Cinco locais são candidatos à primeira aterragem de uma sonda num cometa

Até Novembro, ultimam-se os preparativos para o momento mais alto da missão da Roseta, quando um aparelho humano irá tocar num corpo preservado desde o início do sistema solar.

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O núcleo do cometa com alguns dos locais possíveis de aterragem ESA
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O cometa visto pela sonda Roseta
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A pequena sonda File, que foi levada às costas da Roseta e que irá aterrar no cometa ESA/ATG Medialab

A Agência Espacial Europeia (ESA) já seleccionou cinco locais possíveis para a primeira aterragem de uma sonda num cometa — uma estreia absoluta na história da exploração espacial, marcada para meados de Novembro. Os cinco locais agora divulgados resultam já de informações recolhidas pela sonda europeia, a Roseta, desde o seu encontro no início de Agosto, ao fim de uma década em viagem pelo espaço, com o cometa 67P/Churiumov-Gerasimenko.

A Roseta não fez essa viagem sozinha, em que percorreu mais de 6000 milhões de quilómetros, com algumas passagens pela Terra e por Marte para ganhar impulso, usando a gravidade destes planetas, que a ajudasse a chegar até ao cometa — e que, na altura do encontro, a 6 de Agosto, estava a 540 milhões de quilómetros do Sol, entre Júpiter e Marte. A Roseta levou consigo uma sonda mais pequena, a File, e é ela que protagonizará a aterragem no cometa.

Os cinco locais já são uma escolha entre dez apontados inicialmente, aos quais tinha sido atribuída uma letra, sem nenhuma ordem de classificação. A partir de imagens de grande resolução da superfície do cometa, de medições da temperatura e dos gases à volta do núcleo e de outros parâmetros como a sua rotação e massa (tem cerca de 10.000 milhões de toneladas, pelo que a sua pouca densidade pode indicar que é poroso), a lista mais reduzida foi decidida pelo Grupo de Selecção do Sítio de Aterragem numa reunião no último fim-de-semana.

Ao chegar perto do núcleo do cometa em Agosto, ficando só 100 quilómetros, a Roseta revelou um corpo com uma forma extremamente irregular, muito longe da ideia da bola de gelo suja de poeiras geralmente associada aos cometas, e que parece composto por dois bocados colados um ao outro. Mantêm-se agora na corrida a local de aterragem três sítios no bocado mais pequeno do núcleo (identificados pelas letras B, I e J) e dois (A e C) na parte maior.

Nunca um aparelho humano esteve tão perto do núcleo de um cometa. O mais perto que estivemos foi com a sonda Giotto, também da ESA, em 1986: a 605 quilómetros do núcleo do famoso cometa Halley, vimos então a sua forma abatatada.

“Tendo em conta a forma especial e a topografia global do cometa 67P/Churiumov-Gerasimenko, provavelmente não é surpresa que muitos locais tenham sido excluídos”, diz Stephan Ulamec, coordenador da File no Centro Aeroespacial Alemão em Colónia, em comunicado da ESA.

Para já, considera-se que esta aventura é tecnicamente possível nos cinco locais, tendo em atenção alguns aspectos. “Por exemplo, todos têm pelo menos seis horas de luz solar durante uma rotação do cometa e o terreno é plano. Claro que cada sítio oferece a possibilidade de descobertas únicas”, diz Stephan Ulamec.

“O cometa é muito diferente de tudo o que vimos antes e mostra características espectaculares, que ainda temos de compreender”, acrescenta Jean-Pierre Bibring, um dos cientistas principais da File.

Assim, a Roseta vai aproximar-se ainda mais do cometa — até 50 quilómetros —, para os cientistas poderem estudar minuciosamente os locais na shortlist. A 14 de Setembro, já deverão ter uma classificação, sendo desenvolvido um plano pormenorizado das operações. Ao mesmo tempo, a Roseta irá reduzir a distância ao 67P/Churiumov-Gerasimenko para apenas 20 a 30 quilómetros, permitindo a elaboração de mapas mais pormenorizados dos locais, sem esquecer os calhaus.

“O processo de selecção é extremamente complexo e dinâmico. À medida que nos aproximamos do cometa, veremos cada vez mais detalhes, que irão influenciar a decisão final de onde e quando poderemos aterrar”, diz Fred Jansen, coordenador da missão Roseta. “Depois da chegada ao cometa, tivemos de concluir muito depressa a análise preliminar dos locais candidatos e agora só temos mais algumas semanas para determinar o local principal.”

A tarefa será tudo menos simples, ou não fosse preciso atender a várias questões, enumeradas no comunicado da ESA: “A sonda que aterrará será capaz de manter comunicações regulares com a Roseta? Quão comuns são os perigos à superfície, como calhaus, fendas profundas e encostas escarpadas? Há iluminação suficiente para as operações científicas e luz solar suficiente para carregar as baterias do módulo de aterragem para lá das suas 64 horas iniciais de vida, mas sem causar aquecimento excessivo?”

O sítio deverá ser escolhido a 12 de Outubro, seguindo-se a confirmação final dois dias depois. Se tudo estiver a postos, o dia marcado para a aterragem é 11 de Novembro. Então, a Roseta libertará a File perto do cometa e ela, de apenas 100 quilos, descerá até ao local escolhido.

Como a atracção gravítica exercida pelo cometa é fraca — pois tem só quatro quilómetros de diâmetro —, a descida da File far-se-á lentamente, à velocidade de um metro por segundo, a mesma de um passo humano. Uma vez na superfície, prender-se-á ao cometa com arpões, para não ser atirada de volta ao espaço.

Nessa altura, o cometa ainda estará suficientemente longe do Sol para não comprometer as manobras de aterragem: andará a 450 milhões de quilómetros, numa viagem em que a cada seis anos e meio o aproxima até 185 milhões de quilómetros do Sol, ficando entre Marte e a Terra. E a File e a Roseta poderão acompanhar as mudanças que se desenrolarão a seguir, ao longo de 2015, à medida que a proximidade ao Sol for originado uma enorme cauda feita de gases.

A File permitirá que investiguemos, como nunca o fizemos, um cometa e os seus materiais conservados desde o início do sistema solar. Até perfurará o núcleo. Espera-se aprender mais sobre a história do sistema solar e se os cometas, ao terem chocado com a Terra no passado, trouxeram a água e os compostos orgânicos que permitiram o aparecimento da vida no nosso planeta.

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