Portugueses fizeram testes ao escudo térmico “desde o parafuso”

Há cinco anos que a empresa portuguesa ISQ está a testar, passo a passo, o escudo térmico do novo veículo espacial europeu que está prestes a ter o seu primeiro banho de realidade.

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O novo veículo espacial a ser colocado dentro do nariz do foguetão Vega, a 28 de Janeiro de 2015 ESA/M. Pedoussaut

Ainda não vai ser esta quarta-feira que os responsáveis da empresa portuguesa ISQ vão ter a derradeira resposta sobre a capacidade do escudo térmico do Veículo Intermediário Experimental. Apesar de esta nave da Agência Espacial Europeia (ESA, sigla em inglês) ter o seu voo no espaço previsto para esta quarta-feira, numa missão de uma hora e 40 minutos, que acabará com um mergulho no oceano Pacífico, essas respostas virão mais tarde. O objectivo do lançamento é testar uma panóplia de tecnologias que a ESA considera importantes para manter a Europa na vanguarda do desenvolvimento espacial.

Uma das tecnologias é o escudo térmico desenvolvido pela empresa francesa Safran, cujos testes foram feitos pelo ISQ (antigo Instituto de Soldadura e Qualidade) nos últimos cinco anos, em quatro laboratórios diferentes da empresa. “A Safran desenvolveu a tecnologia passo a passo, com base em modelos numéricos. E foi necessário testar e validar o modelo também passo a passo”, explica Paulo Chaves, responsável pelo projecto do veículo da ESA dentro da ISQ. “Faltava escolher os materiais e definir o desenho [configuração] dos materiais – desde o parafuso.”

O escudo térmico é importantíssimo para qualquer nave que volta do espaço e tem de enfrentar a atmosfera terrestre. Durante a reentrada, devido à grande velocidade que as naves atingem, o atrito que se gera faz subir a temperatura do casco. Se não houver uma boa protecção, ou se houver alguma falha, a nave pode explodir – como aconteceu com o vaivém Columbia, dos Estados Unidos, em 2003.

O casco de cor preta do Veículo Intermediário Experimental é uma das inovações da ESA. “É um sistema que não arde, ao contrário dos vaivéns norte-americanos, das naves Apolo e das cápsulas soviéticas. Tem um escudo térmico muito rijo, feito de um material compósito de cerâmica”, descreve Paulo Chaves. “Se acendermos um maçarico durante uma hora, não arde. E quando se desliga o maçarico, o material volta a ter as características físicas iniciais.”

Segundo o engenheiro, o casco tem uma capacidade muito maior para absorver e libertar a energia durante a reentrada na atmosfera, onde se estima que a nave vá atingir uma velocidade de 27.000 quilómetros por hora. Estas propriedades fazem, em teoria, com que o casco não tenha de ser removido e substituído noutros voos, ao contrário dos vaivéns norte-americanos, o que torna o uso deste tipo de veículos mais barato.

A empresa portuguesa investiu cerca de dois milhões de euros no projecto, três dezenas de engenheiros da empresa estiveram envolvidos nos trabalhos. Esta quarta-feira, será o teste final, em que o material vai passar pela experiência real de atravessar a atmosfera da Terra. Paulo Chaves está em Kourou, na Guiana Francesa, para ver o lançamento. “Há sempre uma expectativa. Houve anos de trabalho”, diz, acrescentando que pode haver imprevistos, como a meteorologia não deixar o foguetão Vega – que transporta a nave – sair do chão.

A nave leva 300 sensores para medir parâmetros como a temperatura do casco, mas só depois voltar para os laboratórios é que a empresa vai saber o resultado da experiência, explica Paulo Chaves: “ Vamos avaliar se o sistema se comportou como estava previsto. Como é que o material ficou depois de o esforço mecânico e térmico.”

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