“Brexit”: Estados membros da UE aprovam aplicação provisória do acordo com o Reino Unido

Embaixadores dos 27 dão luz verde à entrada em vigor temporária do acordo, antes de o Parlamento Europeu o analisar e ratificar. Governo britânico assume que os primeiros dias do ano serão “conturbados”.

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Boris Johnson, primeiro-ministro do Reino Unido Reuters/POOL

Alcançado um acordo para uma nova parceria política e económica mesmo em cima da linha de meta, mais precisamente na véspera de Natal, Reino Unido e União Europeia estão a aproveitar os poucos dias que restam até ao final do ano para garantirem que a transição pós-“Brexit” ocorre da forma menos disruptiva possível e que os seus diferentes poderes e instituições políticas dão o seu aval às disposições acordadas e explanadas ao longo das 1246 páginas do novo tratado.

O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, falaram esta segunda-feira ao telefone, e realçaram a importância do acordo para a nova fase das relações e da cooperação entre os dois blocos.

Do lado da UE, a grande preocupação está relacionada com a falta de tempo para os membros do Parlamento Europeu e as comissões responsáveis lerem, analisarem, discutirem e votarem o acordo. Esse trabalho será realizado logo que recomecem os trabalhos parlamentares, em Janeiro, com a obrigatória ratificação a acontecer de forma retroactiva.

A solução para evitar o no-deal passou por recorrer à figura jurídica da vigência provisória, que está prevista no direito comunitário. Esta segunda-feira, os representantes permanentes dos 27 Estados membros reuniram em Bruxelas e aprovaram, por unanimidade, a “aplicação provisória” do acordo a partir de 1 de Janeiro de 2021.

Essa aprovação deverá ser formalizada, por escrito, até ao início da tarde de terça-feira – há países, como a Suécia, que têm de consultar os respectivos Parlamentos nacionais –, para que o Conselho da UE autorize a implementação do acordo.

Os eurodeputados terão então tempo para escrutinar convenientemente o tratado nas primeiras semanas de 2021 e agendar a votação e ratificação do mesmo para Março.

“No espírito de união que prevaleceu durante o processo negocial e tendo em conta circunstâncias particulares, únicas e específicas, a conferência dos presidentes aceita a aplicação provisória [do acordo] para mitigar a disrupção para cidadãos e empresas e prevenir o caos de um cenário de no-deal”, refere uma nota divulgada pelo Parlamento Europeu, após uma reunião entre os líderes parlamentares, o presidente David Sassoli, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o representante da UE nas negociações, Michel Barnier.

Preparem-se, alerta Londres

Do lado britânico, as preocupações são essencialmente de carácter logístico – o Parlamento britânico vai discutir e votar o acordo na quarta-feira mas, dada a maioria confortável do Partido Conservador na Câmara dos Comuns, a aprovação está praticamente garantida.

Tal como já o tinha feito, há uns meses, num alerta dirigido aos representantes do sector logístico e das empresas de transporte do Reino Unido, o ministro Michael Gove – responsável pela implementação do acordo de saída – assumiu esta segunda-feira que estão previstos “momentos conturbados” no início do ano, por causa do “pouco tempo” de adaptação das empresas às novas regras.

“Tenho a certeza de que irá haver momentos conturbados, mas estamos aqui para fazer tudo o que pudermos para suavizar o caminho”, afirmou Gove numa entrevista à BBC, sublinhando a urgência de os agentes económicos se prepararem convenientemente para a viragem do ano.

“A natureza da nossa nova relação com a UE – fora do mercado único e da união aduaneira – significa que há mudanças práticas e processuais para as quais as empresas e os cidadãos necessitam de se preparar. Sabemos que irá haver alguma disrupção à medida que nos ajustamos a novas maneiras de fazer negócio com a UE, portanto é vital que tomemos as medidas necessárias agora”, acrescentou.

Londres sabe que as diferentes regras que passarão a aplicar-se ao comércio com os países da UE e a entrada em vigor do regime regulatório e aduaneiro híbrido da Irlanda do Norte contribuirão para atrasos e disrupções nas fronteiras.

Numa carta enviada às transportadoras, em Setembro, o Governo britânico tinha avisado que a falta de preparação para as novas formalidades poderia implicar filas de cerca de sete mil camiões no condado inglês de Kent e atrasos até dois dias para a entrada de produtos em território europeu, por ferry ou via Eurotúnel.

Temendo cenário idêntico, os governos autónomos da Escócia e do País de Gales anunciaram o reforço das áreas de estacionamento de camiões e medidas para minimizar os previsíveis engarrafamentos junto aos portos de Cairnryan (escocês) e de Holyhead (galês).

Gove também deixou avisos aos viajantes que se encontrarem na UE no início do ano, instando-os a contratarem seguros de viagem abrangentes, a verificarem as tarifas de roaming e a assegurarem-se de que têm um passaporte válido por pelo menos seis meses.

Com João Ruela Ribeiro

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