O que precisamos de saber para combater a perda de biodiversidade

Uma equipa internacional de peritos, liderada por um português, propõe uma lista de parâmetros indispensáveis à boa monitorização das alterações da diversidade da vida na Terra.

Parque Nacional do Yasuni, no Equador: esta zona da bacia amazónica é das que tem mais biodiversidade no planeta
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Parque Nacional do Yasuni, no Equador: esta zona da bacia amazónica é das que tem mais biodiversidade no planeta Enric Vives-Rubio
O cientista Henrique Miguel Pereira
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O cientista Henrique Miguel Pereira DR

Na próxima semana, em Bona, Alemanha, no primeiro plenário da Plataforma Intergovernamental para a Biodiversidade e os Serviços dos Ecossistemas (IPBES), o português Henrique Miguel Pereira e colegas de mais uma dezena de países vão apresentar a lista das “variáveis essenciais da biodiversidade” que, afirmam, é preciso medir para estudar a evolução da biodiversidade global e contrariar o seu declínio. E nesta sexta-feira, na revista Science, estes cientistas explicam como definiram as cerca de 30 variáveis.

O IPBES, criado pela ONU em 2010, inspira-se no Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) das Nações Unidas. O IPCC definiu 50 variáveis essenciais do clima — e o IPBES vai agora fazer o mesmo. Porém, o estudo da biodiversidade apresenta problemas mais complexos do que o do clima, disse ao PÚBLICO Henrique Miguel Pereira, do Centro de Biologia Ambiental da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que tem desempenhado um papel pioneiro no IPBES. “Qualquer país, mesmo o mais pobre, tem pelo menos, no aeroporto, uma estação meteorológica, mas na biodiversidade há menos recursos.”

Mas por que é que, apesar de existir uma base de dados com toda a informação disponível (o Global Biodiversity Information Facility ou GBIF), a monitorização global da evolução das espécies animais e vegetais é, ainda hoje, inexequível? Porque persistem regiões inteiras sobre as quais não há praticamente dados nenhuns de alterações da biodiversidade. “Mesmo com todos os dados que temos, há lacunas incontornáveis.”

Só em 2009-2010 é que os peritos perceberam o problema. “Foi uma primeira epifania”, diz o cientista, que vinha falando disso há anos, sem conseguir convencer os seus colegas. Henrique Miguel Pereira foi de facto o primeiro “a chamar a atenção para a falta de dados”, num artigo publicado em 2006 na revista Trends in Ecology & Evolution — e era, desde 2009, o coordenador do grupo de monitorização das espécies terrestres do GEO BON (Group on Earth Observations Biodiversity Observation Network).

A estratégia agora apresentada na Science consiste em concentrar os esforços, não na descoberta de novas espécies, mas no estudo da evolução de um conjunto de espécies já conhecidas, “repetindo, nos mesmos locais, as medições que foram feitas há 30 a 40 anos”, diz o investigador.

Para mais, cada país tem aplicado o seu próprio esquema de monitorização, tornando igualmente impraticável a integração dos resultados. A definição de variáveis essenciais, aplicáveis a todas as iniciativas locais, irá resolver este problema.

Uma das variáveis é a diversidade genética. Uma outra, talvez a mais essencial, é o número de elementos de cada espécie. Para fazer essa contagem, os cientistas esperam a participação de “cidadãos-cientistas” — amadores da observação das aves ou das borboletas, por exemplo.

Uma prova da eficácia da participação cidadã, frisa Henrique Miguel Pereira, tem sido o recenseamento na Europa, desde os anos 1980, das espécies comuns de aves (Pan-European Common Bird Indicator) — no qual participam 25 países europeus, incluindo Portugal. Ficou-se assim a saber que, em três décadas, o número de indivíduos de cada espécie diminuiu para menos de metade. O que poderá ter um grande impacto ambiental, uma vez que “os serviços que as aves prestam ao ecossistema serão afectados”, diz o cientista.

A lista das variáveis ainda não está fechada, mas Henrique Miguel Pereira espera reunir consenso em Bona — e tê-la pronta no fim do ano. 
 
 

Notícia corrigida às 9h50 de 18.01.2013. Correcção diz respeito ao cargo que Henrique Miguel Pereira ocupava em 2009, referido no quarto parágrafo.
 
 
 

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