Aplausos: Adrian Mole vai ter um musical
O espectáculo, baseado no primeiro volume dos seus diários, terá estreia em Março do próximo ano.
Adrian Mole foi um intelectual aos 13 anos e ¾ e um namorado traído logo a seguir, na crise da adolescência. Foi um especialista em tritões com secretária no Ministério do Ambiente aos 23 (“anos amargos”, segundo o título do respectivo volume dos diários da personagem inventada por Sue Townsend) e um cozinheiro de sucesso num restaurante do Soho na fase em que a ex-namorada regressa vestida para matar como deputada trabalhista. Quando o perdemos de vista, em 2009 (as cenas que se seguem são do único volume dos diários que não teve, até à data, tradução em Portugal pela Difel), tinha 39 anos e estava de volta à casa dos pais em Leicester (coisas da crise) e à hipocondria (coisas da próstata).
Entretanto, Sue Townsend morreu em Abril – a escritora tinha 68 anos e sofria há muito de diabetes, que a foram progressivamente cegando – e Adrian Mole também. Só que não é fácil enfrentar a vida sem ele: foram 27 anos juntos, entre o negrume da depressão thatcherista de 1982 (O Diário Secreto de Adrian Mole aos 13 Anos e ¾) e o temido diagnóstico de cancro da próstata de 2009 (Adrian Mole: The Prostrate Years), com algumas armas de destruição maciça (Malvinas, Iraque, Afeganistão) pelo meio. É sobretudo difícil enfrentar a vida sem ele em Inglaterra, país de que se tornou uma espécie de herói involuntário (ou de anti-herói involuntário, se quisermos ser mais precisos), figurando exemplarmente as angústias e as alegrias da classe média empobrecida (“Somos os novos pobres”, declara com um certo orgulho Pauline, a turbulenta e ligeiramente alcoólica mãe de Adrian, logo no primeiro dos oito volumes da série). Os seus diários foram dos primeiros livros que a geração nascida no início dos anos 70 leu até ao fim, e mesmo quem não os leu encontraria a família Mole na rádio (a série começou, de resto, por ser um folhetim da BBC) ou na televisão – talvez não haja, na paisagem pop britânica dos últimos 40 anos, uma figura tão universal.
Pois bem, Adrian Mole vai ter uma segunda vida, agora como protagonista de um musical: em Março do próximo ano, o Curve Theatre, de Leicester, estreará um espectáculo baseado no primeiro dos seus diários. As audições para escolher os protagonistas já começaram e a ideia é que o elenco inclua o máximo de adolescentes da cidade onde Adrian Mole nasceu e cresceu, disse ao The Independent Pippa Cleary, que escreveu a música e as letras. Sue Townsend, acrescentou, chegou a cantá-las: a equipa por trás do musical conseguiu a aprovação da autora (“A notícia da morte dela entristeceu-nos muito. Tínhamo-la visto pouco tempo antes e foi delicioso. Felizmente já tínhamos terminado o musical há muito e ela estava muito contente com ele”).
Lançados em 1982 pela Penguin, os diários de Adrian Mole terão vendido mais de 20 milhões de cópias em todo o mundo, mas Leicester é definitivamente o lugar a que pertencem (“Não podíamos estrear em mais lado nenhum. A Sue Townsend é Leicester dos pés à cabeça”, sublinha Pippa Cleary). Ainda assim, o musical deverá fazer uma carreira posterior no West End, em Londres, replicando o próprio percurso do protagonista que aos 13 anos e ¾, encurralado entre o ardor nem sempre benigno da paixão por Pandora, as alterações de humor do melhor amigo Nigel, o bullying do skinhead Barry Kent e o péssimo feitio (e pior hálito) do reformado Bert Baxter, já se considerava um velho apesar de ainda não ter levado nada desta vida: “Acabo de reparar que nunca vi um cadáver ou um bico de maminha verdadeiro. É o que dá viver num beco sem saída.”