Ensaio sobre a fama à velha maneira de Ricky Gervais

Britânico escreveu, realizou e protagoniza Special Correspondents, filme que se estreia esta sexta-feira no Netflix. Como não podia deixar de ser, trata-se de uma sátira. Mas, segundo o criador de The Office, Special Correspondents “é o projecto mais ambicioso” que já fez.

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Eric Bana e Ricky Gervais dr

Ricky Gervais está de volta aos comandos de mais uma produção satírica, como tudo o que faz. Special Correspondents, que nesta sexta-feira se estreia no Netflix, é o seu mais recente projecto, aquele que o britânico conhecido por incomodar tudo e todos considerou já ser “o mais ambicioso” dos seus trabalhos. O filme, sobre um jornalista convencido e o seu técnico enviados para o Equador em reportagem mas que ainda antes de partir perdem os documentos, é um ensaio sobre a fama. Ou como é tentador fazer atalhos — é que os dois homens não conseguiram embarcar, mas decidem mentir e acabam então fechados num andar por cima de um restaurante espanhol, em Nova Iorque, a cobrir o iminente golpe de Estado, tal como se estivessem na linha da frente do conflito. As reportagens trazem-lhes reconhecimento, mas também muitos trapalhadas.

“É uma sátira, mas o alvo é real”, disse há dias o britânico em Paris, num evento do Netflix. “As pessoas preferem ser famosas por serem idiotas do que não serem conhecidas de todo”, defendeu Gervais, classificando Special Correspondents como “uma história humana”.

Nesta história, Ricky Gervais é Ian Finch, o técnico da rádio Q365, que sem se aperceber deita fora os documentos da viagem para o Equador. Não só os seus como os do jornalista Frank Bonneville, interpretado pelo australiano Eric Bana, conhecido por trabalhos como Munique, Hulk ou Star Trek. Enquanto não arranjam documentos novos, os dois instalam-se secretamente em Queens com a ajuda do casal Brigida e Domingo (America Ferrera e Raúl Castillo). A parti daí, os dois inventam um conflito que lhes traz fama nacional, impedindo-os de tentar viajar novamente para o Equador com medo de serem reconhecidos. Voltar atrás e contar a verdade também não é alternativa.

Gervais conta que tirou a ideia de um filme francês com o mesmo nome e realizado por Frédéric Auburtin em 2009. “Não tinha grandes planos, fiz o argumento e entreguei-o ao meu agente. Era para ser um filme [para o cinema], mas depois o Netflix comprou-o. Foi uma oferta que não podia recusar”, afirma o actor, que, mais uma vez, se aventurou não só na escrita como na realização. “Comecei a realizar para proteger a escrita. Digo o que quero dizer, o que é suposto dizer”, acrescenta o actor, que este ano apresentou pela quinta vez a gala dos Globos de Ouro, para desconforto de alguns.

Dele já se sabe que só se pode esperar o inesperado. Mete o dedo na ferida e não tem medo de ultrapassar os limites, o que já lhe valeu algumas — muitas— críticas. “E houve até quem me tivesse deixado de falar”, diz, contando que muitas vezes também não é convidado para certos eventos. “Tenho de aceitar as consequências, tenho de aceitar que algumas pessoas não vão gostar do que digo. Não me surpreende”, afirma. “Não há nada que digas que não vá ofender alguém e isso não quer dizer que estavas errado, às vezes a qualidade ofende”, continua. “Tens de ser à prova de bala. Não quero saber. Há pessoas inteligentes, mas também há pessoas muito estúpidas.”

Mas as consequências do que diz e faz chegam muitas vezes ao seu trabalho e não é por acaso que agora vemos mais vezes o britânico no Netflix. “Eu vou à BBC, mas à BBC 2”, comenta, explicando que no serviço de streaming não há qualquer espécie de segunda linha. “É perfeito. É divertido quando não temos alguém a dizer-nos o que temos de fazer. Vá lá, somos crescidos e podemos dizer o que quisermos.”

Eric Bana conta como filmar com Ricky Gervais pode ser tão divertido que fica difícil encarar aquilo como trabalho. “Senti-me em mãos seguras e não senti nunca que estava a falar com o realizador, mas apenas com um colega que tinha a liberdade do realizador para andar a gozar”, diz, explicando que foi Gervais o motivo para alinhar neste projecto. “O melhor é que ele não sabia que eu comecei na comédia, o que foi bom, porque não tive pressão.”

 O PÚBLICO viajou a convite do Netflix

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