Berlim contesta nomeação de Chris Dercon para a Volksbühne

Berlim "já tem muitos curadores na moda e a tentar capturar os ares do seu tempo", escreveu o crítico Manuel Brug no Die Welt.

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O belga Chris Dercon deverá continuar a trabalhar na abertura da nova extensão da Tate Modern pelo menos até à inauguração, em 2016, do novo edifício do museu TOBIAS SCHWARZ/AFP
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A Volksbühne foi inaugurada em 1914 para a promoção de um teatro naturalista a preços acessíveis, que o trabalhador comum pudesse perceber e paga TOBIAS SCHWARZ/AFP

Foi anunciada apenas para 2017 a chegada de Chris Dercon à direcção da Volksbühne de Berlim; no entanto, mal o nome do ainda director da Tate Modern, de Londres, se fez ouvir esta semana começaram também os ventos de protesto nos meios culturais da capital alemã. “Uma verdadeira tempestade”, diz o jornal francês Le Figaro.

Dercon, que fez todo o seu percurso até hoje nas artes plásticas, foi apontado na última quinta-feira para substituir o encenador Frank Castorf, que há 25 anos está à frente da Volksbühne. Berlim questiona a capacidade de um curador, historiador e ex-crítico de arte para conduzir os destinos de uma sala de espectáculos.

Citado pela imprensa internacional, Claus Peymann, que dirige o Berliner Ensemble, fundado por Bertolt Brecht, pergunta se um “simples” curador não irá transformar numa “caixa de eventos” um dos mais reputados e emblemáticos teatros da Europa. “O Chris Dercon é óptimo para a Tate, completamente errado para a Volksbühne”, disse logo no princípio do mês, quando os rumores sobre a escolha começaram. No Die Welt, o crítico Manuel Brug escreveu não ter nada contra Dercon, como pessoa. “Um bom homem, com uma esplêndida rede de contactos, glamoroso mas intelectual, contemporâneo mas reputado”, escreveu. Apenas para acrescentar: “Mas pergunto-me o que é que ele vem fazer para a direcção de um teatro. Berlim já tem muitos curadores na moda e a tentar capturar os ares do seu tempo.”

Com um orçamento de 17 milhões de euros anuais de dinheiros públicos, a Volksbühne, cujo nome quer dizer Teatro do Povo, foi inaugurada em 1914 para a promoção de um teatro naturalista a preços acessíveis, que o trabalhador comum pudesse perceber e pagar. Desde então, construiu o perfil de um palco receptivo a linguagens mais experimentais do que é hábito para salas com a sua escala.

Localizado na Rosa Luxemburg Platz, no bairro de Mitte, antiga Berlim-Leste, faz contraponto com a sua instituição-espelho da antiga Berlim ocidental: a Schaubühne, o antigo teatro de Peter Stein, desde 1999 dirigido pelo encenador Thomas Ostermeier.  

Esta sexta-feira, face à notícia da saída de Dercon de Londres, Mark Brown, do The Guardian, resumia as movimentações recentes na capital britânica: “Esta sexta-feira à tarde vai ser anunciado em Berlim que Dercon, que é belga, foi seduzido a tornar-se sucessor de Frank Castorf em 2017, mais um golpe do ministro da Cultura [alemão] que também persuadiu Neil MacGregor, do British Museum, a deixar a cidade para assumir a direcção do comité à frente do novo centro cultural Humboldt-Forum. A partida de Dercon significa que Sir Nicholas Serota, o director da Tate, perdeu dois dos seus responsáveis séniores em outros tantos meses.”

Brown referia-se à saída de Penelope Curtis, a directora da Tate Britain, que virá para Lisboa para ficar à frente do Museu Gulbenkian, segundo se soube em Março.

Chris Dercon, que é formado em História da Arte e Estudos Teatrais e já passou pela direcção do centro PS1 do MoMA, do centro de arte contemporânea Witte de With, de Roterdão, e do museu Boijmans Van Beuningen, da mesma cidade, deverá continuar a trabalhar na abertura da nova extensão da Tate Modern pelo menos até à inauguração, em 2016, do novo edifício assinado pela dupla suíça Herzog & De Meuron. 

Notícia corrigida às 11h38 de 27 de Abril: Penelope Curtis ficará no Museu Gulbenkian, e não no Centro de Arte Moderna, como por lapso se tinha aqui escrito

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