Galeria em Pangim

A cultura artística ocidental domina as artes plásticas em todo o globo desde o século XIX, mas é interessante examinar a maneira como em cada região não-ocidental os artistas lidaram com essa hegemonia.

 

Na delegação da Fundação Oriente em Pangim (Goa), foi inaugurada na passada semana a exposição permanente de cerca de quarenta pinturas e desenhos de António Xavier Trindade, um pintor nascido em Goa em 1870 e falecido em 1935 em Bombaim, na então Índia britânica. A galeria de Pangim é doravante a mais importante colecção de obras de Trindade existente em qualquer parte do mundo. As obras já foram mostradas em Portugal, tanto em Lisboa como no Porto.

Trindade foi educado artisticamente pelos ingleses que ensinavam na famosa JJ School of Art em Bombaim. É um pintor ocidental independentemente de ter vivido sempre na Índia e dos seus temas se referirem às pessoas e à paisagem desse território. Podemos ir mais longe: Trindade foi, na Índia, o melhor representante da pintura que se ensinava e praticava nas escolas de arte ocidentais e coloniais no final do século XIX.

É instrutivo comparar a sua obra com a de Raja Ravi Varma, (1848-1905), vinte anos mais velho que ele e o mais famoso pintor indiano do século XIX.  Educado também por ocidentais e trabalhando com gravadores alemães, Varma dedicou-se, no entanto, a satisfazer o seu próprio gosto exótico orientalista e o da sua clientela europeia e indiana, reinventando as divindades e outras figuras da mitologia e literatura hindus e criando a imagem moderna dessa mitologia. Trindade pintou, sem traço de exotismo, retratos, paisagens, figuras típicas das cidades indianas. Era goês e católico de casta alta, quer dizer, cresceu num meio social e cultural há muito tempo ocidentalizado, e foi educado pelos ingleses na cidade mais cosmopolita da Índia, Bombaim. Varma, pelo contrario, era de família nobre hindu e cresceu no sul da Índia, num território independente do domínio directo britânico. 

Houve uma altura em que alguns críticos indianos classificaram a obra de Varma como moderna e indiana e a de Trindade como académica e ocidental. Mas já se percebeu que estes dois pintores, e tantos outros pelo mundo inteiro, foram sobretudo pintores do seu tempo.  Por mim, gosto muito mais de Trindade. 

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