Universidades-fundação: um modelo que ficou incompleto e continua a causar polémica

O envelope financeiro prometido às instituições nunca chegou. Contratação ao abrigo do direito privado continua a ser motivo de disputa com sindicatos.

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O reitor da Universidade do Porto, Sebastião Feyo de Azevedo, não está com meias palavras: “O regime foi um grande flop.” Fernando Veludo

Numa coisa os reitores, que têm sido os principais defensores das fundações no ensino superior, e os críticos estão de acordo: o modelo nunca chegou a ser posto em prática como prometido. Faltou o reforço do financiamento que o Governo devia ter canalizado para as instituições, mas também outras medidas que permitiriam às universidades contornar as regras do Estado.

O reitor da Universidade do Porto (UP), Sebastião Feyo de Azevedo, não está com meias palavras: “O regime foi um grande flop.” O Governo de então — com Mariano Gago como ministro da Ciência e Ensino Superior e Teixeira dos Santos como Ministro das Finanças — assinou “muito pomposamente” um acordo com as três instituições que inauguraram o modelo. Só que este “nunca foi cumprido”, conta.

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“Boa parte das expectativas foi gorada”, concorda Isabel Menezes, que fez parte do conselho geral daquela universidade nos últimos quatro anos e é uma opositora do regime fundacional. “Quando o contrato foi negociado, foi com um pressuposto de verbas que nunca vieram”, contextualiza esta professora da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação do Porto.

A UP foi uma das três universidades que inauguraram o estatuto fundacional, em 2009. O acordo assinado com o Governo incluía um contrato-programa e um plano de desenvolvimento estratégico. Em troca de uma maior responsabilização das instituições, o Estado comprometia-se a reforçar as suas transferências financeiras. Mas o dinheiro nunca chegou. Em 2013, eram já 152 milhões de euros prometidos às universidades que nunca foram transferidos.

Pouco depois da assinatura dos acordos, o país entrou em crise. No consulado da troika, foram impostas outras limitações financeiras e burocráticas que retiraram ainda mais prerrogativas que o modelo pressupunha, como a exclusão das universidades do perímetro orçamental do Estado e das regras da contratação pública para aquisições de serviços ou a possibilidade de criação de fundos. Ainda assim, a avaliação do modelo fundacional “é positiva”, considera Manuel Assunção, reitor da Universidade de Aveiro, outra das três primeiras universidades a avançar para o modelo. Além da UP, também o ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa esteve no grupo das pioneiras.

“Das três primeiras universidades-fundação, nenhuma mostrou intenção de abandonar o modelo, o que era possível ao fim de cinco anos. E assim que foi possível, houve mais duas [Universidade do Minho e Universidade Nova de Lisboa] a adoptá-lo”, justifica Assunção.

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Para o reitor da Universidade de Aveiro, apesar das limitações do ponto de vista financeiro que foram sendo colocadas ao modelo fundacional, sobraram “duas grandes vantagens”. A primeira é a possibilidade de as universidades-fundação poderem fazer aquisições ou alienações de património sem terem de pedir autorização ao Governo. O controlo é agora feito pelo conselho de curadores da instituição. A outra é a “flexibilidade” na contratação de pessoal. “Não sou capaz de atrair um professor de renome oferecendo um ordenado de professor auxiliar”, ilustra o reitor do ISCTE, Luís Reto, elogiando os méritos do regime.

Só que a flexibilidade na contratação é também um dos pontos centrais das críticas às universidades-fundação, em particular dos sindicatos. Em cinco anos, o número de docentes com contrato a tempo parcial aumentou 15%. Estes professores representam já quase um terço do total nas universidades. “Esse crescimento é particularmente evidente nas universidades que são fundação”, acusa o presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (Snesup), Gonçalo Velho.

O Snesup fez também uma análise dos balanços sociais comparando a situação de universidades que têm estatuto fundacional e as que mantêm o regime de instituto público, concluindo haver “um aumento das desigualdades salariais dentro das instituições”. “Intensificaram-se problemas de falta de democracia, representatividade, disparidade salarial (a favor de dirigentes) e precariedade”, aponta Velho.

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