Black Mirror: o futuro está aí e o melhor é termos medo

À terceira temporada, a série de antologia do britânico Charlie Brooker estreia no Netflix.

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Todas as histórias goram à volta da influência da tecnologia nas nossas vidas Netflix

E se as nossas piores fantasias se tornassem realidade? E se aquele sonho estranho que tivemos na outra noite acontecesse mesmo? Em traços simples, é esta a premissa de Black Mirror, cuja terceira temporada chegou agora ao Netflix. É o mesmo que dizer que vale tudo. Eis uma série onde nunca sabemos o que esperar. Mas mesmo. Tanto que cada episódio é uma história autónoma sem ligação entre si, nem mesmo os actores e realizadores. O ponto comum: tudo se passa num futuro muito próximo, um pouco mais tecnológico do que o nosso.

É como se estivéssemos numa realidade paralela, a Twilight Zone dos tempos modernos – esses que metem Uber, Tinder, Facebook, YouTube ou Instagram no topo das nossas preocupações. Quantas vezes não demos por nós a olhar para trás e a pensar como a nossa vida mudou com a tanta tecnologia que hoje temos ao dispor? Quase que esta podia ser uma série saída do imaginário de George Orwell mas nem o autor de 1984 conseguiu imaginar tanto. Já Charlie Brooker, o criador de Black Mirror, tem sobre esta temática uma imaginação que não acaba. De tal forma que já o acusaram de ter uma fobia da tecnologia.

“Não é nada disso”, diz-nos à mesa com outros jornalistas europeus. “Se olharmos para o que se passa no mundo actualmente, é como se a sociedade estivesse dividida em dois pólos. E tenho a certeza que muito disso tem a ver com as redes sociais e com o facto de as pessoas terem uma voz e rodearem-se de uma câmara de eco”, diz o britânico, que à terceira temporada deixa o Channel 4 para o Netflix – uma mudança que permite que a série, que conquistou a crítica, chegue não só a mais pessoas como possa também crescer: se a primeira e a segunda temporada tiveram três e quatro episódios, respectivamente, esta dá-nos seis histórias.

Brooker diz não ter sentido grande diferença no processo de trabalho com esta passagem para o serviço de streaming mas admite ter tido uma maior liberdade na duração dos episódios. “Não temos de cortar cenas por causa da publicidade.” Não é de estranhar por isso que quase todos os episódios tenham cerca de uma hora – um deles tem mesmo 90 minutos. “No fundo, as seis histórias trazem-nos mais variedade. É como se estivéssemos a criar seis filmes, parece que estamos a fazer um festival de cinema”, brinca o criador, sem querer adiantar muita coisa para esta temporada, até porque, como diz, Black Mirror não é uma série que se possa encaixar em alguma definição. Talvez por isso, quanto menos se souber sobre os episódios melhor.

“Enfim, é Black Mirror, é muito estranho”, diz. “Não há um episódio que represente a série mas ao mesmo tempo todos o fazem.” Confuso? “As nossas histórias são sobre pessoas, digamos que são as fraquezas das pessoas”, explica. Isto, claro, sempre com a tecnologia como pano de fundo. “Eu tendo a ser um bocado neurótico e por isso imagino sempre os piores cenários para tudo e alguns dão-nos histórias”, continua. É por isso que vale tudo. “Não há nada que digamos que não podemos fazer. Lembremo-nos que já pusemos o primeiro-ministro a ter sexo com um porco… Acho que marcámos bem a nossa posição desde o início”, brinca, embora admita que o absurdo, por vezes, é também aterrador. “É por isso que temos de tudo: romance, policial, uma história militar, um thriller contemporâneo, sátira. E aquilo que me faz rir, se calhar a outros faz tremer.” É ver e tirar conclusões.

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