Carlos Moura-Carvalho sai da Direcção-Geral das Artes com críticas ao processo

Ministério da Cultura anunciará por estes dias os novos responsáveis pelo organismo.

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Palácio da Ajuda, sede do Ministério e da Secretaria de Estado da Cultura Carlos Lopes

A inauguração do Pavilhão de Portugal na Bienal de Arquitectura de Veneza, na passada quarta-feira, foi o último acto público de Carlos Moura-Carvalho como director-geral das Artes, que nessa altura já sabia que seria substituído no cargo no último dia de Maio.

A apresentação do projecto Neighbourhood, centrado na obra de Álvaro Siza no domínio da habitação social, contou com a presença do primeiro-ministro António Costa e do secretário de Estado da Cultura Miguel Honrado. Mas nenhum deles falou com o demitido director-geral das Artes. “Nem uma palavra! Foi uma coisa que me entristeceu, a mim e à minha equipa”, lamenta Moura-Carvalho, que ainda tentou, no local, chegar à fala com António Costa na expectativa de algum explicação para a decisão do Ministério da Cultura (MC) de o exonerar passados apenas 11 meses sobre a sua entrada em funções.

“O Pavilhão de Portugal foi muito bem recebido, e é uma coisa que orgulha todos os portugueses”, salienta o responsável pela escolha de Siza e pelo projecto que foi montado em Veneza pelos curadores Nuno Grande e Roberto Cremascoli.

Na altura da inauguração, o director-geral das Artes tinha já contestado, por carta enviada ao MC, os pressupostos da sua substituição e pedido justificações "mais claras" sobre a decisão. À chegada a Lisboa, na sexta-feira, uma resposta da Secretaria de Estado da Cultura (SEC) – que tutela directamente a DGArtes – reafirmava, “sem acrescentar outros fundamentos”, a "necessidade de imprimir uma nova orientação” à DGArtes.

Ao PÚBLICO, o gabinete de imprensa do MC reafirmou esta segunda-feira que a substituição na DGArtes resulta da "necessidade de uma nova estratégia e abordagem na execução das políticas culturais e de apoio às artes". Sublinhando que o MC comunicou já "pessoal e formalmente" as razões da demissão a Moura-Carvalho, o gabinete acrescenta que a DGArtes deve "assumir-se como plataforma de diálogo e de proximidade com os agentes culturais".

Os novos responsáveis pelo organismo serão anunciados por estes dias, acrescentou o MC, que, além do substituto de Moura-Carvalho, terá de nomear também um subdirector, em substituição de Joana Fins Faria, que pediu a exoneração no passado mês de Abril.

Críticas da tutela

Em meados deste mês, aquando da primeira audição no Parlamento dos novos responsáveis pelo MC, o secretário de Estado Miguel Honrado criticou o trabalho da DGArtes dizendo que estava reduzida à missão de distribuição de financiamentos.

Numa nota enviada à comunicação social, Moura-Carvalho justifica-se com o facto de ter estado a gerir “um orçamento que é o mais baixo de sempre”, e lembra que, no final de Maio, a DGArtes não tinha ainda “orçamento para abrir concursos”. O MC prometeu entretanto lançar os concursos para os apoios pontuais a partir de Junho e "honrar os acordos bienais atribuídos em 2015", lembra agora o gabinete.

Ainda sobre a sua substituição, Moura-Carvalho considera que o processo “põe em causa a legitimidade das nomeações da CRESAP”. Recorde-se que o recém-demitido director assumiu o cargo em Junho do ano passado, na sequência de um concurso público que deu também origem a uma polémica, quando a SEC era ainda dirigida por Jorge Barreto Xavier, no Governo PSD/CDS.

“Sou independente e assinei uma carta de missão em que me comprometi com determinados objectivos que tenho cumprido leal e escrupulosamente”, defende-se aquele gestor licenciado em Direito que agora vai regressar ao seu lugar de origem, o Gabinete de Estratégia, Planeamento e Avaliação Culturais.

Explicando ao PÚBLICO que não irá fazer nenhuma nova contestação da sua exoneração, Moura-Carvalho diz, no entanto, temer pelo futuro de projectos que tinha agendado para o horizonte dos cinco anos normais de um mandato. Não será o caso das representações nacionais nas próximas bienais de design de Londres e das artes de São Paulo e de Veneza, cujos programas e artistas “já estão delineados" – "e espero que se mantenham”, diz o ainda director-geral.

Naquela que será a primeira edição da Bienal de Design de Londres (7 a 27 de Setembro próximo), e que terá como tema genérico Utopia by Design, Portugal estará representado com um projecto elaborado pela DGArtes em parceria com o Instituto Gulbenkian de Ciência: a curadoria será de Manuel Lima, um designer radicado em Nova Iorque, e a instalação reunirá um trabalho digital de "visualização computacional de Pedro Miguel Cruz e uma exploração artística de biotecnologia de Marta Menezes", avança Moura-Carvalho.

Também no final do ano (10 de Setembro a 11 de Dezembro), quatro artistas – Carla Filipe, Gabriel Abrantes, Lourdes Castro e Priscila Fernandes – representarão o país na Bienal de Artes de São Paulo.

E já anunciada publicamente está também a presença de José Pedro Croft na próxima Bienal de Artes de Veneza (13 de Maio a 26 de Novembro de 2017), onde irá completar com uma instalação de grande formato e uma fonte o trabalho reiniciado este ano com o Pavilhão de Portugal na urbanização do Campo de Marte na ilha da Giudecca.

Se tudo leva a crer que estes programas irão avançar – acredita Moura-Carvalho –, já dois dos seus outros projectos, o Plano Nacional para as Artes e a Estratégia Comum de Internacionalização para as Artes, careceriam de mais tempo. “Saio com frustração por não ter podido concluir processos como estes, que são de médio e longo prazo”, lamenta o futuro ex-director.

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