A citabilidade

Não há maior elogio do que uma citação. Citar e ceder a palavra; deixar ocupar o pouco espaço que nos cabe é mais doce do que qualquer bela avaliação alheia.

Valter Hugo Mãe (V.H.M.) é um escritor citável. Os que não são citáveis ou não são escritores ou são chatos. Uma coisa é uma crónica. Outra é uma frase. As frases são importantes. Tal como os antigos singles (sobretudo os bons) que conseguiam desprender-se dos álbuns (sobretudo dos maus), as frases – de preferência aforísticas – têm de ser suficientemente bem achadas e escritas para viverem e terem graça isoladas, independentes e até esquecidas do texto onde nasceram.

Da crónica Setembro que o V.H.M. escreveu para a Revista 2 de anteontem, ficarão para sempre bocados como este: "Somos, subitamente, feios e burros. Lamentamos ter cozinhado tanto quilo de frango com leite de coco". O génio está naquele "quilo".

Citar é um poder absoluto. Quando alguém – como a Maria João, quando a massacro para me dizer qual a frase que a fez sorrir – me cita, convenço-me, sendo fraco, que valeu a pena escrever aqueles 100 mil caracteres só para ouvir uma única frase que escrevi.

Não há maior elogio do que uma citação. Citar e ceder a palavra; deixar ocupar o pouco espaço que nos cabe é mais doce do que qualquer bela avaliação alheia.

"Suspeito de tudo. Ando mariquinhas dos melindres. Fico magoado, arreliado, injustiçado, quero sei lá o quê, não tenho paciência, estou longe de mim".

Citar é amar ao mesmo tempo que se edita. A frase seguinte a esta citação ("Coloco a hipótese de estar doente") estraga a citação.

Ave, meu escritor e amigo Valter Hugo Mãe!

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