Círculo perfeito

Um novo pico de forma para o quinteto de Dave Douglas.

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Há muito que Douglas privilegia um trabalho feito de cumplicidades, verdades partilhadas e intensa pesquisa sonora

Editado ainda em 2015, Brazen Heart, o mais recente registo do quinteto do trompetista Dave Douglas, fez parte do restrito grupo de discos editados o ano passado que fizeram a diferença. Não tanto pela inovação ou originalidade da música – apesar de Douglas ser considerado unanimemente uma das vozes mais únicas e interessantes no trompete – mas sim pela enorme consistência e maturidade de tudo o que é tocado e ainda pelo círculo perfeito formado pelos 11 temas que integram Brazen Heart, das primeiras notas do tema título aos últimos sons de Wake Up Claire.

Há muito que Douglas vem privilegiando um trabalho a longo prazo, feito de cumplicidades, verdades partilhadas, e uma intensa pesquisa sonora dentro dos bem estabelecidos parâmetros da sua própria obra. Ao invés de um jazz surpreendente, inovador e pleno de improvisos extraordináriamente exuberantes, de que Douglas é comprovadamente capaz, temos uma música que amplia e depura a obra já existente, com uma componente improvisada ligada de forma directa e consistente às estruturas compostas. Depois de Be Still (2012) e Time Travel (2013), ambos gravados com a mesma banda, um poderoso quinteto que integra ainda Jon Irabagon (saxofone), Matt Mitchell (piano), Linda Oh (contrabaixo) e Rudy Royston (bateria), sentimos que é atingido em Brazen Heart um novo ponto alto na discografia de Douglas, com a vocação mainstream do grupo a surgir mais relaxada e descontraída, e os temas, desta vez mais complexos e exigentes, sem voz, a soarem mais vitais. O primeiro momento de excepção é alcançado logo ao segundo tema, na extraordinária versão de Deep River, um dos espirituais incluídos no repertório do disco, a evocar a morte recente do irmão de Douglas, falecido com cancro poucos meses antes da edição do álbum.

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