Eduardo Cabrita pediu demissão ao primeiro-ministro. Costa já aceitou exoneração

O ministro da Administração Interna fez uma declaração a partir do ministério. Eduardo Cabrita despediu-se com um balanço positivo do seu mandato, iniciado no final de 2017.

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Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna, anunciou que apresentou a sua demissão ao primeiro-ministro LUSA/ANTÓNIO PEDRO SANTOS

O ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, anunciou a sua demissão. Depois de meses de polémicas acumuladas, o governante informou ao final da tarde desta sexta-feira que entregou a sua carta de demissão ao primeiro-ministro para não prejudicar o Governo. Minutos depois de terminar a sua declaração, António Costa confirmou que aceitou o pedido de demissão do governante.

A declaração de Cabrita – sem direito a perguntas – surgiu horas depois de o Observador ter avançado que a 18 de Junho o carro do ministro circulava a 163km/h, tendo o Ministério Público deduzido acusação contra o motorista de Cabrita, agora acusado de homicídio por negligência. “Mais do que ninguém lamento essa trágica perda irreparável e a minha solidariedade vai para família da vítima. Desde então, foi com grande sacrifício pessoal que verifiquei com estupefacção o aproveitamento político que foi feito de uma tragédia pessoal”, disse Eduardo Cabrita, antes de confirmar a sua demissão.

Sobre o silêncio em relação ao caso o ministro defendeu-se: “Qualquer que fosse a resposta era lida como uma interferência, quanto ao ritmo do processo, quanto à sua substância.” E prosseguiu para dizer que uma das razões que o fizeram continuar a tutelar a pasta do Ministério da Administração Interna foi a situação pandémica que o país atravessou nos últimos meses. “Só a lealdade, o tempo e as circunstâncias que enfrentávamos há seis meses e a solidariedade do primeiro-ministro” o fizeram continuar na pasta, garantiu.

Agora, a cerca de um mês da campanha eleitoral para as eleições legislativas antecipadas, o ministro decidiu afastar-se para não contaminar a acção do executivo socialista. “Não posso permitir que este aproveitamento político absolutamente intolerável seja utilizado no actual quadro para penalizar a acção do Governo contra o senhor primeiro-ministro ou mesmo contra o PS. E por isso entendi solicitar hoje a exoneração das minhas funções de ministro da Administração Interna”, justificou.

O início da sua declaração arrancou com um balanço do seu mandato no ministério, que herdou em Outubro de 2017, em resultado da demissão de Constança Urbano de Sousa, após a tragédia dos incêndios florestais de 2017, e realçando a “sequência de quatro anos positivos” com “o menor número de incêndios da última década”, nos quais “só profissionais perderam a sua vida, nenhum civil”.

Depois, o ministro prosseguiu para sublinhar os bons resultados dos indicadores de criminalidade geral, violenta e grave. “Aos milhares de homens e mulheres que servem Portugal na protecção civil devemos imenso”, continuou. O ministro falou até da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, não esquecendo o papel de coordenação do Ministério da Administração Interna durante “estes dois anos tão difíceis” no combate à covid-19, elogiando também o trabalho da sua equipa, parte da qual presente na sala. A secretária de Estado da Administração Interna, Patrícia Gaspar, foi uma das figuras que acompanharam a declaração do ministro.

Durante a manhã, Eduardo Cabrita afirmou que era “só um passageiro” do carro envolvido no atropelamento na A6, que resultou na morte de um trabalhador de limpeza de estradas, e defendeu que a dedução da acusação ao motorista conhecida esta sexta-feira corresponde ao “Estado de direito a funcionar”. “Sou só um passageiro, é o Estado de direito a funcionar, temos de confiar, ninguém está acima da lei”, afirmou o governante.

“Ciclo que termina”

Poucos minutos depois do anúncio feito por Cabrita, António Costa revelou ter já aceitado o “pedido de exoneração” feito pelo seu ministro e adiantou ainda ter também comunicado ao Presidente da República que “oportunamente” será designado um substituto. “Irei indicar ao senhor Presidente da República, nos próximos dias, uma personalidade que possa exercer [as funções de ministro da Administração Interna neste período em que o Governo continua em funções].

O primeiro-ministro sinalizou que com esta saída há um “ciclo que termina”, altura que Costa quis aproveitar para “agradecer estes seis anos de colaboração” de Cabrita, primeiro como ministro adjunto e depois na Administração Interna. 

“Quero enfatizar os resultados e os ganhos em termos de segurança que o país teve ao longo dos últimos quatro anos. Fruto do trabalho das forças de segurança na redução dos índices de criminalidade e também graças ao esforço de todos os cidadãos e da protecção civil [que possibilitaram reduzir tanto o número de incêndios como de área ardida], continuou Costa.

Quando ao momento escolhido para o pedido de demissão, António Costa precisou que “seguramente aquilo que determinou” a decisão foi o facto de Cabrita ter “aguardado, ao longo destes meses, o tempo da Justiça”. “Tendo havido hoje a conclusão de uma fase importante”, disse Costa, aludindo à dedução da acusação contra o motorista do ministro, Cabrita entendeu “que devia cessar as suas funções”. O também líder do PS sublinhou que Eduardo Cabrita “respeitou o tempo da Justiça” e garantiu “compreender bem as [suas] razões”.

Questionado sobre se será este o fim da carreira política do agora ex-ministro, o primeiro-ministro sustentou que “a política não é uma carreira, é um compromisso cívico”, e defendeu que “há várias formas de participar na vida política”.

Costa aproveitou ainda para apontar o dedo a “muita gente que especulou politicamente” em torno deste caso, ao passo que “o Governo fez o que lhe competia, respeitar as instituições”. “Vi e ouvi em silêncio acusações sobre falta de idoneidade da GNR, porventura até do Ministério Público, e espero que todos aqueles que fizeram essas insinuações tenham consciência de que apontaram o dedo erradamente”, atirou.

Além de reiterar a confiança nas “autoridades”, António Costa concluiu dizendo que “a Justiça agora seguirá o seu caminho”.

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