Meloni reivindica liderança do próximo governo: “Os italianos enviaram uma mensagem clara”

Com a contagem de votos quase terminada, a coligação de direita obtém mais de 43% dos votos e o Irmãos de Itália destaca-se. Coligação de centro-esquerda fica-se pelos 26%, líder do Partido Democrático não se recandidata.

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Extrema-direita chega ao poder em Itália. "Não gosto dela, mas é o que os italianos precisam” Reuters, Joana Gonçalves

Eram 2h30 (1h30 em Lisboa) quando Giorgia Meloni declarou vitória nas eleições legislativas de domingo em Itália, reivindicando a liderança do próximo governo. No primeiro discurso após a votação, a líder do partido de extrema-direita Irmãos de Itália (FdI) garantiu que irá governar “para todos” e “para que os italianos se possam orgulhar de ser italianos”.

“Os italianos enviaram uma mensagem clara de apoio a um governo de direita liderado pelo FdI”, disse Meloni à imprensa num hotel de Roma.

Os votos continuam a ser contados na manhã desta segunda-feira, mas é já claro que a vitória é da coligação de direita e extrema-direita. De acordo com os resultados parciais, a aliança liderada pelo FdI e que junta a Liga, de Matteo Salvini, e o partido Força Itália, de Silvio Berlusconi, obteve perto de 44% dos votos, com o partido de Meloni a destacar-se por larga margem, ao obter 26,12% das preferências.

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Mais de sete milhões de eleitores depositaram o seu voto no FdI, mais do que duplicando o número de votos obtido pelo segundo partido da coligação, a Liga, e igualando o número obtido pela coligação de quatro partidos de centro-esquerda. Esse bloco, liderado pelo Partido Democrático, de Enrico Letta, terá à volta de 26% dos votos.

“É um sonho”, disse um dos fundadores do Irmãos de Itália, Fabio Rampelli, à Reuters, enquanto abraçava um colega que lhe dizia apenas “finalmente”. Em palco, Meloni recordava o percurso do partido, de um grupo marginal de extrema-direita ao mais votado do país. “O facto de o FdI ser o primeiro partido significa tanta coisa para tantos de nós: é seguramente uma noite de orgulho, de lágrimas, abraços e sonhos”, disse a líder, advertindo os companheiros de partido: “Devemos recordar-nos que não estamos num ponto de chegada mas de partida e que a partir de amanhã temos de mostrar o nosso valor.”

Itália prepara-se assim para ter o governo mais à direita desde a Segunda Guerra Mundial e o primeiro de sempre liderado por uma mulher. Com estes dados, a aliança terá maioria na Câmara dos Deputados e no Senado.

“É hora de os italianos voltarem a ter um governo que sai de uma decisão nas urnas e é algo em que todos têm de prestar contas,” sublinhou Meloni. Durante o último ano e meio, o país teve um governo de nomeação presidencial, liderado por Mario Draghi. “A situação com que a Itália e a União Europeia se deparam é particularmente complexa e requer o contributo de todos. Requer um clima sereno, o respeito recíproco que está na base do confronto [político] em qualquer sistema democrático”, disse Giorgia Meloni.

A líder política lamentou uma campanha eleitoral que descreveu como “agressiva e violenta” e assegurou que trabalhará para “reconstruir a relação entre o Estado e os cidadãos”. ​“Temos de entender a responsabilidade que nos deram dezenas de milhões de italianos e não vamos trair essas pessoas, como nunca as traímos”, prometeu Meloni.

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A participação nas eleições gerais da Itália no domingo foi de cerca de 63,81%, abaixo do valor de 72,9% registado nas eleições de 2018, disse a ministra do Interior italiana, Luciana Lamorgese. “O desafio agora é fazer com que as pessoas acreditem nas instituições; muitos italianos ainda decidem não confiar”, disse Meloni.

(In)satisfação da Liga

Pouco depois do encerramento das urnas no domingo à noite, Matteo Salvini congratulou-se no Twitter por “o centro-direita [estar] em clara vantagem” no escrutínio. Porém, para a sua Liga, estas eleições representam uma queda expressiva face às de 2018. O partido não deverá ir além dos 8,8% dos votos, tendo obtido a preferência de cerca de 2,5 milhões de eleitores. Há quatro anos a Liga foi a terceira força mais votada, com 17,35% e 5,7 milhões de votos.

“Hoje falamos de um resultado que evidentemente não me satisfaz”, admitiu Matteo Salvini na segunda de manhã. “É claro que estar na oposição deu frutos e Giorgia Meloni fê-lo bem. Mas estamos no governo como protagonistas”, acrescentou. “Hoje é um belo dia porque temos cinco anos de estabilidade pela frente”, disse Salvini, que se reunirá com a líder do FdI já esta segunda para alinhavar o próximo elenco governativo.

Acusações mútuas e uma baixa

Já o Movimento 5 Estrelas, apesar de também dar um grande trambolhão face às eleições de 2018, celebra os cerca de 15% obtidos no sufrágio de domingo, que nenhuma sondagem lhe atribuía. A formação de Giuseppe Conte impôs-se ao Partido Democrático em todo o sul do país. “Seremos uma força de oposição que actuará com coragem e determinação”, disse Conte ainda no domingo à noite, lamentando que não tenha sido possível formar uma aliança que travasse a chegada da direita ao poder. “As escolhas do Partido Democrático ajudaram o centro-direita”, acusou o ex-primeiro-ministro.

Enrico Letta, líder do Partido Democrático, só reagiu aos resultados na manhã desta segunda-feira. A sua formação obteve 19% dos votos, pouco mais do que os 18,7% conseguidos em 2018 por Matteo Renzi. "Hoje é um dia triste para a Itália e para a Europa. Esperam-nos dias duros”, disse Letta aos jornalistas, devolvendo a acusação ao 5 Estrelas: “Se chegámos a este ponto foi porque Conte fez cair Draghi.”

O líder partidário admite que este é “um resultado insatisfatório”, mas sublinha que o PD “é o segundo partido do país, o segundo grupo parlamentar e a primeira força da oposição”. E, por isso, garantiu Letta, fará “uma oposição dura e intransigente”, que “não permitirá que a Itália saia do coração da Europa, se desligue dos valores europeus e dos valores da Constituição”.

Enrico Letta, no entanto, anunciou que não se recandidata à liderança do partido. O próximo será “um congresso de profunda reflexão” para definir “um novo PD que esteja à altura desta época, em face de uma direita mais à direita do que nunca”.

Próximos passos

A seguir à proclamação oficial dos resultados, que ainda pode demorar alguns dias, as duas novas câmaras do Parlamento italiano (Câmara de Deputados e Senado) tomam posse em meados de Outubro, previsivelmente a 13, e só depois é que o Presidente, Sergio Mattarella, começa a sua ronda de contactos com vista à formação de um governo.

Tendo em conta os expressivos resultados da coligação de direita, as conversas deverão ser rápidas e prevê-se que o Presidente nomeará o novo chefe do Governo numa questão de horas ou no dia seguinte. Os membros do novo executivo tomam posse e depois dá-se a investidura no Parlamento.

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