Escavações no metro do Rio de Janeiro revelam objectos arqueológicos do século XIX

Arqueólogo responsável pelos trabalhos diz que há coincidência entre as peças encontradas no Brasil e outras, da mesma época, achadas em escavações europeias, por exemplo, em Amesterdão.

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Peças de porcelana, enfeites de jardim, pratos, talheres, moedas e até penicos fazem parte dos novos achados arqueológicos descobertos durante a perfuração para as obras da linha 4 do metro do Rio de Janeiro, no Brasil.

As últimas escavações, realizadas nos bairros Ipanema e Leblon – hoje bairros nobres de classe média-alta –, ajudam a contar um pouco da história das primeiras chácaras (propriedades) que ali existiam.

“Fazemos o monitoramento arqueológico das escavações e, a qualquer momento, onde há uma intervenção no solo, a equipa é mobilizada para retirar esse material”, contou à agência Lusa Cláudio Prado de Mello, o arqueólogo responsável pelo trabalho, e que lidera uma equipa de 13 investigadores.

Entre os achados mais significativos, e entre a centena e meia de peças identificadas na última fase da investigação que já permitiu reunir mais de 1.700 objectos de interesse histórico nos dois bairros, segundo noticia o jornal Globo , está uma ampola com o líquido original preservado, além de quatro penicos de metal, cobertos por uma camada de esmalte, inclusive com resíduos orgânicos, que foram encaminhados para a análise química.

“Na ampola, aquilo pode ser um remédio ou mesmo um veneno”, admite o arqueólogo, a ressaltar que o conteúdo dos penicos pode levar ainda a descobertas sobre doenças parasitárias que afectavam a sociedade da época.

Outra peça que pode ter valor histórico significativo é um artefacto de cerâmica, cuja origem se suspeita ser quilombola (comunidades formadas por ex-escravos que fugiam das fazendas). “Há suspeita de ser quilombola, mas só podemos afirmar após aprofundar a análise, com uma documentação maior. Esse tipo de material é muito susceptível de se ir espalhando, com obras, passar de um local para outro; então seria leviano falar baseado num pedacinho”, disse Cláudio de Mello.

O conjunto das peças que vão sendo encontradas vão ser encaminhadas para o Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro. E, ainda segundo o Globo, o governo estadual já sugeriu ao Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) que as peças mais relevantes sejam colocadas em exposição nas estações da linha 4 do metro, à imagem do que acontece com o de Atenas.

O trabalho que tem vindo a ser efectuado no metro do Rio de Janeiro ajuda ainda a identificar os produtos que eram produzidos na Europa no século XIX e no início do século XX. Muitos objectos encontrados no Rio de Janeiro coincidem com os que são encontrados em obras com o metro da Holanda, por exemplo. “Quando vemos o catálogo do que foi encontrado no metro de Amesterdão [nas escavações para a construção da linha], é praticamente idêntico ao que a gente tem encontrado aqui”, diz o arqueólogo brasileiro, citando as garrafas de stoneweare, de uma marca alemã de água mineral, entre os achados comuns aos dois lugares.

Outro material recolhido e que animou a equipa foi uma peça de louça branca cremada, de cerca de 70 centímetros, que se acredita ser uma peça de jardim ou um suporte de luminária, possivelmente de origem portuguesa. O pesquisador acredita ainda haver hipóteses de encontrar um cemitério indígena na região, uma vez que muitas etnias enterravam os seus mortos abaixo de 1,5 metros de profundidade, nível ainda não atingido até ao momento.

“A qualquer momento, podemos fazer novas descobertas. Sabemos que em Ipanema e Leblon viviam pelo menos duas tribos, que já foram citadas por cronistas da época”, observou.

Os bairros de Ipanema e Leblon foram ocupados sistematicamente, com venda de loteamentos, apenas a partir de meados do século XIX. Antes, a região foi ocupada por alguns poucos proprietários de chácaras, que afugentaram os indígenas que viviam anteriormente no terreno.

No final do século XIX e início do século XX, a região recebeu um eléctrico, cujos trilhos praticamente intactos e restos de estruturas figuram também entre os achados.

Mas as peças agora encontradas nas escavações de Leblon e Ipanema são diferentes das que foram achadas, há cerca de um ano, na Estação da Leopoldina, no centro da cidade, na linha que liga Ipanema à Barra da Tijuca. Neste caso, foram removidos mais de 200 mil objectos, dos séculos XVII a XIX, alguns dos quais tinham inscrições que os identificavam como propriedade do Imperador D. Pedro II.


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