Médico que descobriu ébola não ficou surpreendido com infecção em Espanha

O virologista Peter Piot prevê que mais casos possam ocorrer e nega a ideia de que o vírus se propague apenas nas más condições africanas.

Foto
Peter Piot foi um dos virologistas que descobriu o ébola nos anos 1970 Denis Balibouse / Reuters

O caso da auxiliar de enfermagem espanhola infectada com ébola não é surpreendente para Peter Piot, um dos maiores especialistas no vírus e conselheiro da Organização Mundial da Saúde (OMS). Em Espanha há mais uma profissional de saúde a apresentar sintomas, que deu entrada no hospital na madrugada desta quarta-feira.

“O erro mais simples pode ser fatal”, disse o especialista à BBC, dando exemplos aparentemente insignificantes, como um simples coçar de um olho, como suficientes para que haja infecção.

Muitas das vítimas do ébola foram profissionais de saúde a trabalhar em condições precárias na África Ocidental e a crença dominante era a de que em hospitais com infra-estruturas modernas e com protocolos de segurança homologados a probabilidade de contrair o vírus seria altamente reduzida. Mas o caso da auxiliar espanhola, que a imprensa espanhola se diz chamar Teresa Romero, veio alertar para a força contagiosa do ébola.

“Por exemplo, um momento muito perigoso é quando se sai da unidade de isolamento e se tira o equipamento de protecção – quando se encontra cheio de suor”, explicou Peter Piot. O especialista belga fez parte da equipa que em 1976 identificou pela primeira vez o vírus no Zaire (actual República Democrática do Congo).

Agora, no papel de conselheiro da OMS, Piot afirma não ter ficado surpreendido com a infecção da auxiliar espanhola – uma das que tratou os dois missionários infectados e que morreram no Hospital Carlos III de Madrid. A facilidade com que o vírus pode penetrar no organismo leva o especialista a prever que mais casos se vão suceder, embora a propagação não venha a ter as proporções que tem em África.

As declarações do virologista coincidem com a descrição da própria auxiliar que, numa pequena entrevista ao jornal El Mundo, garantiu ter seguido todos os procedimentos. “Não tenho ideia”, disse a funcionária quando questionada sobre a  forma como poderá ter contraído o vírus.

Uma outra auxiliar do mesmo hospital foi internada nesta quarta-feira com “algumas décimas de febre”, segundo o porta-voz do complexo hospitalar La Paz-Carlos III. Para já, a funcionária “está em observação”, tornando-se o quarto caso de suspeita de infecção, dois dos quais já foram testados. Na terça-feira foi revelado que o marido de Teresa, uma enfermeira e um homem que tinha viajado da Nigéria recentemente se encontravam em análise - as análises realizadas entretanto a estas duas últimas pessoas deram negativo.

O presidente do governo espanhol, Mariano Rajoy, pediu “tranquilidade” em relação à situação do ébola no país – cuja transmissão “não é fácil”, disse – e garantiu “transparência total” acerca dos novos desenvolvimentos.

A forma como surgiu o primeiro caso no mundo de contágio pelo vírus do ébola fora de África mostra que, ao contrário do que se pensava, os países ocidentais não estão realmente preparados para lidar com uma ameaça de saúde pública como esta.

Sugerir correcção
Ler 5 comentários