Ministra da Saúde “não dormirá tranquila” enquanto ala pediátrica do S. João não estiver resolvida

Governante justifica que “não é possível lançar uma obra sem ter o projecto concluído”.

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LUSA/ANDRÉ KOSTERS

A ministra da Saúde garantiu nesta terça-feira que “não dormirá tranquila” enquanto o problema da ala pediátrica do hospital de São João, no Porto, não estiver resolvido. Durante a discussão do orçamento da Saúde para 2019, Marta Temido não se comprometeu com uma data para o lançamento do concurso nem de conclusão da obra e disse que não haverá um ajuste directo para a construção.

Esta é a primeira vez que a nova ministra da Saúde fala no Parlamento. O deputado do PSD Ricardo Baptista Leite lançou o debate do orçamento para a Saúde com a falta de condições na estrutura actual do hospital em que são tratadas crianças com doença oncológica. A construção do centro pediátrico vem referenciada na nota explicativa do orçamento para 2019, mas sem referir valores de investimento em concreto.

“A sensação é que durante 2018 não se fez nada. O primeiro-ministro dizia que era agora, em 2019, que situação se resolvia e a ministra da Saúde veio dizer que não se comprometia com datas concretas. Hoje, três semanas depois de termos discutido uma proposta concreta do PSD para resolver assunto, um deputado do PS disse que iam fazer um ajuste directo. Agora não vemos compromisso nem com data nem com ajuste directo. Confirma que será um ajuste directo? Quando começa e termina obra?”, perguntou Baptista Leite.

Em resposta, Marta Temido assegurou que o tema é importante para o Governo. “A ministra da Saúde não dormirá tranquila enquanto este problema, e outros, não estiver resolvido”, garantiu Marta Temido, dizendo que “não é possível lançar uma obra sem ter o projecto concluído”.

A ministra adiantou que o conselho de administração está a reformular o projecto inicial da obra. “Queremos uma solução rápida, mas não queremos uma solução que seja pior emenda que o soneto. Quando tivermos o projecto iremos procurar solução para lançar o procedimento. Não falo de ajuste directo. Não estou a atrasar, estou a falar verdade. O ministério pretende construir a melhor solução possível.”

BE apresenta alteração ao Orçamento

O deputado do BE Moisés Ferreira anunciou que o partido vai apresentar uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado de forma a que quando este entrar em vigor, no início de 2019, o conselho de administração do Hospital de São João fique logo autorizado a iniciar o processo de construção da nova ala pediátrica, podendo usar logo as verbas já transferidas para o efeito. O mesmo é feito em relação ao Centro Hospitalar de Gaia e Espinho em relação às obras já previstas.

Marta Temido reforçou que “o Governo irá colocar todo o seu empenho para a resolução de uma ala pediátrica”. “Será feito independentemente do texto final. O que me interessa e à minha equipa é fazer as coisas”, disse.

Isabel Galriça Neto, do CDS, voltou a insistir para que a ministra se comprometesse com uma data de início das obras. “Não vou poder responder quando vão começar as obras porque não quero dizer uma data que possa não ser possível”, afirmou Marta Temido, referindo que espera ter o projecto nas mãos no final de Janeiro e que irão trabalhar numa solução ágil para que o processo de concurso, a lançar posteriormente, seja o mais rápido possível.

Lei de bases até ao final do ano

PSD e BE também questionaram a ministra sobre a Lei de Bases da Saúde. O anterior ministro Adalberto Campos Fernandes criou um grupo de trabalho, coordenado pela anterior ministra da Saúde Maria de Belém, que já resultou numa proposta que esteve em consulta pública. Durante este ano, o anterior titular da pasta da Saúde disse que este documento serviria de base à proposta do Governo. Mas não chegou a ir a discussão em Conselho de Ministros.

Agora Marta Temido explicou que estão a trabalhar no documento. “Pretendemos que os documentos possam ser todos tornados públicos para o enriquecimento do debate. Mas esta equipa entende que, pela importância do tema, deve ter o seu próprio documento final”, disse, salientando que querem ter um documento melhor em relação à lei actual.

“Os documentos que já são públicos têm enormes virtualidades, sublinham a necessidade da humanização e respeito pelos direitos dos doentes. Parece um enorme avanço, mas não podemos perder esta oportunidade de fazer desta lei de bases um documento que sirva pelo menos tão bem como a actual lei serviu durante décadas. Finda a discussão do orçamento, queremos que este tema possa ter a centralidade devida e ser discutido antes final do ano”, anunciou Marta Temido.

Isenção de taxas moderadoras

O BE apresentou uma outra proposta de alteração ao Orçamento do Estado propondo a isenção do pagamento das taxas moderadoras aos doentes crónicos. Actualmente, os doentes crónicos, como diabéticos ou infectados com VIH, estão dispensados do pagamento das taxas moderadoras de consultas e tratamentos relacionados com a sua doença. Moisés Ferreira defendeu que esta medida iria melhor o acesso aos cuidados de saúde.

Também o PCP reforçou que as taxas moderadoras não têm servido de moderação, mas têm sim pesado sobre as finanças dos doentes.

Em resposta Marta Temido admitiu que a isenção das taxas moderadoras aos doentes crónicos pode ser uma matéria a discutir. A responsável disse entender que as taxas devem manter “a sua estrita função de moderar o uso indevido de cuidados”, lembrando que o valor das taxas moderadoras já foi revisto em baixa por este Governo.

Outra das propostas do BE para o Orçamento na área da saúde passa por estabelecer que todas as instituições de saúde fiquem "livres de cativações", dando o exemplo da Entidade Reguladora da Saúde que "teve efectivamente cativações" nos últimos anos.

Confortável com o orçamento

Isabel Galriça Neto disse estar preocupada com o facto de a nova ministra estar a apresentar um orçamento para a Saúde que não foi trabalhado por si. Marta Temido garantiu que estava “confortável” com essa situação. “Estou confortável com orçamento e com o programa do Governo que será o norte desta actuação. Os orçamentos nunca são tão longos quanto desejaríamos em relação às necessidades. Cabe-nos fazer o melhor e o mais possível com os recursos que os cidadãos colocam à nossa disposição. Tenho a certeza que este orçamento é mais confortável do que o que teve o anterior titular [da pasta da Saúde].”

Questionada sobre os vários investimentos hospitalares que a nota explicativa do orçamento para 2019 enumera e sobre os que não estão lá referidos, caso do Algarve e de Barcelos – questão salientada por Ricardo Baptista Leite – a ministra afirmou que sobre os novos hospitais (Évora, Lisboa Oriental, Sintra, Seixal e Madeira) “não basta publicar despachos ou alocar verbas para que as coisas aconteçam”.

“Construir um hospital leva muitos anos, há estudos técnicos e concursos que são precisos cumprir. [Em] Évora, o projecto está disponível. Sintra tem já adjudicação o projecto visado pelo Tribunal de Contas e uma previsão de abertura em 2021. Seixal está ligeiramente atrasado. Acabámos de receber as propostas de projecto. O hospital de Barcelos teve um protoloco assinado em 2007 que determinou um estudo para o novo hospital. Até 2010 o trabalho evoluiu, mas depois houve uma quebra. Só voltou a ser falado em 2017”, exemplificou.

Aumento de transferências

Na apresentação do que é o orçamento para este ano, Marta Temido destacou que contém um reforço de verbas para a saúde. “Em comparação com o orçamento de 2018 beneficiará de aumento de transferências de 600 milhões de euros. Há um crescimento dos encargos com bens e serviços e com recursos humanos. Há um aumento de 23 milhões de euros para investimento”, afirmou. A nota explicativa do orçamento, que foi corrigida na véspera desta audição por ter várias incorrecções em relação a números, dá conta de um total de 160 milhões de euros para investimentos. 

Marta Temido salientou ainda que o défice previsto do Serviço Nacional de Saúde (SNS) orçamentado para 2019 “representa uma melhoria de 147,7 milhões de euros face ao estimado para 2018, fruto das transferências do Orçamento do Estado e também do esforço dos profissionais”. Na nota explicativa, o ministério orçamenta um défice para o SNS de 90 milhões de euros e projecta que este ano o saldo do Serviço Nacional de Saúde seja de menos 238 milhões de euros.

A ministra lembrou ainda a injecção de 500 milhões de euros, que começou a ser paga este mês, para os hospitais pagarem dívidas em atraso. Marta Temido salientou que este orçamento cumpre a promessa do Governo de dar prioridade às pessoas, com investimento nos hospitais, nos cuidados de saúde primários com a criação de novas unidades de saúde familiares e a contratação de mais médicos de família. Marta Temido estima que no final do ano 94% da população tenha médico de família. Mas assumiu que ainda é preciso reforçar os serviços de saúde com mais recursos humanos, quer nos centros de saúde quer nos hospitais e nas várias profissões.

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