Cabeça, mãos e pés

Com aquele que é o mais ambicioso projecto da sua carreira, Steve Coleman reafirma-se como um dos grandes pensadores no jazz.

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Steve Coleman encontrou nova fonte de inspiração nos padrões de movimento das articulações do ser humano

A entrada de Steve Coleman no mundo do jazz causou na altura grande impacto. As suas primeiras gravações editadas na label europeia JMT — Motherland Pulse,World Expansion e On the Edge of Tomorrow — estabeleceram novas coordenadas no jazz ao afirmar as ideias e os conceitos de um grupo de músicos que não se identificava com nenhum dos vectores já estabelecidos. Enquadrando esses novos valores sob a designação M-Base (macro-basic array of spontaneous extemporization) Coleman estabeleceu-se como líder de um movimento que nunca mais pararia de evoluir. 

Hoje, 30 anos passados sobre essas primeiras gravações, e um ano após ter recebido o prestigiado MacArthur Fellowship Genius Grant, o saxofonista norte-americano dá continuidade à sua permanente e rigorosa pesquisa sobre os padrões de repetição que podem ser encontrados na natureza ou no elemento humano, e edita aquele que é o mais ambicioso projecto da sua carreira — Synovial Joints. Se o seu registo anterior, Functional Arrhythmias, se baseava nas irregularidade dos batimentos cardíacos e impulsos nervosos do corpo humano, aqui a fonte de inspiração é encontrada nos padrões de movimento das articulações: como elas rodam, dobram ou flectem. Para este novo projecto, e recorrendo aos fundos obtidos não apenas através da bolsa MacArthur, mas também do Guggenheim Fellowship e da Doris Duke Charitable Foundation, Coleman reúne uma banda de 21 músicos em que participam habituais membros do seu grupo Five Elements — o trompetista Jonathan Finlayson, o baixista Anthony Tidd, o guitarrista Miles Okazaki e o baterista Marcus Gilmore —, bem como uma série de instrumentistas oriundos da clássica contemporânea ou do jazz latino. O resultado é uma grandiosa sequência de temas e arranjos em que a delicadeza e a elegância da escrita de Coleman são tratadas com amor e paixão por todo o grupo, transmitindo em pleno o seu fascinante e profundamente pessoal universo musical. Destaque particular para o tema Harmattan, onde os ritmos de acento afro-cubano jogam um contraponto perfeito à melodia interválica tocada por Coleman e Finlayson, criando um drive rítmico irresistível. Uma música hipnótica que cresce exponencialmente a cada sucessiva audição.

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