Steven Soderbergh diz que o cinema deixou de lhe interessar

Realizador de Sexo, Mentiras e Vídeo e Tráfico confirma abandono do cinema e lança críticas a Hollywood, acusando os estúdios de tratarem mal os realizadores.

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Soderbergh já fez 26 filmes AFP

Não se trata propriamente de uma novidade, mas, desta vez, Steven Soderbergh diz que vai mesmo abandonar Hollywood. “Os filmes deixaram de me interessar”, além de que Hollywood “trata mal os realizadores”, diz o realizador de Tráfico (Óscar de melhor filme em 2001) em entrevista à New York Magazine, em que confirma a sua retirada, algo que, de resto, já tinha anunciado, em 2011, para quando atingisse os 50 anos – o que aconteceu no passado dia 14 de Janeiro.

O abandono do cinema ocorrerá após a estreia dos dois projectos mais recentes de Soderbergh, Efeitos Secundários, um thriller psicológico com Rooney Mara, Channing Tatum, Jude Law e Catherina Zeta-Jones – cuja estreia americana está anunciada para o próximo dia 8 de Fevereiro e, na Europa, em Março) – e Behind the Candelabra, um biopic para a televisão por cabo produzido pela HBO sobre a vida do pianista e showman americano Liberace (Michael Douglas) e a relação com o seu companheiro Scott Thorson (Matt Damon), e que está em fase de pós-produção.

O caso de Behind the Candelabra e o facto de Soderbergh não ter conseguido as condições para produzir este filme para as salas – em Hollywood disseram-lhe que se tratava de um projecto “demasiado gay” para o grande público – terão pesado na decisão agora reafirmada pelo autor de Sexo, Mentiras e Vídeo de abandonar o cinema.

Steven Soderbergh não poupa, de resto, o sistema que actualmente impera na “fábrica de sonhos”. “O pior acontecimento na realização de filmes – particularmente nos últimos cinco anos – está na forma horrível como os realizadores são tratados”, disse o cineasta à New York Magazine, citado pelo The Guardian. “Tornou-se absolutamente horrível o modo como as pessoas que têm o poder económico põem e dispõem a seu bel-prazer; não é só nos estúdios, mas em quem quer que decide financiar um filme”. E Soderbergh acrescenta não perceber “essa ideia de que um realizador está a priori errado sobre aquilo que o público quer ou de que precisa, quando ele é o seu primeiro espectador, de certo modo. E, provavelmente, decidiu tornar-se realizador precisamente porque foi público”.

Com uma carreira especialmente prolífera, que conta 26 filmes desde que em 1989 se estreou na longa-metragem com Sexo, Mentiras e Vídeo (com que logo ganhou a Palma de Ouro de Cannes), Steven Soderbergh reforçou a sua filmografia nos últimos tempos, tendo realizado seis filmes desde 2011.

Para além de Behind the Candelabra e Efeitos Secundários, fez também The Last Time I Saw Michael Gregg, Contágio, Uma Traição Fatal e Magic Mike. Como é que alguém com esta voragem criadora vai agora deixar de trabalhar no cinema? O próprio explica que não se trata de deixar de trabalhar. “Eu deixarei de fazer 'cinema' – à falta de melhor palavra”, responde à New York Magazine. Mas acrescenta que pensa “dirigir” teatro, e anuncia mesmo a realização de uma série para a televisão.

Soderbergh admite, de resto, que o formato televisivo pode permitir uma abordagem de temas mais profunda do que o cinema para o grande ecrã, e que isso é algo que também lhe interessa. “3,5 milhões de pessoas a ver um show na televisão por cabo é um sucesso; o mesmo número de pessoas a ver um filme já não é um sucesso. Em termos culturais, os filmes já não contam tanto como contavam”, diz o realizador, lembrando os tempos da sua juventude – a primeira metade dos anos 70 – em que, em Hollywood, se respeitava de igual modo os realizadores que faziam grandes filmes e os que ganhavam muito dinheiro. “Actualmente já só conta quem faz muito dinheiro”.
 
 
 
 

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