Danças de acasalamento no Noroeste da Península

Waltz apresenta-se como uma tentativa de improvisação sobre as regras da representação dos dilemas amorosos, isto é, como uma tentativa de contar uma velha história de uma maneira nova.

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Pouco se encontra sobre a reestruturação da dívida, seja a espanhola, a portuguesa ou a grega, na colagem de cenas que a Voadora, companhia luso-galaica, trouxe ao FITEI este ano e tem levado a muitos outros lugares desde 2013.

Um dos temas que Gonçalo Amorim elegeu em entrevista ao PÚBLICO, a dita reestruturação foi aqui substituída por promessas de amor e respectivos incumprimentos, incluindo os beijos apaixonados que se dão de vez em quando, e muitos passos de dança entre uma coisa e outra. Waltz é uma coleção de variações sobre o amor, seus encantos e desencantos. Cupido, que é uma criança, como se diz às tantas na peça, dispara em todas as direções. Os seus alvos entram de peito feito na Pensão Coração, dançando valsas, polcas e fandangos, ao som dos mais variados estilos musicais. Este espectáculo é um mostruário, escolhido a dedo pelos autores, da oferta hoteleira para corações destroçados no extremo ocidental da península.

A peça tem três andamentos, muito diferentes entre si. O primeiro pode ser comparado a uma sequência de videoclips realizados ao vivo, com poses, gestos e objectos sucedendo-se em associação livre para ilustrar ou descobrir o verdadeiro significado das várias canções escolhidas. O segundo é um número de teatro cantado, passado nos bastidores de uma representação (fictícia) de Cinderela. O terceiro é um resumo da vida amorosa de uma das figuras em cena, também composto de citações e referências musicais. De facto, a peça é apresentada como uma ópera portátil, adequada ao espírito da nossa época, mas mais parece uma jukebox em rota livre.

Waltz apresenta-se como uma tentativa de improvisação sobre as regras da representação dos dilemas amorosos, isto é, como uma tentativa de contar uma velha história de uma maneira nova. Talvez seja essa a ambição de todos os amantes, frustrada ou não. É ao rever a relação entre a forma teatral, por um lado, e o assunto, por outro, neste caso o assunto sendo as danças de acasalamento, que esta peça fala de alternativas, de outras opções, enfim, das diferentes políticas de reestruturação da dívida. Do que trata? Do amor. É a maneira como trata do amor, a experiência de quem assiste, a forma particular de relacionar arte e ideologia, que é política.

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