A retrospectiva que é um “reinício de carreira”

Podia estar quieto, pousar a máquina, deixar a próxima imagem para depois. Mas a sensação que temos é que Alfredo Cunha nunca trabalhou tanto como agora, que se reformou. Com o tanto que ainda quer fazer, mostra, para já, o muito que já fez, numa exposição no Fórum da Maia, até 28 de Agosto

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A descansar entre concertos, durante o festival de Paredes de Coura, 2015 Alfredo Cunha
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Piscina, em Vizela, 2013, durante um trabalho sobre a velhice Alfredo Cunha
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Estudantes do ensino superior durante o Enterro da Gata, em Braga, 2016 Alfredo Cunha
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No Sri Lanka, 2014, país onde disseram ao fotógrafo: "O Paraíso é aqui, podes fotografar" Alfredo Cunha
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Um velho pescador, em mais um dia incerto de faina, ao largo de Matosinhos, 2005 Alfredo Cunha
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Imagem captada em 2013, em Lisboa, num trabalho para celebrar a AMI Alfredo Cunha
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Numa das barracas a que se chamava casa, no Bairro do Bocelo, no Porto, 2006 Alfredo Cunha
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Funeral de um homem cigano morto no Porto, 2006 Alfredo Cunha

“Não te atrevas a pôr a minha idade.” Podíamos pôr, não é assim tanta, mas isso que importa? Basta olhar para as fotografias que Alfredo Cunha já nos deu, para perceber que ele anda há muito tempo por aí, de máquina na mão, a registar os momentos históricos e as histórias pequenas de cada um de nós. Há tempo suficiente para nos deixarmos encantar com tantas das suas imagens, com tantos dos lugares por onde passou e todos aqueles rostos que trouxe até nós, de velhos e crianças, de trabalhadores e desempregados. Mas, certamente, não há tempo suficiente para dizer já chega, para dizer que o tempo dele passou.

Quando chegaram as máquinas digitais, o Alfredo não teve medo delas e tratou logo de ver o que dali podia sair. Quando o Facebook nos atropelou a vida, ele transformou-o em mais uma montra para tudo o que tinha ainda para nos mostrar — mais uma vez ou de novo, porque há sempre algo novo. E ele até podia ter ficado o resto da vida a gerir o portfólio que, porventura, mais se lhe colou à pele — o daquele dia 25 de Abril de 1974, em que já andava por Lisboa a fotografar. Mas isso havia lá de chegar? Isso podia lá ser suficiente com tanto mundo ainda para ver, guerras novas, esperanças a começar, as filhas que cresciam e uma história nova para contar em imagens em cada esquina.

No Fórum da Maia estão 333 fotografias impressas e 1500 a ser constantemente projectadas, 750 tiradas em Portugal, outras tantas para lá da fronteira. Não é um olhem-para-o-que-eu-fui-capaz-de-fazer, mas, como Alfredo Cunha diz, com o sorriso trocista que lhe é tão característico: “É o reinício da minha carreira. Está ali o que foi a minha fase de aprendizagem e, agora que aprendi alguma coisa, estou a reiniciar a carreira.” E o sorriso pode estar lá, mas ele não está a brincar. Porque antes do fim do ano há-de sair mais um livro, desta vez de retratos, “desde os anos 1970 até àqueles que ainda não foram tirados”, e para o ano já há novos projectos que o hão-de levar, de novo, a recantos perdidos do mundo.

Nos últimos tempos tem trabalhado muito com a AMI — Assistência Médica Internacional, mas muito mais — e sempre — com ele próprio. A próxima história pode ser como a daquela mulher idosa que, de braços abertos, flutua numa piscina, enchendo Alfredo Cunha de emoção. “Há, ao mesmo tempo, uma busca de saúde e bem-estar, mas também quase como um abandono”, diz. Ou numa praia no Sri Lanka ou num qualquer bairro degradado ao virar da esquina. Ou no sorriso das crianças, a quem já dedicou um livro. Ele já passou os 60, é tudo o que posso dizer sobre este assunto, mas se os sente, isso não se nota. E nós, senhor Alfredo Cunha, agradecemos. 

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