Saque arqueológico prossegue no Iraque, denuncia National Geographic

Uma equipa de peritos americanos da National Geographic recentemente regressada do Iraque denunciou ontem a continuação do saque nos sítios arqueológicos do país, dando conta de que vários continuam sem guarda e necessitam de protecção urgente."Milhares de peças estão a ser tiradas e levadas para fora do país", disse McGuire Gibson - especialista em arqueologia da Mesopotâmia, consultor da UNESCO e um dos membros da delegação da National Geographic - durante uma conferência de imprensa telefónica a que o PÚBLICO teve acesso. O líder da expedição, Henry Wright - conservador do departamento de arqueologia do Médio Oriente da Universidade de Michigan -, sublinhou "a tragédia real [do saque] no Museu de Bagdad", considerando que as perdas são "sérias", "apesar de não serem tão grandes como se pensou inicialmente".O inventário que está a ser feito em Bagdad, por americanos e responsáveis do museu, dá conta neste momento de 33 peças, entre as mais importantes desaparecidas, mas, lembram os investigadores da National Geographic, há que não esquecer, no balanço das perdas, alguns milhares de outras peças, danificadas ou roubadas.Durante a sua estadia no Iraque, entre 10 e 24 de Maio, a equipa da National Geographic, dividida em três grupos, cada um dos quais integrando pelo menos um arqueólogo iraquiano, visitou nove sítios arqueológicos no Norte (incluindo Nínive, Nimrud, Hatra e Assur), quatro na zona de Bagdad (além do museu), e 10 no Sul (entre os quais Babilónia e Ur).Na antiga capital assíria de Nimrud, a expedição testemunhou os vestígios de uma pilhagem em que "os saquedores sabiam muito bem o que queriam", e que resultou na perda de dois relevos. Tal como o PÚBLICO pôde verificar na altura, apenas depois deste saque duas dezenas de soldados americanos foram enviados com a missão de proteger o local.Em Nínive, uma das mais importantes cidades da antiga Mesopotâmia - situada nas margens do Tigre, diante da actual Mossul -, os peritos detectaram "destruição sem alvo específico" nos relevos assírios, buracos feitos por eventuais saqueadores em busca de ouro e "sinais de negligência [na conservação] durante o período das sanções". A segurança, lembram, é intermitente, tendo a National Geographic recomendado que passasse a ser permanente.Os especialistas que visitaram o Museu de Mossul assinalam os danos causados a peças da galeria assíria e de Hatra e o saque, nomeadamente, de fragmentos dos portões do palácio de Balawat [ver PÚBLICO de 21/05]. Também aqui a segurança é deficiente.No sítio de Tell Billa, ainda a Norte, os peritos encontraram bombas não explodidas, que continuam a constituir uma ameaça.No Sul, à excepção de Ur - a mítica cidade suméria considerada o berço de Abraão, em que uma maciça presença americana (uma base aérea com 10 mil homens) não facilita a aproximação de saqueadores -, o grupo da National Geographic verificou danos e saques sistemáticos, nomeadamente em sítios menos conhecidos, ainda não escavados por arqueólogos. McGuire Gibson usou mesmo a expressão "queijo suíço" a propósito dos buracos abertos por saqueadores em lugares como Dahaileh ou Larsa. Este perito sobrevoou de helicóptero 13 sítios arqueológicos no Sul, tendo testemunhado danos generalizados também em Umma e Umm al Aqarib. A arqueóloga Elisabeth Stone disse que perto de Larsa "há um mercado ilegal de antiguidades", que são traficadas via Irão. E acusou os "milionários dos Estados Unidos, Europa e Japão" de serem co-responsáveis na destruição: "O saque dos museus e dos sítios arqueológicos é coberto pelo desejo dos compradores ocidentais".Na Babilónia, o museu da cidade foi saqueado e os fundos da biblioteca reduzidos a cinzas. Agradecendo às forças da coligação toda a colaboração prestada durante a visita, Henry Wright, o líder da expedição, não deixou de concluir que "alguns dos sítios arqueológicos sofreram danos consideráveis e muitos continuam sem vigilância". A maior parte permanece por escavar. "Protegê-los é uma tarefa crucial se queremos continuar a investigar as origens da nossa civilização."

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