Japonesa aceita retirar de publicação um dos artigos sobre células estaminais

Mantêm-se as dúvidas sobre novo método de criação de células estaminais anunciado em Janeiro na revista Nature.

Foto
A investigadora Haruto Obakata a pedir desculpa, em Abril de 2014 JIJI PRESS/AFP

Ao fim de meses debaixo de fogo, a investigadora japonesa que tinha anunciado um novo método de criação de células estaminais concordou em retirar de publicação um dos seus dois artigos na revista Nature, publicados em Janeiro e em que foi a autora principal. Mas não é o artigo principal, no qual apresentava um método extraordinariamente simples, que prometia criar células estaminais como as dos embriões a partir de células já especializadas, forçando-as a regressar a uma infância celular.

Esta quarta-feira, Haruto Obokata, do Centro RIKEN para a Biologia do Desenvolvimento, em Kobe (Japão), anunciou, através do seu advogado, que ia retirar de publicação o artigo secundário relativo a essa investigação, assinado com outros dez investigadores. Nele diziam ser possível criar células estaminais a partir de diversos tecidos utilizando o novo método. 

Mas é no artigo científico principal que Haruto Obokata, com mais sete cientistas, descrevia o novo método que permitia criar células estaminais muito parecidas com as células estaminais embrionárias e que foram designadas por “células STAP”, a sigla em inglês de “aquisição de pluripotência desencadeada por um estímulo”.

As células estaminais que existem nos embriões têm a capacidade de dar origem a todos os tipos de células do corpo, diferenciadas e especializadas em cada tipo de tecido e órgão. Os cientistas têm procurado criar estas células à medida exacta de cada doente, para que possam ser utilizadas em medicina regenerativa. Uma forma de os cientistas as obterem é criando embriões que são clones de uma pessoa, aos quais são retiradas depois as células estaminais – mas esta investigação, pela destruição que implica dos embriões clonados, coloca problemas éticos.

O novo método descrito por Haruto Obokata evitava tudo isso, ao utilizar células diferenciadas (de ratinho, no caso das experiências) e era muito simples. Dizia-se que bastaria mergulhar as células do sangue dos ratinhos numa solução ligeiramente ácida durante cerca de meia hora, para que elas regressarem a um passado celular.

Pouco depois da publicação dos artigos científicos, na edição em papel de 30 de Janeiro da Nature, começaram a surgir em blogues acusações de manipulação de imagens e plágio. E em Abril, um comité do próprio RIKEN que investigou as acusações de fraude concluiu ter havido má conduta científica por parte de Haruto Obokata, ao ter misturado imagens de experiências diferentes e utilizado dados de trabalhos anteriores no artigo principal na Nature. Mas o comité não pedia que os dois artigos fossem retirados de publicação.

Em sua defesa, Haruto Obokata, de 30 anos, tem dito que tudo se deveu à sua inexperiência, que nunca pensou em fazer nada de mal e já pediu publicamente desculpa.

Ainda segundo uma notícia no site da revista Science, citando a imprensa japonesa, pelo menos dois dos dez co-autores com Haruto Obokata do artigo secundário (em forma de “carta”) deram o seu consentimento à retirada de publicação: Teruhiko Wakayama, da Universidade de Yamanashi, que é o último autor (o que significa que supervisiona todo o trabalho) e já se tinha demarcado publicamente deste artigo; e Yoshiki Sasai, director adjunto do RIKEN. Mas o último autor do artigo principal, Charles Vacanti, do Brigham and Women's Hospital, de Boston (EUA), tem defendido os resultados.

Na opinião de Paul Knoepfler, especialista em células estaminais da Universidade da Califórnia em Davis, citado pela Science, a Nature devia simplesmente retirar os dois artigos científicos. “É ingénuo pensar que só a ‘carta’ pode ser retirada e o artigo [sobre o método] pode manter-se, deixando alguma legitimidade à narrativa das células STAP. Penso que o destino final [dos dois artigos] está ligado.”

Sugerir correcção
Comentar