Duas mães imperfeitas e um pai também

Uma mulher quer ser a mãe perfeita, outra procura coragem para educar e um homem escolhe ser um pai diferente. Três personagens da peça Paredes de Vidro. Para quebrar em caso de emergência.

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João Paulo Serafim

Relatos autobiográficos de pais e mães formam o texto de Paredes de Vidro , que se estreia nesta quarta-feira em Lisboa, no Centro Cultural de Belém.

Uma encenação de receios, anseios, dúvidas, emoções, contradições e fúrias de “pais generosos” que participaram em diferentes actividades do Serviço Educativo de Guimarães 2012 – Capital Europeia da Cultura e do CCB – Casa das Artes. Com Joana Craveiro a assinar a direcção artística.

Os actores Gustavo Vicente, Inês Rosado e Isabel Gaivão, do Teatro do Vestido, também ajudaram na criação do texto final e interpretam-no com garra. “Partilham aqui o património invisível das suas experiências pessoais. São actores profissionais e são mesmo pais”, conta ao PÚBLICO Joana Craveiro.

A peça mostra como ninguém está preparado para ser pai ou mãe e como “um filho é para toda a vida”. Tenha o filho um ano, três anos ou 19, o trabalho dos pais não tem fim. O amor também não. Se uma das personagens está preocupada com o sol na cabeça do menino (de três anos) e tem pavor de o perder, outra quer fazer a melhor de todas as sopas para a criança de ano e meio, e fica a vê-la dormir só para confirmar que é verdade. A que foi mãe há mais tempo (há 19 anos) espera agora que a família consiga conviver em paz. Recorda com nostalgia o dia em que o filho deixou de se deitar na sua cama e com mágoa o momento em que lhe chamou ignorante.

No início da representação, desfiam o novelo da história da sua condição. “Não sei quando é que comecei a ser pai e a tentar desenrolar isto, diz ele; “tinha vontade de te ter, tive sempre vontade de te ter, não sabia se tinha jeito, vocação ou sei lá como se chama”, diz a mãe mais nova e que quer ser perfeita; “tinha medo, pensava que não era corajosa”, diz a outra, a quem falta confiança.

À entrada da Sala de Ensaio do Centro Cultural de Belém, o público já tinha sido convidado para uma “viagem sem retorno” e escutou muitas vezes a expressão “boa sorte”. Vai precisar dela.

Depois de um primeiro espectáculo centrado no ponto de vista dos filhos, Tropeçar, realizado em 2011, o Teatro do Vestido passou para o outro lado da “parede de vidro”, o dos pais. O título da peça decorre da frase final desse primeiro espectáculo: “Às vezes entre mim e eles havia uma parede de vidro.” A parede das falhas de comunicação, da indiferença ou incompreensão entre pais e filhos, por isso sugerem “quebrá-la em caso de emergência”.

O texto acaba por ser um reconhecimento da “humanidade comum que transpira desta árdua tarefa imensa que é ser pai ou mãe, uma tarefa incessante, infinita, e de certa forma impossível de representar num espectáculo teatral”, diz Joana Craveiro, que apela a que as famílias não desistam de ir ao teatro. “Cada vez é mais difícil conseguir público. Não podemos deixar que a apatia se instale. Temos de romper os obstáculos e avançar.”

Até domingo, a peça, para maiores de oito anos, estará em Lisboa, rumando depois para Guimarães. Um espectáculo que diverte e comove. Como os filhos. 

 

Ficha técnica

Direcção, textos: Joana Craveiro
Co-criação e interpretação: Gustavo Vicente, Inês Rosado, Isabel Gaivão
Co-criação, movimento, figurinos: Ainhoa Vidal
Co-criação, assistência de encenação: Miguel Seabra Lopes
Música: Gonçalo Alegria e Isabelle Coelho
Vídeo: Miguel Seabra Lopes
Iluminação: Gonçalo Alegria
Assistência geral: Rosário Faria
Produção: Joana Vilela
Co-produção: Teatro do Vestido, Centro Cultural Vila Flor e CCB/Fábrica das Artes

Paredes de Vidro é um espectáculo criado a convite do Serviço Educativo de Guimarães 2012 - Capital Europeia da Cultura e do CCB-Fábrica das Artes.

Teatro do Vestido:teatrodovestido.org/blog/
 
 
 

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