Arquivo de António Lino Neto, o católico conservador e reformista, é hoje apresentado

Foto
A sessão evocativa de hoje decorre a partir das 18h, na Universidade Católica, em Lisboa Pedro Cunha

Homem de direita, “católico conservador nos valores mas reformista nas ideias”. António Lino Neto, deputado do Centro Católico durante a I República, é desta forma caracterizado por Marco Silva, historiador e autor do livro As Ideias Políticas e Sociais de António Lino Neto (ed. Caleidoscópio). A obra resultou de uma tese de mestrado e sobre o seu tema falará hoje Marco Silva, no âmbito de uma sessão evocativa dos 50 anos da morte do antigo parlamentar.

Uma outra obra, coordenada por João Miguel Almeida e Rita Mendonça Leite, com uma antologia de textos do deputado Lino Neto (1894-1940), será apresentada na mesma ocasião. Tem o título António Lino Neto: Perfil de Uma Intervenção Pública e recolhe textos de opinião publicados em jornais, textos de conferências como militante católico e excertos da obra académica de Lino Neto, sobre temas tão diversos como a questão agrária, a questão administrativa e elementos de economia política.

São intervenções que, afirmava ontem João Miguel Almeida num texto publicado na agência Ecclesia, apontam para “uma regeneração nacional assente em três pilares: uma revitalização da Igreja Católica através de uma melhor formação do clero; uma reforma económica baseada no ressurgimento da agricultura; uma reforma da administração pública mediante a descentralização e uma transferência de poderes para os municípios”.

Católico singular, que rompeu com a identificação entre católicos monárquicos e laicos republicanos, Lino Neto nasceu a 30 de Janeiro de 1873, em Mação (Santarém). Advogado e professor universitário, o deputado do Centro Católico distinguiu-se por diversas polémicas – algumas das quais estão patentes no livro António Lino Neto, Intervenções Parlamentares 1918-1926 (ed. Assembleia da República e Texto Editores), publicado em Janeiro de 2010.

Na sua actividade política e parlamentar, era muitas vezes criticado pelos católicos monárquicos, que o consideravam adepto do regime republicano. Mas também os republicanos anticlericais o criticavam, pela defesa que fazia do direito dos católicos à intervenção social e política.

A 1 de Agosto de 1923, numa intervenção histórica que fez no Parlamento, Lino Neto afirmava precisamente sobre o tema: “Da parte dos monárquicos afirma-se que para atacar a legislação é necessário atacar o regime; e por parte dos republicanos afirmou-se (…) que a Lei de Separação, embora contendo algumas arestas, era, pela sua estrutura, a base do regime. (…) A verdadeira orientação é a que separa os regimes da legislação.”

Por isso, embora criticando a Lei de Separação de 1911 como “imoral, anárquica e injusta”, António Lino Neto não colocava em causa o regime republicano. Antes defendia que “cada um manifeste livremente a sua religião e que o Estado não tenha uma religião oficial”.

Já em 1900, num artigo publicado n’O Distrito de Portalegre a 25 de Outubro (e agora disponível no livro que hoje é apresentado), Lino neto elogiara ao Papa Leão XIII o ter secundarizado a questão das formas de governo e ter imposto a ideia do “respeito pelas instituições vigentes”. Na mesma lógica, numa época em que cresciam os nacionalismos que desembocariam na I Guerra Mundial, Lino Neto manifestava a sua adesão ao ultramontanismo, pugnando pela universalidade do catolicismo e pela ligação ao Papa, sem pôr em causa o patriotismo dos crentes – o Papa era muitas vezes considerado, por muitas vozes mais nacionalistas de vários países, como um “soberano” estrangeiro.

Amigo de Afonso Lopes Vieira, Guerra Junqueiro e António Sérgio, Lino Neto notabilizou-se também por intervenções em outras áreas, como a questão do municipalismo. Uma das suas obras – A Questão Administrativa (O Municipalismo em Portugal) – marcou o debate da época sobre o tema, em Portugal. Escrevia Lino Neto que, antes das eleições, “todos defendem em tom vigoroso a descentralização, sem que ninguém apareça a defender o centralismo; mas, uma vez no poder, ninguém concretiza a descentralização”…

A sua entrada na política deu-se em Novembro de 1917, quando foi eleito vereador da Câmara de Lisboa. Em Agosto desse ano, participara na criação do Centro Católico Português (CCP), pelo qual irá ser eleito deputado em 1918, já com Sidónio Pais presidente. Nessa qualidade, assinou com os outros três colegas de bancada uma carta ao “Presidente-Rei”, pedindo liberdade de culto para a Igreja, direito de associação e ensino para os católicos, o regresso das ordens religiosas e a restituição de bens confiscados às instituições católicas.

Em 1919, Lino Neto é escolhido como presidente do CCP. Mas, depois da implantação do Estado Novo, em 1926, divergindo de Salazar, demite-se do Centro, passa a integrar os movimentos da Acção Católica com o objectivo de recuperar a “liberdade política” e retoma a advocacia e o ensino, chegando mesmo a ser vice-reitor da Universidade Técnica (1938-43). Morre, com 88 anos, a 16 de Novembro de 1961.

A sessão evocativa de hoje, que inclui ainda a visita a uma exposição sobre Lino Neto e a apresentação do seu arquivo, decorre a partir das 18h, na Universidade Católica, em Lisboa.

Sugerir correcção
Comentar