Medidas de austeridade poderão evitar multas por défice excessivo

Portugal está em risco de inaugurar o processo que poderá, em última análise, levar a União Europeia (UE) a aplicar-lhe pesadas multas devido à derrapagem orçamental registada em 2001. Este processo será obrigatoriamente aberto caso se confirme que o défice orçamental atingiu, no ano passado, 3,9 por cento do PIB, tal como foi anunciado na quarta-feira pelo primeiro-ministro, Durão Barroso. Este valor, não definitivo, consta de um relatório confidencial do Banco Central Europeu (BCE).A Comissão Europeia limitou-se por agora a "tomar nota" deste anúncio, sublinhando que só se pronunciará com base nos números oficiais do Governo. "O que conta são os números oficiais que vierem a ser publicados pelo Governo português", afirmou Gerassimos Thomas, porta-voz de Pedro Solbes, comissário europeu responsável pelo euro. A Comissão espera, assim, que o Governo apresente "o mais rapidamente possível" os resultados da auditoria que está a ser feita às contas públicas por uma comissão presidida por Vítor Constâncio, governador do Banco de Portugal, embora isso não deva acontecer antes de Agosto.Se o valor se confirmar, Portugal será o primeiro país da eurolândia a ultrapassar o limite máximo de três por cento do PIB autorizado aos membros do euro. A ser assim, a Comissão Europeia, enquanto guardiã do direito comunitário, tem a obrigação de iniciar o procedimento previsto no Tratado da UE para corrigir eventuais "défices excessivos", frisou Thomas.Este processo tem início com um relatório da Comissão aos ministros das Finanças dos Quinze sobre a situação orçamental do país em causa, devendo estes decidir se estão ou não perante um défice excessivo. Em caso afirmativo, os Quinze dirigirão recomendações ao país em causa, pedindo a correcção da trajectória. Se estas não forem acatadas, os ministros poderão voltar à carga alguns meses depois, com a exigência de medidas concretas para a redução do défice. Se o visado persistir em não reagir, a UE poderá aplicar multas até um valor máximo de 0,5 por cento do PIB, o que daria em Portugal mais de 600 milhões de euros (120 milhões de contos).Gerassimos Thomas desdramatizou o risco das multas ao frisar que a análise do caso português terá já em conta os compromissos assumidos em Fevereiro pelo anterior Governo, no sentido de manter o défice abaixo dos três por cento e de atingir um saldo nulo em 2004. E sublinhou que Bruxelas terá particularmente em conta as medidas de austeridade assumidas pelo actual Governo para reduzir o défice deste ano para 2,8 por cento do PIB, e que poderão neutralizar as eventuais recomendações dos ministros das Finanças."Temos uma indicação clara do Governo português de que a política é consistente com os compromissos (...) de Fevereiro", frisou Thomas, embora salientando que "terá de haver um seguimento apertado das decisões de política".A derrapagem orçamental catapulta Portugal do estatuto de "bom aluno" da classe do euro - conseguido pelo facto de ter sido o primeiro dos países do Sul da UE a conseguir a qualificação para a moeda única - para o pior cábula e o primeiro a receber uma advertência formal. Acima de tudo, a gravidade da deterioração portuguesa põe a nu as deficiências do processo de coordenação das políticas económicas dos Quinze, já que ninguém conseguiu antecipar o desastre que está em risco de se confirmar. A Comissão defende-se lembrando que emitiu o primeiro sinal de alarme sobre os riscos de Portugal ultrapassar os três por cento do PIB em Janeiro, quando propôs enviar um "alerta rápido" a Lisboa. Esta proposta foi, no entanto, rejeitada pelos ministros das Finanças, porque a Alemanha, igualmente visada por uma medida idêntica, exerceu uma forte pressão política sobre os seus parceiros para a evitar.

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