Técnica electroquímica permite datar objectos antigos de cobre e bronze

Pela primeira vez, uma equipa luso-espanhola de cientistas desenvolveu uma técnica que determina directamente a idade de objectos arqueológicos à base de cobre com mil anos ou mais.

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Jarra de água hispânica da época do califado (circa 950 d.C.) Ángel Velasco

Até aqui, determinar a idade de objectos arqueológicos à base de cobre – em particular, de bronze – só era possível indirectamente, medindo certos isótopos do carbono presentes nos materiais orgânicos encontrados na proximidade ou depositados na mesma camada sedimentar que os objectos de fabrico humano que se pretendia datar.

Mas agora, num artigo publicado na edição internacional da prestigiada revista Angewandte Chemie, cientistas de Espanha e Portugal apresentam uma nova técnica de datação do cobre e do bronze (liga feita principalmente de cobre), baseada na “assinatura” electroquímica de dois óxidos de cobre. Os investigadores conseguiram assim datar directamente, com bastante precisão, objectos históricos feitos destes metais. Para mais, a técnica usada é muito pouco invasiva, uma vez que a datação pode ser realizada a partir de uma minúscula amostra do material em estudo.

Mais precisamente, a nova técnica, desenvolvida pela equipa de António Doménech-Carbó, da Universidade de Valência, em colaboração com Sofia Capelo, das universidades de Évora e Lisboa, determina o rácio de dois produtos da corrosão do cobre, que se formam à superfície dos objectos arqueológicos que contêm cobre após longos períodos de tempo, explica aquela universidade espanhola em comunicado.

“Até aqui, não existia nenhum método específico para a datação de objectos arqueológicos de cobre e bronze”, disse ao PÚBLICO Doménech-Carbo. “Só nos casos em que esses objectos estavam associados a matéria orgânica era possível datar a matéria orgânica pelo método do carbono-14.”

O método agora desenvolvido consiste em realizar uma análise electroquímica, dita de “voltamperometria”, que mede as variações da corrente que passa entre dois electrodos mergulhados num líquido condutor em função da diferença de potencial (voltagem) entre eles. Em muitos casos, explica a revista alemã, os gráficos assim obtidos possuem picos característicos que revelam os compostos presentes no electrodo portador do material a analisar.  

O que estes cientistas agora fizeram foi utilizar a voltamperometria para medir a proporção de dois produtos da corrosão do cobre. Acontece que, quando os objectos que contêm cobre são expostos ao ar, a sua superfície se cobre naturalmente de cuprite (dióxido de cobre). E, à medida que o tempo passa, essa camada é convertida lentamente noutros produtos de corrosão – e em particular em tenorite (óxido de cobre).

Os cientistas revestiram com parafina um electrodo de grafite e a seguir colheram, na superfície do objecto metálico a datar, alguns nanogramas de metal. “A submicroamostra de pátina de corrosão é colhida mediante uma ligeira percussão com a barrinha de grafite”, explica ainda Doménech-Carbó.

A seguir, quando mergulharam esse electrodo de grafite “contaminado” pelo objecto a datar num electrólito aquoso, as micropartículas dos óxidos de cobre provenientes do objecto produziram “sinais característicos da cuprite e da tenorite”, acrescenta o cientista.

Utilizando então uma série de moedas antigas de cobre pertencentes às colecções do Museu Pré-histórico de Valência e do Museu Arqueológico de Xàtiva (cidade da província de Valência) – bem como moedas de cêntimos de euro, feitas em cobre –, a equipa construiu uma curva da relação de cuprite/tenorite nestes objectos de idade conhecida. Isso permitiu-lhes calibrar a sua técnica para depois conseguir datar objectos arqueológicos de idade desconhecida. “Esta calibração foi a parte mais difícil do trabalho”, diz Doménech-Carbó, cuja equipa começou a estudar os metais arqueológicos em 2005, tendo desenvolvido a técnica de datação, primeiro com objectos de chumbo e depois de cobre/bronze (em geral mais abundantes nas escavações arqueológicas), num projecto que dura desde 2009.

Em 2012, diz-nos ainda Doménech-Carbó, “estabelecemos uma colaboração com [Sofia] Capelo que, enquanto especialista de electroquímica, contribuiu de forma muito significativa para este trabalho”.

De facto, a última etapa do trabalho consistiu em datar uma jarra de bronze do período do califado de Córdova (929-1031 d.C.) e um capacete militar da época romana. Os resultados directos estão de acordo com as datações indirectas, realizadas anteriormente a partir do contexto em que estes objectos se encontravam: entre 970 e 1130 anos para o primeiro e entre 2000 e 2300 anos para o segundo. Uma incerteza, salienta o comunicado da universidade espanhola, de mais ou menos 150 anos para objectos com mil ou mais anos.

“Este método pode fornecer novos dados no campo da arqueologia e logicamente prende-se com o objectivo importante da datação”, diz-nos ainda Doménech-Carbó. Porém, avisa, “o problema é que os objectos de cobre e bronze apresentam frequentemente níveis de corrosão acelerados ou irregulares, que fazem com que o nosso método” não possa ser o único a ser aplicado para fazer este tipo de datação. “O nosso método deve ser entendido como complementar – e não como um substituto – das técnicas tradicionais.”
 

   


 

   

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