Vida em Marte? A NASA contrariada pelos micróbios do seu robô

Após a descoberta de água em Marte, a NASA vê-se agora confrontada com a impossibilidade de enviar o seu robô Curiosity investigar.

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Nos veios escuros descobertos em 2011 em Marte, sabe-se agora que escorre água salgada ciclicamente NASA

A agência espacial norte-americana NASA anunciou que não vai poder enviar o seu laboratório móvel, o Curiosity, analisar os escorrimentos de água salgada em Marte, cuja descoberta foi anunciada na passada segunda-feira — e que tem implicações directas para a procura de vida extraterrestre —, porque receia que isso possa contaminar o planeta vermelho com micróbios vindos da Terra.

Na origem deste dilema está a decisão, já antiga, de aumentar o nível de higiene de todos os materiais que possam entrar em contacto com ambientes húmidos susceptíveis de acolher eventuais formas de vida marciana. A NASA, a Agência Espacial Europeia (ESA) e outras agências espaciais seguem as regras de um tratado internacional que visa “evitar qualquer forma de contaminação prejudicial” durante a exploração espacial.

O robô Curiosity, que pousou em Marte em Agosto de 2012, tem por missão recolher amostras de solo e de rochas. “O Curiosity não foi feito para ir aos locais susceptíveis de albergarem vida microbiana”, explicou à AFP Michael Meyer, da equipa de exploração marciana da NASA. Por isso, não pode de forma alguma aproximar-se das estrias húmidas que aparecem em certas encostas do planeta vermelho. “Para isso, precisaríamos de condições muito elevadas de limpeza”, salienta este especialista.

Já outros robôs, enviados há 40 anos pela NASA no âmbito do seu programa Viking — e que também pousaram em Marte —, teriam correspondido às exigências de limpeza agora necessárias. “Os robôs Viking eram essencialmente estéreis, mas as missões que enviámos a seguir não foram submetidas ao mesmo tratamento”, salienta Catharine Conley, que dirige o gabinete de protecção planetária da NASA, encarregue de evitar contaminações entre a Terra e os outros planetas. “Seria óptimo termos novamente essa capacidade, para podermos ir directo às estrias e recolher amostras”, acrescenta.

“Uma questão de orçamento”
“Não queremos ser lembrados como a espécie que foi a outro planeta e eliminou todas as formas de vida potencialmente presentes”, explica, por seu lado, Jorge Vago, um dos cientistas do projecto ExoMars da ESA. Isto porque as bactérias terrestres poderiam, “em certas condições, encontrar um ambiente propício para prosperar. Ora, isso está fora de questão”, frisa.

“E também queremos eliminar as bactérias dos nossos robôs para evitar descobrir vida em Marte e depois nos apercebermos de que se trata apenas de marcas deixadas por nós próprios”, acrescenta Catharine Conley.

Mas então, por que é que a NASA não tomou as devidas precauções, enviando um robô esterilizado, caso fosse necessário? “A presença de água à superfície de Marte não tinha sido confirmada na altura”, justifica Jim Watzin, director do programa de exploração marciana da NASA. “O Curiosity tinha sido concebido para prosseguir outras pesquisas, que mostravam, através da geologia, que a superfície de Marte já apresentara elementos aquáticos num passado longínquo — mas não elementos aquáticos actuais”, explicou à AFP.

A outra razão que levou a não esterilizar o Curiosity foi financeira. “É uma questão de orçamento e de prioridades”, salienta Catharine Conley. “As pessoas têm tendência a preferir que façamos ciência interessante a custos reduzidos.” Para além disso, as técnicas de esterilização dos robôs Viking — que consistiam essencialmente em submeter os materiais a temperatura muito altas — teriam danificado os equipamentos electrónicos de hoje.

Já agora, também não foi prevista uma esterilização profunda para a próxima missão da NASA ao planeta vermelho — a Marte 2020 —, frisa Jim Watzin. Contudo, este cientista não fecha a porta a possíveis adaptações ulteriores.   

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