Adeus, Miffy

Dick Bruna decidiu pôr um ponto final nas aventuras de uma das personagens mais famosas da literatura infantil ocidental.

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Tal como outras personagens carismáticas da literatura infantil, Miffy começou por ser apenas uma saga doméstica DR
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Uma cabeça redonda com duas orelhas bem arrebitadas, um pequeno ponto preto para cada um dos olhos, uma cruz para a boca que também é nariz, um vestido vermelho abaixo do joelho (ou azul às florzinhas em dia de festa): ao longo dos 59 anos que durou a sua vida em livro e desenho-animado, Miffy não mudou muito e é também isso que explica a persistência da personagem criada pelo desenhador holandês Dick Bruna no imaginário infantil ocidental (e na cabeça dos japoneses que em meados da década de 70 inventaram a sua grande rival, a gata Hello Kitty). Pois bem, chegou a altura de hibernar: a menos de um mês de completar 87 anos, Dick Bruna decidiu arrumar definitivamente os lápis e pôr um ponto final nas aventuras da coelha branca que começou a imaginar no Verão de 1955, quando passava férias com a mulher e o filho mais velho em Egmond aan Zee.

Tal como outras personagens carismáticas da literatura infantil, Miffy começou por ser apenas uma saga doméstica: noite após noite, para adormecer o seu bebé de apenas um ano, Bruna dava uma vida paralela ao coelho que costumava aparecer durante o dia no jardim da casa de férias. De regresso ao trabalho, o desenhador decidiu pô-lo num papel – e como ficava melhor de saia do que de calças, transformou-se na coelha Miffy que protagonizaria o primeiro dos seus cerca de 200 livros ainda em 1955 (o último é de 2011).

Herdeiro de uma importante editora holandesa – a A.W. Bruna & Zoon, fundada em 1868 pelo seu bisavô e transmitida de geração em geração –, Dick Bruna acabaria por convencer o pai de que prestaria um melhor serviço à empresa como designer gráfico. Mas com o sucesso dos seus próprios livros, que venderam mais de 85 milhões de exemplares e foram traduzidos em pelo menos 40 línguas, acabaria por deixar de assegurar as capas dos produtos da editora (desenhou cerca de duas mil, nomeadamente para a icónica colecção de bolso Zwarte Beertjes) para se dedicar mais integralmente a Miffy. Até quarta-feira passada, dia em que fez saber pela estação de televisão RTV Utrecht que não haverá mais nenhum livro com novas aventuras da sua personagem mais famosa (em Portugal, foram publicadas pelas Edições Asa) e que os direitos permanecerão consigo. 

Ainda assim, é uma saída de cena parcial: Miffy manterá o seu museu em Utrecht (onde também tem uma praça), a Dick Bruna Huis, e continua disponível em livros, filmes e todo o tipo de merchandising, de lancheiras a pijamas. O seu legado, de resto, está inscrito na única personagem que verdadeiramente rivalizou com ela e de que, claro, não gostava assim muito ("Podia não me ter copiado", respondeu Miffy quando lhe perguntaram a sua opinião sobre Hello Kitty, criada pela japonesa Sanrio em 1974). Foi também por causa dela que os livros infantis começaram a olhar as crianças de frente, como Dick Bruna explica num documentário: "Sempre levei as crianças a sério (...). Quando estou sentado no meu estirador, às vezes imagino que há uma criança do outro lado a olhar para mim. É por isso que as minhas personagens estão sempre de frente. As crianças são muito frontais e olham-nos sempre directamente, é uma coisa que eu valorizo muito.
 
 
 
 

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