por abuso e apropriação da marca, ganhou este ano contornos de polémica política. É que o Estado de Israel decidiu contratar os serviços da Distinctive Assets e fazer incluir no cabaz uma visita personalizada ao país, com viagem em 1.ª classe, alojamento em hotéis de luxo e um circuito turístico com acompanhamento personalizado… no valor global de 55 mil dólares (cerca de 50 mil euros).

Uma viagem de duas semanas ao Japão, o aluguer de um Audi 4, uma caixa com cremes anti-envelhecimento e sessões com um especialista em nutrição fazem também parte do cabaz deste ano, que a imprensa norte-americana avalia num total acima dos 200 mil dólares, um aumento superior a 30% relativamente ao cabaz de 2015.

“Cada uma das celebridades tem potencialmente milhões de seguidores; se cada um dos que nos visitar fizer uma selfie e a puser em linha, o impacto é enorme”, disse à AFP Amir Halevy, director geral do Ministério do Turismo de Israel.

Este organismo governamental aceitou a proposta da ExploreIsrael.com – uma empresa fundada por dois agentes de viagem ultra-ortodoxos de Brooklyn – de entrar nesta estratégia de publicidade, com a qual Israel vê também uma oportunidade para quebrar o seu isolamento a nível internacional.

“Os Óscares são um bom programa, porque não há muitos nomeados, o que nos permite oferecer uma viagem verdadeiramente topo de gama”, realçou Sam Gee, um dos proprietários da ExploreIsrael.com, fazendo inclusivamente uma comparação com os Grammys, os prémios da música, onde seria necessário multiplicar as ofertas por centena e meia de nomeados.

A propósito dos Grammys, a AFP lembra que, no ano passado, Kim Kardashian e Kanye West fizeram uma visita a Jerusalém, onde foram recebidos pelo presidente da câmara, Nir Barkat, que lhes pediu que se tornassem “embaixadores da cidade”, e anunciassem aos seus fãs que “todo o mundo é bem-vindo”.

Se esta visita e esta declaração criaram na altura grande controvérsia, devido à situação do povo palestiniano e da própria cidade de Jerusalém, cuja zona oriental foi anexada à força pelo exército israelita, a associação do país ao cabaz dos Óscares deste ano motivou novas reacções de protesto, inclusivamente dentro da comunidade de Hollywood e potenciais “visados” pelas prendas. Mark Ruffalo e Mark Rylance (ambos nomeados na categoria de melhor actor secundário por O Caso Spotlight)  segundo a AFP  vieram manifestar publicamente a sua crítica à política de ocupação de Israel do território palestiniano. E os realizadores britânicos Mike Leigh e Ken Loach, mesmo se ausentes das nomeações deste ano, exortaram os nomeados a oferecer os presentes a refugiados palestinianos.

A AFP cita também um militante palestiniano, Omar Barghouti, que critica Israel por ultimamente ter multiplicado “as iniciativas para tentar subornar, intimidar ou forçar as celebridades a alinhar com as suas posições”.

Paralelamente a esta contestação, também a Academia das Artes e Ciências Cinematográficas decidiu, este ano, apresentar queixa em tribunal contra a acção da Distinctive Assets, acusando-a de utilização abusiva da marca da instituição e dos Óscares.

“O ano passado, a Academia tentou regulamentar a representação falsa e ilegal da Distinctive Assets sem recorrer ao processo judicial. Agora não temos outra via se não apresentar queixa”, disse um porta-voz da instituição de Hollywood, citado pela revista Variety.

 

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