As guitarras e a dança vinda da Síria no final do Warm-up Paredes de Coura

Uma espécie de milagre sob a forma dos portugueses Linda Martini e a dança síria de Omar Souleyman tornaram a segunda noite do pré-festival mais interessante do que o arranque de sexta-feira.

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O festival aconteceu na Praça de D. João I
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Os Linda Martini aproveitaram para mostrar material novo
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Lee Ranaldo encerrou o festival com um dos melhores concertos

Começa o dedilhado de Amor Combate, a fazer a cama para o lamento do vocalista André Henriques, e eis que, entre o povo, surge um isqueiro. Ora, um isqueiro é coisa que não abunda em concertos de bandas que costumam levar o epíteto “indie”. Mas os Linda Martini são uma espécie de milagre: eis uma banda com canções de longos minutos, que bebem do pós-rock e do rock dos Sonic Youth, que se tornou um caso sério de popularidade. Voltaram a mostrá-lo sábado, no segundo e último dia do Warm-up Vodafone Paredes de Coura, no Porto.

No que toca à adesão popular foram, a par da pista de dança síria montada por Omar Souleyman, o momento alto do festival, que começou morno, mas teve uma segunda noite bem mais interessante.

Começou com os voos cósmicos dos Sensible Soccers, outros portugueses sabedores do seu ofício, e as inglesas Stealing Sheep, que conseguem cozinhar um prato em que cabem o apuro melódico das Sleater-Kinney e lições tiradas dos discos dos Fairport Convention que os pais guardavam no sótão. A riqueza instrumental das Stealing Sheep não passou totalmente para o palco instalado na Praça D. João I (por culpa de condições sonoras deficientes, que, no caso delas, abafou os teclados), mas, ainda assim, o trio de Liverpool mostrou muitos talentos e conquistou o povo.

Menos esforço tiveram que fazer os Linda Martini, há algum tempo longe dos palcos. “Este é o primeiro [concerto] do ano. Espero que se divirtam tanto como nós”, disse o baterista, Hélio Morais. E assim foi: primeiro com Este Mar, embalo pós-rock de proporções mastodônticas, como se quer; depois com Dá-me a Tua Melhor Faca, cantada com força pela juventude nas primeiras filas (bonito momento em que tudo amansa, canta-se “dá-me a tua melhor faca para cortarmos isto em dois e amanhã esquecer” e a guitarra de Pedro Geraldes enxerta portugalidade no pós-rock). Venceram e ainda apresentaram um tema novo, dono de uma fúria punk que excita e promete.

Depois dos Linda Martini, Omar Souleyman trocou a geografia. Não fomos para a Síria, o país de origem deste curioso fenómeno que nasceu à margem dos circuitos “oficiais” da world music, mas para um local novo, sem latitude nem longitude definidas, onde dois teclados conjuram um acidente violento entre a música de dança ocidental e tradições árabes – um delicioso acidente.

Omar, que se tornou famoso localmente por actuar em casamentos (as gravações destas actuações produziram uma discografia oficiosa com qualquer coisa como 500 registos), antes de se tornar objecto de fascínio para melómanos de todo o mundo, é o mestre-de-cerimónias, o cantor. Atrás dele, um músico controla dois sintetizadores, de onde saem batidas aceleradas, percussão sintética, fraseados melódicos exóticos para os ouvidos ocidentais. Tudo surge como uma bonita e estranha confusão à qual o público responde com uma bonita e estranha dança.

De volta às guitarras, o palco recebeu Lee Ranaldo, guitarrista extraordinário dos Sonic Youth, agora concentrado na sua própria banda. A Lee Ranaldo Band é uma soma notável de músicos: nas guitarras há Ranaldo e Alan Licht (fabuloso músico experimental); atrás da bateria, Steve Shelley, colega de Ranaldo nos Sonic Youth; e no baixo está Tim Luntzel, que já trabalhou com uma infinidade de gente, de Norah Jones aos Bright Eyes.

A banda visitou Between the Times and the Tides (2012), com temas como Angles e Fire Island (Phases), e mostrou novidades ainda por editar. Ao vivo, torna-se mais clara a forma expansiva como Ranaldo aborda as guitarras nesta sua nova fase dedicada à canção fora dos Sonic Youth. São canções a meio caminho entre a dissonância dos Sonic Youth e uma certa ideia clássica de “americana” (não raras vezes nos lembrámos de Neil Young).

Em momentos como Waiting on a Dream e, sobretudo, Off the Wall, Ranaldo lembrou os R.E.M. – ou seja, faz canções de guitarras de corpo inteiro. Noutros, recordou o que faz dele uma personagem única – em Hammer Blows, recorreu a um arco de violino para liquefazer a sua guitarra em feedback e ruído para nosso contentamento.

A noite prosseguiu com o chileno Matias Aguayo, que cantou algo desajeitadamente (é esse o seu jeito) em cima de uma festa de loops. Um curioso final para uma noite com muita e diversificada música.

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