NOS Primavera Sound: Foi mesmo primaveril a última noite com os The National

Não choveu. Os The National ganharam a multidão. E o festival acabou com balanço positivo e 25 mil pessoas no recinto. Para o ano há mais.

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Paulo Pimenta
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Todas as noites ameaçou. Céu carregado. Previsões que apontavam para chuva intensa. E toda a gente de impermeável no corpo. Havia quem argumentasse que o festival deveria mudar o nome para Inverno Sound, mas afinal a terceira edição do NOS Primavera Sound foi mesmo primaveril.

Pelo clima. Mas principalmente pelo espaço do Parque da Cidade do Porto. Pelo ambiente descontraído, com muitos estrangeiros pertencentes a 40 nacionalidades. Pelo número de espectadores (70 mil, ao longo dos três dias, com 25 mil na última noite), o que permite o usufruto do lugar de forma equilibrada. E pelo design do espaço, com quatro palcos, e zonas de estar, perfeitamente demarcados, sem ruído comercial e iluminação excessiva.

Ao nível do cartaz faltou talvez um nome mais abrangente – que poderiam ter sido os Arcade Fire, que tocaram no Primavera de Barcelona, mas que em Portugal transitaram para o Rock In Rio – mas já se sabe que este é um festival de grande diversidade de escolhas, onda cada um cria o seu itinerário.

Na quinta Kendrick Lamar, Caetano Veloso ou Rodrigo Amarante foram alguns dos concertos mais recordados, enquanto na sexta vingaram nomes como os Pond, Follakzoid, Warpaint, Darkside ou GYBE!, apesar dos Pixies terem sido a banda que maior número de pessoas aglomerou. Na derradeira noite, sábado, quem teve esse privilégio foram os americanos The National. 

Velhos conhecidos dos palcos portugueses, deram um concerto totalmente convincente, assente no vozeirão e na presença intensa do cantor Matt Berninger, causando calafrios emocionais à multidão que com eles experimentou uma boa vintena de canções, com destaque para algumas das inseridas no último álbum, Trouble Will Find Me (2013).

Começaram aliás com duas canções desse disco (Don’t swallow the cap e I should live in salt), embora o alinhamento tivesse passado em revista a carreira feita de seis álbuns. Foi um dos concertos mais vibrantes que lhes vimos, com o vocalista, sedutoramente catártico, a descer até ao público em Terrible love, provocando o delírio nas primeiras filas, enquanto cá atrás se abanavam os corpos, batiam-se palmas ou cantava-se para o céu.

Por momentos fez-nos lembrar alguns dos momentos vividos ali há um ano com Nick Cave, embora o australiano quando pede amor o faça expelindo também fel, enquanto Matt Berninger pareça procurar apenas protecção.

Ao contrário de outros concertos, e apesar de algumas baladas mais introspectivas, não existiram grandes momentos de contemplação, com o quinteto – e restantes músicos convidados – empenhados em proporcionar um espectáculo essencialmente dinâmico e de comunhão, com as projecções caleidoscópicas nas telas gigantes a reforçarem esse propósito.

E foi isso que aconteceu em canções magníficas como Mr November, Graceless, Bloodbuzz Ohio, Slow show,  Abel ou Mistaken for strangers, todas elas servidas pelo mesmo equilíbrio instável entre a tensão existencial vivida na voz e corpo de Matt Berninger e o balanço instrumental que tanto desemboca na graciosidade como na impetuosidade, assente na carga épica dos sopros, na precisão do ritmo e na dissonância das guitarras. Foi sem dúvida deles o concerto mais celebrado pela maioria dos presentes.

No Primavera acontece dois bons concertos decorrerem à mesma hora.  Só vimos o veterano da música soul Charles Bradley lançar mão da sua potente e rouca voz em duas canções, mas pela atmosfera que se vivia no final, no repleto palco ATP, só pode ter sido uma excelente interacção com a plateia.

A americana Annie Clark, ou seja St. Vincent, que já tinha surgido em palco ao lado dos National, para uma ajuda vocal em Sorrow, era outro dos nomes mais esperados da noite. Não desiludiu, mas raramente levou o público às nuvens, talvez porque a sua pop elaborada, com algo de subtileza teatralizada, necessite de outro tipo de disponibilidade para ser digerida, coisa que a dispersão de um festival como aquele raramente consegue oferecer.

Acompanhada por baterista e dois teclistas, a americana bem se esforçou, com solos de guitarra ruidosos e imaginativos, ao mesmo tempo que emprestava a sua voz a canções pertencentes, essencialmente, ao seu álbum homónimo deste ano. Em temas como Digital witness, Cruel ou Birth in reserve evidência todos os seus recursos, numa espécie de coreografia emocional cuidadosamente trabalhada, mas à qual faltou maior adesão.

Antes, no mesmo palco (Super Bock), tínhamos constatado o inverso, mais uma prestação sem nada de particularmente assinalável do americano John Grant ser vitoriada pela assistência, que se revê na sua folk com laivos electrónicos. Por vezes faz lembrar Bon Iver. Outras Destroyer. Mas em segunda-mão. As canções nunca chegam a levantar voo, baças e monótonas. Mas a verdade é que já conquistou um lugar no afecto do público português.

Para a arqueologia da música popular havia dois momentos capitais, os concertos dos americanos Neutral Milk Hotel e Slint. Vimos apenas pedaços dos dois, e a ideia com que ficámos é que quem cresceu a ouvir nos anos 1990 a folk com algo de cósmico dos primeiros ficou mais feliz ao vê-los finalmente, o mesmo sucedendo com quem se confrontou com o abstracionismo rock dos Slint, formados na segunda metade dos anos 1980.

Não sabemos se os membros do colectivo canadiano Yamantaka//Sonic Titan assistiram ao concerto dos Slint, mas não surpreenderia se tivesse acontecido. Horas antes, no mesmo palco (ATP), haviam também moldado o rock de forma exploratória, conduzindo-o para territórios performativos.

Foi talvez o acontecimento mais exótico do dia, com o palco ocupado por duas cantoras-performers de origens familiares asiáticas e três músicos, para um espectáculo que acabou por constituir uma espécie de ritual de libertação, com vozes gritadas que tanto pareciam evocar a ópera como os cantares cerimoniosos índios,  envolvidas por uma música brutalizada e contundente.

Para quem não os conhecia, constituíram uma das surpresas do último dia do festival. Uma jornada que havia começado ao final da tarde com um concerto dos portugueses You Can’t Win Charlie Brown e com uma competente prestação do americano Lee Ranaldo com os Dust (dos quais faz parte o seu companheiro nos Sonic Youth, Steve Shelley, na bateria), e que viria a terminar noite fora, com a pop electrónica charmosa de Glasser, o rock alucinado de Ty Segall ou o funk-rock trepidante dos !!! (Chk Chk Chk), no palco principal, com o vocalista Nic Offer, a fazer render, como sempre, a sua aptidão para fazer a festa com a assistência, misturando-se com esta.

Para o ano, foi confirmado este sábado, o festival regressa à cidade do Porto.

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