Costa quer renovar “geringonça”. Se acontecer, “excelente”, mas pode ser de outra forma

O PS vai falar com todos à esquerda que elegeram, BE, PCP, PEV e Livre e mais o PAN. Costa diz que portugueses “gostaram da geringonça”, mas que houve um reforço do PS e espera mudanças no PCP.

António Costa: "Os portugueses gostaram da geringonça" Público

O apito inicial para as negociações entre o PS e os outros partidos à esquerda foi dado por António Costa nesta noite eleitoral e começam já agora as conversas com o PCP, BE, PEV, mas também com o Livre e com o PAN. Para estas conversas, defende António Costa, o PS parte numa posição de reforço face a 2015, como tinha pedido ao eleitorado: “Os portugueses gostaram da geringonça - é verdade, gostaram mesmo - e desejam a continuidade da actual solução política, agora com um PS mais forte”.

Os socialistas têm agora mais possibilidades de diálogo e mais deputados no Parlamento, o que o faz dizer que vai tentar renovar os acordos e o que procura é uma solução de estabilidade para quatro anos de legislatura, como primeiro plano. Isto, apesar de bater de frente com o que o PCP disse. “Se for possível dessa forma, excelente, se não for possível haveremos de encontrar caminho para assegurar estabilidade”, declarou Costa no discurso que encerrou a noite eleitoral, recusando sempre responder se vai procurar uma solução orçamento a orçamento. Este caminho poderá passar por um segundo cenário, que levaria o PS a procurar entendimentos pontuais, como fez António Guterres. Menos “estável”, como prometeu, mas não impossível, dadas as várias geometrias variáveis que tem à frente. 

O PS ganhou 15 dos 20 círculos eleitorais, com mais deputados (no território nacional e ilhas tem 106), podendo chegar aos 108 (ou 109) caso tenha um bom resultado nos círculos da Europa e Fora da Europa, e vai ter cinco partidos e não três para negociar no Parlamento. Contudo, a avaliar pelos números, precisará de um conjunto de mais oito (ou sete) deputados para conseguir maioria, o que significa que as possibilidades são: ou todos os partidos, BE e PCP sozinhos ou um conjunto do PAN e Livre a que teria de se juntar o PEV. Ou, na prática, a abstenção destes, uma vez que tem mais deputados que a direita toda junta.

Para início de conversa, Costa vai deixando avisos. Ouviu Jerónimo de Sousa e Catarina Martins e respondeu que se a ele, “não tendo maioria”, lhe cabe abrir a porta “para procurar soluções para quatro anos”, essa é uma “responsabilidade partilhada” e a responsabilidade dos outros “é de não fecharem a porta”. Mais uns do que outros, virando-se para PCP e BE: “Os que fixaram como objectivo impedir uma maioria absoluta do PS têm agora responsabilidades acrescidas para uma solução de estabilidade”. E mais, se os outros partidos já delinearam as suas linhas, o PS, que ganhou, “também tem caderno de encargos”.

Francisco Romão Pereira
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Francisco Romão Pereira

Nesta fase do jogo, Costa insiste que a sua cartada é a de procurar “renovar esta solução”, porque foi isso que leu dos resultados eleitorais e vira-se para o PCP, que foi o desbloqueador de há quatro anos, dizendo que os resultados não são aqueles da “interpretação” do PCP. “Manifestamente, não foi essa a leitura que os portugueses fizeram, não disseram que era uma solução para não repetir”. Os “portugueses votaram pela continuidade”, disse. Contudo, “não depende só de nós, depende de todos”. Queiram os outros partidos ou não queiram, o PS tem como objectivo encontrar quem lhe dê garantias para a legislatura. “Vamos ver se é possível, PCP diz que o quadro é diferente, vamos ver se é assim ou se pode evoluir; o BE disse que podia ser assim ou de forma diferente. É essencial para a credibilidade do país”, insistiu.

Se não for, parece ponderar ir governando à vista ou “dia-a-dia”. “Se não houver vontade dos outros parceiros na continuidade desta solução, terei de respeitar essa decisão e prosseguir com um Governo do PS, que trabalhará dia-a-dia para manter estabilidade durante quatro anos, disse, contando que BE e PCP nunca se juntem à direita para formarem uma maioria em dossiers que poderiam dificultar a vida ao Governo, precisa apenas que se abstenham. Costa sabe que os dois partidos fogem de uma responsabilização como foi a do PEC4, que fez cair o Governo de José Sócrates, e essa é uma vantagem nas negociações. E uma vantagem também face ao modo como governou António Guterres. 

O programa em cima da mesa será o do PS, avisou, deixando a nota aos parceiros que há metas que vai querer cumprir, nomeadamente no que mais os divide: Europa e metas financeiras. Falando do que se diz lá fora sobre os resultados de Portugal, repete, “não podemos desperdiçar esta vantagem”. A vantagem chama-se credibilidade e estabilidade e é por ela que lutará.

Se não houver uma solução para quatro anos, não recusou se iria falar com os sociais-democratas, contornando o assunto. Costa não fechou a porta, mesmo que não se tenha percebido a quê e mesmo que a sala tenha desatado num apupo aquando da pergunta. Disse o socialista: “Se não houver vontade [dos parceiros], terei de prosseguir com um Governo do PS para manter estabilidade quatro anos”. De fora, definitivamente estará o partido de André Ventura: “Não contamos com o Chega para nada”. O partido, que assistia à conferência de imprensa, reagiu: “25 de Abril sempre, fascismo nunca mais”.

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