Os elevadores do futuro não terão cabos e poderão deslocar-se também na horizontal

A aplicação aos elevadores da tecnologia dos motores lineares – usada pelo comboio de levitação magnética Transrapid – vai permitir eliminar os cabos e pôr cabines deslizantes a transportar pessoas dentro dos edifícios.

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Imagem visionária dos elevadores de levitação magnética ThyssenKrupp
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Modelo da torre que está em construção em Rottweil, na Alemanha, para testar os elevadores à escala real ThyssenKrupp

O elevador, tal como o conhecemos, tem 160 anos e praticamente nunca mudou desde que em 1870 foi inaugurado o primeiro ascensor da era moderna no Equitable Building em Nova Iorque. Uma cabine, um poço, um cabo e um motor são os elementos básicos deste equipamento, que permitiu durante um século e meio a construção de prédios cada vez mais altos, assegurando a mobilidade de quem neles vive ou trabalha.

O pensamento que levou à concepção de um novo tipo de elevador teve-o o grupo alemão Thyssen, que concebeu a aplicação dos motores lineares ao movimento das cabines dentro dos edifícios. A ideia tem origem no comboio de levitação magnética Transrapid, que circula a mais de 400 quilómetros por hora num corredor próprio magnetizado. No caso dos elevadores, o interesse não está na velocidade (as pessoas sentem desconforto a partir dos dez metros por segundo), mas sim na possibilidade de se eliminar os cabos e a sala das máquinas, libertando espaço para os edifícios, além da maior capacidade de transporte, uma vez que podem no mesmo poço circular várias cabines em circuito fechado.

Mas como funcionam os motores lineares? Imagine-se uma série de pequenos ímanes ao longo de um corredor e imagine-se um veículo revestido também com pequenos ímanes. Agora active-se esses ímanes através de energia eléctrica e teremos um movimento contínuo de atracção e repulsão entre os ímanes estacionários do corredor e os do veículo, que fará com que este se desloque. É assim que funciona o Transrapid e as passadeiras rolantes Accel, também desenvolvidas pela Thyssen (ver PÚBLICO de 10/11/2014).

E agora imagine-se tudo isto na vertical. O elevador, em vez de se mover puxado por cabos, levita ao longo do poço, com a vantagem de funcionar em circuito fechado, acompanhado de outras cabines. Mais: a dado momento, as cabines poderão sair do poço e deslizar ao longo de corredores laterais ligando o interior dos edifícios na horizontal, ou até mesmo edifícios contíguos através de tabuleiros.

Esta invenção é já algo mais do que uma simples ideia e o primeiro protótipo, numa escala de 1:3 foi apresentado na semana passada em Gijón, onde a multinacional alemã possui um centro de inovação. Perante centenas de especialistas, engenheiros, arquitectos, jornalistas e potenciais clientes, Andreas Schierenbeck, presidente da ThyssenKrupp Elevator, mostrou o modelo de uma pequena torre, totalmente transparente, por onde se viam circular – na vertical e na horizontal – quatro cabines de propulsão linear.

Um protótipo mais a sério já está a ser construído na Alemanha, em Rottweil, numa torre com 246 metros de altura, onde, em 2016, se espera colocar elevadores à escala real em circulação.

A passagem de uma inovação para a sua comercialização nunca é imediata, mas Luís Ramos, director de comunicação da Thyssen, diz que ficou surpreendido com a quantidade de interessados. Há já cerca de 30 contratos de confidencialidade – todos privados e todos para projectos de arranha-céus –, que resultarão em igual número de projectos específicos para instalar o Multi, como foi baptizado este novo elevador. Obviamente, a maioria destes clientes são da Ásia, do Médio Oriente e dos Estados Unidos.

Dario Trabucco, especialista em arquitectura e professor na Universidade de Veneza, Itália, veio dar uma matiz académica à sessão de apresentação do Multi, historiando a implantação dos arranha-céus desde a disputa, nos fins do século XIX, entre Nova Iorque e Chicago pela construção dos maiores edifícios, até à actualidade.

E contou que já em 1909 se sentia a necessidade de ligar edifícios para que as pessoas não tivessem que descer e vir à rua para subir ao prédio vizinho. Uma necessidade que a tragédia das Torres Gémeas, em 2001, pôs em evidência quando se constatou que se demorava quatro horas e meia a evacuar as pessoas dos pisos mais altos, podendo esse processo ter sido acelerado se houvesse um tabuleiro horizontal entre eles.

Foi, aliás, essa constatação que levou a que as Torres Petronas (com 452 metros), em Kuala Lumpur, na Malásia, tivessem uma ligação entre elas. E que, dos nove projectos apresentados para substituir as Torres Gémeas em Nova Iorque, cinco contemplassem essa ligação. O que leva Dario Trabucco a concluir que os edifícios das cidades do futuro não deverão ficar isolados entre si, mas sim ligados e com serviços partilhados. E para isso, acrescentam os responsáveis da Thyssen, lá estará o seu Multi a solucionar as necessidades de mobilidade nessas metrópoles.

Cada vez mais arranha-céus
À partida, a empresa alemã tem a demografia e as tendências mundiais da construção a seu favor. Até 2050 a população do planeta crescerá até aos 9000 milhões de pessoas, das quais 70% viverão nas cidades. Actualmente, 63 cidades já têm mais de três milhões de habitantes e esse número não pára de crescer.

Para albergar tanta gente a viver e a trabalhar, constroem-se cada vez mais arranha-céus e cada vez mais altos. Em 2000, a altura média dos 50 edifícios mais altos do mundo era de 315 metros e em 2013 essa média era de 390 metros, o que representou um aumento de 25%. E já existem vários edifícios com mais de 600 metros de altura, sendo a Torre do Califa, no Dubai, o maior arranha-céus alguma vez construído, com 828 metros de altura. Não surpreende, assim, que até 2020 esteja prevista a construção de mais 200 arranha-céus, dos quais 130 terão mais de 300 metros.

“A indústria da construção civil tem os materiais e o know how para ir cada vez mais longe e mais alto, mas a partir dos 600 metros os cabos e os equipamentos para fazer funcionar os elevadores tornam-se ineficazes e utilizam muito espaço”, diz Karl Schollkops, chefe de desenvolvimento de produtos para arranha-céus da Thyssen. Por outro lado, os arquitectos têm vindo a desenhar edifícios modernistas, com formas pouco compatíveis com o típico elevador que sobe e desce através de um poço, antes sugerindo uma mobilidade também horizontal.

É isso que leva Karl Schollkops a dizer que os arranha-céus do futuro vão ter um autêntico sistema de metro no seu interior, com cabines a parar nas “estações” numa cadência muito frequente.

E isso é outra das vantagens apontadas ao Multi – a sua grande capacidade. Um estudo da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, concluiu que só em 2010 os trabalhadores dos serviços daquela cidade passaram 16,6 anos da sua vida profissional à espera dos elevadores e 5,9 anos dentro dos mesmos. Um sistema que diminua esses tempos tem evidentes ganhos de produtividade e de bem-estar.

A impossibilidade de no mesmo poço circular mais do que uma cabine (existem os elevadores Twin, também desenvolvidos pela Thyssen, que têm duas cabines, mas cujo alargamento a mais cabines é tecnicamente muito complexo devido ao número de cabos) é comparável a uma linha de caminho-de-ferro entre duas cidades e na qual só circula um único comboio. Com o sistema de motores lineares em vez de cabos, os elevadores podem transformar-se num autêntico metropolitano.

Segundo a Thyssen, o elevador Multi pode permitir o acesso quase constante das pessoas aos elevadores, com tempos de espera de 15 a 30 segundos. A velocidade destas viagens do futuro será de cinco metros por segundo, abaixo da dos actuais elevadores de alta velocidade nalguns arranha-céus, mas sem provocar mal-estar devido aos efeitos da pressão sobre o corpo humano.

A Thyssen não quis dizer quanto custou exactamente o projecto Multi – que beneficia da experiência das passadeiras rolantes com motores lineares, que estão na fase inicial de comercialização –, limitando-se a divulgar que tem gasto 700 milhões de euros por ano em investigação e desenvolvimento.

Além da eliminação dos cabos, estes elevadores possuem ainda outras características inovadoras. As cabines são feitas em compostos de carbono e pesam apenas 50 quilos, em vez dos 300 quilos das dos elevadores tradicionais.

Os sistemas de segurança despertaram a curiosidade dos visitantes em Gijón. O que acontece em caso de falha de energia eléctrica? O elevador cai? Não. Apenas parará no local onde se encontra, continuando “agarrado” à parede do poço através dos seus ímanes, seguindo logo viagem porque cada cabine estará dotada de uma bateria própria com energia suficiente para chegar à próxima “estação”.

O PÚBLICO viajou a convite da ThyssenKrupp

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