Desconfiados do seu Governo, romenos mantêm protesto pela democracia

Executivo tentará manter algumas provisões da lei que descriminaliza abuso de poder e anula algumas penas de prisão.

As manifestações são as maiores desde a queda do comunismo em 1989
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Os manifestantes na Roménia prometem não desistir enquanto o Governo mantiver ideia de aprovar parte da lei da corrupção Reuters
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As manifestações são as maiores desde a queda do comunismo em 1989 Reuters
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Para os manifestantes trata-se de protestar contra a corrupção e a favor da democracia STOYAN NENOV/Reuters
"Cobardes", diz o cartaz de uma manifestante em Bucareste
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"Cobardes", diz o cartaz de uma manifestante em Bucareste Reuters

Sete dias de protestos consecutivos em noites de temperaturas negativas, que chegaram a ter cerca de 300 mil pessoas na Praça da Vitória, em Bucareste. A dada altura os manifestantes accionam as luzes dos telemóveis e a praça ilumina-se em flashes. Uma menina tem um cartaz que diz: “Estou numa aula de História”. Os romenos mantiveram-se na rua a protestar contra o Governo. Mesmo apesar de este se comprometer a retirar uma polémica lei que descriminalizava abusos de poder cujos prejuízos financeiros fossem menores do que 44 mil euros.

“Não acreditamos em vocês!”, gritava-se nos protestos. “Não vamos desistir.” Manifestantes e analistas concordavam que há uma grande hipótese de o Governo tentar manter uma parte da lei, que para além da descriminalização do abuso de poder ainda previa um perdão para penas inferiores a cinco anos.

A rejeição da lei terá de ser levada a plenário para ser votada. “Não acredito que o Parlamento rejeite a anulação da lei”, comentou o professor de ciência política Sergiu Miscoiu, da Universidade Babes-Bolyai, à Reuters. “Mas [o Governo] pode tentar pôr algumas das medidas contestadas num projecto de lei na alteração ao código penal.” O comentador Christian Patrasconiu resumia o sentimento geral: “Tudo parece suspeito.”

Duas provisões da lei parecem feitas à medida de uma pessoa: Liviu Dragnea,  o líder do partido Social-Democrata.

Dragnea foi condenado a uma pena suspensa de dois anos por fraude eleitoral, e só por isso não pôde ser primeiro-ministro: após ter vencido as eleições de Dezembro de 2015, o partido escolheu um seu protegido, Sorin Grindeanu, para a chefia do Executivo. Dragnea está ainda a ser julgado por suspeitas de ter pago a funcionários do partido pelos cofres do Estado – em que lesou o erário público em 24 mil euros, menos do que o limite da nova lei.

O líder do partido tem sido uma das vozes dos sociais-democratas mais presentes durante este período de protestos: foi ele (e não o primeiro-ministro) quem primeiro pôs hipótese de um recuo do Governo no sábado. Foi também ele que garantiu esta segunda-feira que o Governo – acabado de vencer as eleições em Dezembro de 2016 – não tinha qualquer razão para se demitir.

Os sociais-democratas venceram as eleições com promessas de aumentar o salário mínimo; em Janeiro este passou para 1450 lei (um aumento de cerca de 44 euros para um total de quase 320 euros). Não esperavam despertar tão depressa um movimento de protesto com as maiores manifestações desde a queda do regime comunista em 1989.

Mas para muitos romenos esta última acção do Executivo, que tentou na semana passada aprovar a medida de noite e sem debate ou anúncio público, é uma questão tanto de corrupção como de democracia.

Na parte da corrupção, o país não quer voltar atrás na luta que tem vindo a ser levada a cabo e que tem valido ao país elogios internacionais. Em 2015, o gabinete dedicado a investigar corrupção iniciou 1250 processos incluindo o então primeiro-ministro, cinco ministros, cinco senadores, 16 deputados, e 97 presidentes ou vice-presidentes de câmara, num montante total de cerca de mil milhões de euros de prejuízo para o Estado romeno.

Quanto à democracia, o professor de ciência política Cristian Pirvulescu sublinhou ao diário norte-americano The New York Times que numa região com democracias iliberais como a Hungria ou Polónia, os romenos temem esta atitude do Governo “achar que venceu a eleição e pode fazer o que quiser”. Os manifestantes querem dizer ao Governo que não. “É uma luta em defesa da democracia.”

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