O Museu de Arte Antiga escondia uma “pequena preciosidade” chamada Crónica de Nuremberga

Um incunábulo de 1493, de Hartmann Schedel (1440-1514), foi descoberto na biblioteca do MNAA.

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Foi descoberto na biblioteca do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), em Lisboa, um valioso incunábulo – uma obra impressa até 1500 –, que estava até agora guardada nos fundos, sem se saber da sua existência. Um dos primeiros livros impressos da história, um dos maiores livros ilustrados da época. Liber chronicarum, de 1493, também conhecido como Crónica de Nuremberga ou Crónica do Mundo, de Hartmann Schedel (1440-1514), é a “nova” peça do museu e está disponível para consulta, mediante autorização.

Foi descoberto há cerca de um mês mas só agora a novidade foi anunciada no Facebook do museu, numa publicação que somou mais de uma centena de partilhas. Impresso em Nuremberga em 1493 e com xilogravuras de Michael Wolgemut e Hans Pleydenwurff, Liber chronicarum chegou ao museu através do Legado Barros e Sá, o coleccionador de arte, que deixou ao MNAA em 1981 o seu espólio de mobiliário, ourivesaria, artes decorativas e livros antigos. Foi exactamente no fundo bibliográfico, que está a ser catalogado, que foi descoberto este incunábulo. 

“Quando esta colecção aqui entrou, foi feito um pequeno inventário mas agora estamos a introduzir toda essa biblioteca na base de dados. O senhor tem uma colecção de livros antigos espantosa mas não estava à espera de encontrar esta pequena preciosidade”, diz ao PÚBLICO Luís Montalvão, o bibliotecário responsável pela biblioteca do MNAA desde há três anos. “Os incunábulos são obras que vão desde o início da história da impressão até 1500, são os primórdios da impressão”, explica Montalvão, contando que o livro encontrado tem uma “encadernação moderna, feita nos finais do século XIX, início do século XX, e por isso até dava a impressão de que era uma edição fac-similada”.

Foi quando começou a analisar a peça que percebeu o que ali estava, até porque, conta o bibliotecário, “o próprio coleccionador tinha alguns documentos sobre o livro, coleccionava com critério, sabia o que estava a comprar”. Desde que em 1981 o acervo de Barros e Sá chegou ao MNAA que várias peças foram integradas na exposição permanente, o estudo biblioteconómico, porém, que permitiria a compreensão integral do valor desta obra, só agora está a acontecer. Antes do incunábulo, já tinha sido descoberto neste arquivo a publicação Theatrum Sabaudae, que integrou recentemente a exposição Os Saboias. Reis e Mecenas (Turim 1730-1750).

Liber chronicarum, escrito em latim, conta a história do mundo em sete capítulos e apresenta mais de 1800 gravuras em madeira, que incluem mapas e panoramas de várias cidades. “Na altura foi um livro muito popular, era muitíssimo ilustrado. É uma espécie de história do mundo à seculo XV, começa com a história sagrada, Adão e Eva, o Dilúvio, etc., e depois tem muitas imagens acerca de várias cidades, personalidades, santos. É um livro lindíssimo”, diz Luís Montalvão, explicando que este é o único incunábulo do MNAA. “Existem manuscritos mais antigos, no Gabinete de Estampas e Desenhos, mas uma obra destas de 1493 não”, continua, explicando que esta obra está catalogada e digitalizado em várias bibliotecas do mundo. Na Universidade do Porto, por exemplo, existe um exemplar destes e em 2010, inclusive, a Christie’s leiloou um outro exemplar que acabou arrematado por 85,3 mil euros, um valor acima dos 44 mil euros estimados pela leiloeira.

Também a Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), em Lisboa, que tem uma colecção de incunábulos com 1597 títulos, segundo a informação disponível no seu site, detém nos seus impressos reservados esta obra, que pode ser consultada, sob autorização, à semelhança do que acontece no MNAA.

“Um incunábulo é sempre raro e neste caso é surpreendente a qualidade do livro que está num estado impecável, é preciso ver que estas eram obras feitas de uma forma muito artesanal”, diz o bibliotecário, acrescentando existirem "muitas especulações acerca das ligações entre as gravuras de Liber chronicarum e o trabalho posterior do célebre artista alemão Albrecht Dürer (1471-1528)". "Dürer terá trabalhado na oficina de Michael Wolgemut", conta.

Esta obra ficará agora  nos reservados da biblioteca do MNAA. “É um livro que obviamente vai ser usado e poderá até figurar numa das exposições que o museu faça. Está catalogado, identificado e é mais uma peça do nosso património.”

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