Vacina contra a gripe não funciona bem em ratinhos obesos

Ratinhos obesos vacinados não conseguiram evitar infecções quando entram em contacto com vírus da gripe. Por isso, os cientistas dizem que é preciso ver se o mesmo acontece nas pessoas.

Foto
Pic Nic (2001), de Fernando Botero DR

Quando ratinhos obesos são vacinados contra a gripe, passam a produzir anticorpos contra o vírus. Ou seja, desenvolvem uma resposta imunitária, tal como era esperado. Mas, ao contrário dos ratinhos com peso normal, que combatem o vírus da gripe depois de serem vacinados e evitam infecções, nos ratinhos obesos vacinados a produção de anticorpos não os torna imunes ao vírus da gripe: ficam, na mesma, infectados pelo vírus e desenvolvem a doença, podendo morrer, conclui uma investigação publicada na revista científica mBio.

A descoberta poderá ter implicações para os seres humanos. Já tinham sido feitas associações entre a obesidade e uma susceptibilidade maior ao vírus da gripe. Mas será preciso fazer ensaios clínicos para testar se as vacinas têm o mesmo efeito em pessoas obesas e não obesas.

“Os resultados deste estudo são muito preocupantes em relação à eficácia da vacinação nos obesos”, lê-se na conclusão do artigo da mBio. “No passado, os estudos sobre a resposta da vacina da gripe em crianças e adultos obesos deram vários resultados, com alguns a mostrar que não há diferença na resposta serológica entre grupos obesos e grupos magros. No entanto, o nosso estudo indica que, mesmo se a população obesa estiver protegida de acordo com os níveis serológicos [revelando a produção de anticorpos contra o vírus], a eficácia pode estar diminuída e haver um aumento de incidência da gripe numa população cada vez mais obesa.”

A obesidade é um dos principais problemas de saúde mundiais. Segundo o artigo, 70% dos europeus irão ter peso a mais em 2030. Em Portugal, 28,7% dos adultos são obesos. Por isso, os autores do estudo quiseram perceber qual o efeito da obesidade no desenvolvimento de imunidade das vacinas contra a gripe.

“Este é o primeiro estudo que mostra que as estratégias actuais para reforçar a eficácia da vacina da gripe protegeram ratinhos magros de ficarem seriamente doentes mas ficaram aquém de proteger os ratinhos obesos das infecções”, diz uma das autoras do estudo, Stacey Schultz-Cherry, do Hospital de Investigação Pediátrica St. Jude, no Tennessee (EUA), citada num comunicado da instituição.

Para isso, os investigadores usaram vacinas com vírus da gripe mortos da estirpe H7N9 e os famosos adjuvantes, destinados a aumentar a potência da vacina. Por isso, a dose menor de vírus mortos para desenvolver uma resposta imunitária eficaz é menor.

Apesar de a vacina aumentar os níveis de anticorpos tanto nos ratinhos com peso normal como nos obesos, quando ambos os grupos de roedores foram infectados as suas respostas foram diferentes. Enquanto os ratinhos com peso normal não desenvolveram uma infecção, os obesos ficaram doentes.

“A resposta imunitária dos animais obesos faz lembrar a das pessoas idosas, que pode ser aumentada mas alguma coisa está errada. Quando são infectados com o vírus, os animais continuam sem protecção”, explica Stacey Schultz-Cherry.

Apesar disso, a equipa tentou aumentar a capacidade imunitária dos ratinhos. Um estudo recente fez isso em pessoas idosas: deu-lhes uma dose mais forte da vacina da gripe e houve, de facto, um aumento da protecção contra esta doença viral. Por isso, a equipa aplicou uma dose quatro vezes mais forte da vacina aos ratinhos obesos. Ainda assim, os mais obesos continuaram susceptíveis ao vírus e desenvolveram infecções, mesmo quando foram infectados com uma dose mais pequena de vírus da gripe.

“O vírus penetra de forma mais profunda nos pulmões dos ratinhos obesos e eles parecem ter mais dificuldade em reparar as lesões [causadas pelo vírus]”, diz Stacey Schultz-Cherry.

Não se sabe qual é o mecanismo que torna os ratinhos obesos mais susceptíveis ao vírus. “Há uma necessidade urgente a nível da saúde pública de se fazer esta experiência nos humanos e compreender qual é a resposta à vacina neste segmento da população que continua a crescer”, refere a investigadora, que defende ainda a necessidade de compreender o mecanismo responsável pela ineficácia da vacina nos ratinhos obesos, para a ultrapassar.

Ainda assim, a cientista argumenta que a vacinação continua a ser essencial: “Independentemente destes resultados, a vacina da gripe é necessária. Mesmo se se ouvir nas notícias que a vacina não corresponde a todas as estirpes do vírus que estão em circulação, é preciso recordar que há três ou quatro estirpes diferentes do vírus da gripe nas vacinas, e apenas uma pode não corresponder à que existe em circulação. Mesmo se a vacina não é ideal, é melhor do que nada.”  

Sugerir correcção
Ler 1 comentários