Um romance inacabado de García Márquez poderá ainda ser publicado

Gabriel García Márquez estava há mais de uma década a escrever En Agosto nos Vemos, que nunca chegou a terminar.

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En Agosto nos vemos é um único texto por publicar do escritor REUTERS

O manuscrito do romance inacabado En Agosto nos Vemos de Gabriel García Márquez poderá será publicado, se essa for a vontade dos herdeiros, disse o editor de García Márquez, Claudio López, da Penguin Random House, em entrevista à rádio espanhola RAC 1. O editor, que já leu o manuscrito, diz que apenas 85 por cento do livro está escrito.

“Eu tive o manuscrito e não se publicou precisamente porque não chegou [García Márquez] a terminá-lo. 85 por cento está escrito. O final é demasiado aberto e não chegou a concluí-lo”, disse López garantindo que quando for publicado será como romance inacabado. “Acredito que mais cedo ou mais tarde verá a luz do dia. O manuscrito merece”, disse garantindo que para além de En Agosto nos Vemos, o escritor colombiano, que morreu no dia 18 aos 87 anos, não deixou mais textos por publicar.

En Agosto nos Vemos tem o seu primeiro capítulo escrito desde, pelo menos 1999, ano em que Gabriel García Márquez o leu em público pela primeira vez. O livro conta a história de Ana Magdalena, de 52 anos, que todos os anos, a 16 de Agosto, viaja até às Caraíbas para visitar a sepultura da sua mãe. O livro começa com um dos muitos regressos de Ana  Magdalena às Caraíbas - eis um excerto, em tradução livre a partir do espanhol. 

“Voltou à ilha na sexta-feira 16 de Agosto, no barco das duas da tarde. Levava uma camisa de quadrados escoceses, calças de ganga, sapatos simples de salto baixo e sem meias, uma sombrinha de cetim e, como única bagagem, uma mala de praia. Na fila de táxis da doca foi directa a um modelo antigo, carcomido pelo sal. O motorista recebeu-a com a saudação de um antigo conhecido e levou-a pelo meio do povo indigente, das casas de barro e telhados de palmeira, e ruas de areias brancas de frente para um mar ardente.”

“Missão Cumprida: tinha repetido aquela viagem por vinte e oito anos consecutivos a cada 16 de Agosto, à mesma hora, no mesmo quarto do mesmo hotel, com o mesmo táxi e a mesma florista debaixo do mesmo sol de fogo do mesmo cemitério indigente, para pôr um ramo de gladíolos frescos na sepultura da sua mãe. A partir desse momento não tinha nada que fazer até às nove da manhã do dia seguinte, quando saía o barco de regresso.”

O que torna esta viagem de En Angosto nos vemos diferente é a infidelidade, que Ana Magdalena comete pela primeira vez na sua vida.

“Chamava-se Ana Magdalena Bach, tinha cumprido cinquenta e dois anos de nascida e vinte e três de um casamento combinado com um homem que a amava e com o qual se casou sem terminar o curso de letras, virgem e sem namoros anteriores.”

“Voltou-se para vê-lo, assustada, por cima do ombro, e ele não estava. Muito menos estava na casa-de-banho. Acendeu as luzes e viu que a roupa dele não estava, e a sua, que atirou para o chão, estava dobrada e posta quase com amor na cadeira. Até então não se tinha dado conta de que não sabia nada dele, nem sequer o nome, e a única coisa que restava da sua noite louca era um ténue odor a lavanda no ar purificado pela tempestade.”

O jornal La Vanguardia escreve que o romance nunca foi publicado porque nenhum dos seis finais possíveis convencia García Márquez.

A última ficção de Gabriel García Márquez publicada foi Memórias das minhas Putas Tristes, em 2004. Em 2010 publicou e Yo No Vengo a Decir un Discurso (Eu Não Venho Fazer um Discuso), uma não-ficção que não se encontra publicada em Portugal.

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