Mais de metade das vagas de ginecologia e obstetrícia ficaram por preencher

Apesar da falta de médicos especialistas nas maternidades portuguesas, concurso só conseguiu preencher 14 dos 31 postos de trabalho. No total havia 1264 vagas por preencher, nas várias especialidades, e 28% não foram ocupadas.

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PAULO PIMENTA/ Arquivo

Mais de metade das 31 vagas abertas em Maio para especialistas de ginecologia e obstetrícia ficaram por preencher, num Verão em que as urgências de obstetrícia de Lisboa estiveram para fechar de forma rotativa por falta de especialistas, um problema registado um pouco por todo o país. Dos 31 postos de trabalho disponíveis, apenas 14 (45%) foram ocupados, segundo os dados do concurso de primeira época deste ano para médicos recém-especialistas.

No total, havia 1264 vagas nas várias especialidades, e 355 não foram ocupadas (28%). Os dados indicam ainda que apenas nas especialidades de genética médica (duas vagas), cirurgia pediátrica (duas), cirurgia maxilofacial (duas), cirurgia cardíaca (três) e cardiologia pediátrica (duas) foram preenchidas a totalidade das vagas abertas.

O Verão nas urgências de obstetrícia

No final de Junho, o PÚBLICO revelou que a partir da última semana de Julho e até ao final de Setembro, as urgências de obstetrícia de quatro dos maiores hospitais da Grande Lisboa – Maternidade Alfredo da Costa, Hospital de Santa Maria, São Francisco de Xavier, Amadora-Sintra e Hospital Garcia de Orta –​ iriam estar fechadas num esquema de rotatividade por falta de médicos especialistas. A decisão acabou por não ser tomada

Depois de a ministra da Saúde ter garantido na Comissão Parlamentar, a meio de Julho, que não seria por falta de recursos humanos que as escalas das maternidades do país não seriam garantidas, a ARSLVT acabou por fazer um balanço positivo em relação ao atendimento às grávidas que no mês de Julho recorreram às urgências de ginecologia e obstetrícia da capital.

Contudo, no início de Agosto a Ordem dos Médicos avisou que as maternidades portuguesas estavam a ultrapassar a situação limite, com profissionais a fazerem um “esforço sobre-humano” e a cumprirem num mês mais de 100 horas de serviço de urgência além do habitual.

O presidente da secção regional Sul da Ordem, Alexandre Valentim Lourenço, admitiu na altura, em entrevista à agência Lusa, que as equipas estavam esgotadas, que havia médicos a desistirem do sistema e queixou-se da ausência de medidas da tutela para resolver os problemas identificados pelos profissionais, sobretudo em relação ao período do verão, depois de em final de Junho terem sido apresentadas propostas pela Ordem. Depois da entrevista à Lusa, no mesmo dia, a ARS de Lisboa veio reconhecer “constrangimentos pontuais” nas maternidades, mas sublinhou que “o esforço suplementar dos profissionais” permitiu criar condições para preencher as escalas de serviço nos meses de verão.

À falta de profissionais veio juntar-se um acréscimo de trabalho. No Hospital de Santa Maria, em Lisboa, por exemplo, as urgências de obstetrícia funcionavam há seis anos com equipas completas e tinham 12 mil episódios num ano. No ano passado, o fluxo de urgências foi de 18 mil episódios, enquanto se assistiu a uma diminuição do número de médicos. 

Na primeira semana de Agosto, o Correio da Manhã noticiou a morte de um bebé de uma mulher grávida, com 32 semanas de gestação, que teve de ser transferida de Faro para o Hospital Amadora-Sintra, em Lisboa, por insuficiência de recursos no Algarve, nomeadamente falta de incubadoras, segundo o jornal.

Também no início de Agosto, a urgência de obstetrícia no Hospital José Joaquim Fernandes, em Beja, fechou durante a madrugada devido à falta de médicos para preencher as escalas das urgências – uma situação que já se arrasta pelo menos desde o início de 2018

Já na última sexta-feira, os médicos denunciaram escalas abaixo dos mínimos nas maternidades de Coimbra e ameaçaram com o encerramento em duas épocas distintas: durante a noite de segunda-feira e durante o dia de sábado. Na segunda-feira, soube-se que a maternidade não iria fechar porque uma médica obstetra disponibilizou-se para substituir uma colega que se encontra de baixa, evitando o encerramento. O secretariado regional do Centro do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) exigiu que o Governo resolva com a “máxima urgência” a falta de obstetras naquelas maternidades. 

Só cinco especialidades esgotaram vagas

Segundo os dados oficiais a que a Lusa teve acesso, no concurso de primeira época de 2019 para médicos recém-especialistas das 1264 vagas existentes foram preenchidas um total de 909 (72%), 305 dos quais para medicina geral e familiar (das 398 abertas) e as restantes 604 para especialidades como medicina interna (111), cirurgia geral (54), psiquiatria (49), pediatria (37), anestesiologia (36), ortopedia (30), cardiologia (23), pneumologia (21), ginecologia/obstetrícia (14), oftalmologia (14), oncologia médica (14) e radiologia (14), entre outras.

De acordo com os dados da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), foram escolhidas pelos candidatos dez das 13 vagas abertas para saúde pública, 11 das 18 vagas abertas para medicina física e reabilitação, dez das 14 para patologia clínica, dez das 15 abertas para nefrologia, dez das 13 abertas para imuno-hemoterapia e a mesma proporção para hematologia clínica.

Em todo o ano passado, das vagas identificadas (1674) foram preenchidas 66% (1100), no ano anterior tinham sido identificados 930 postos de trabalho e foram escolhidos 65% (607) e em 2016 tinham sido identificadas 1531 postos de trabalho e foram preenchidos 945 (62%).

O concurso desenvolvido na 1.ª época deste ano autorizava 1264 postos de trabalho, dos quais 398 para médicos de família. Para os hospitais estavam previstas 853 vagas, destacando-se especialidades como a medicina interna (159 vagas), anestesiologia (59), pediatria (51), psiquiatria (56), cardiologia (35), cirurgia geral (63) ou ortopedia (37).

O concurso contemplava ainda 135 postos de trabalho com perfil específico, um mecanismo que responde às necessidades de diversas instituições.

“A ocupação destas vagas implica a posse de condições técnico-profissionais específicas, adquiridas no contexto do internato médico, e que respondem a necessidades expressas das unidades hospitalares”, explicou em comunicado o Ministério da Saúde, aquando da publicação do concurso em Diário da República, em Maio passado.

De todos os postos de trabalho para medicina geral e familiar abrangidos por este concurso, a Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa e Vale do Tejo era a que tinha o maior número de vagas atribuídas (209), seguida pela ARS Norte (61), ARS Centro (54), ARS Alentejo (42) e ARS Algarve (32).

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