Cantos da Quaresma agora em disco, para “passar um legado às novas gerações”

Recém-lançado em disco, o projecto Cantos da Quaresma, que une as vozes e instrumentos de César Prata e Sara Vidal, percorre agora igrejas e palcos.

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César Prata e Sara Vidal em Cantos da Quarema DR

Começou num trabalho de recolha e acabou num disco, que nesta época pascal percorre igrejas e palcos. O espectáculo-performance Cantos da Quaresma, recém-lançado em CD, já foi apresentado este mês em Belmonte e em Macedo de Cavaleiros (dia 28, na Igreja de São Pedro) e é agora mostrado na Marinha Grande (esta quinta-feira, dia 29, no Teatro Stephens), na Guarda (dia 30, na Igreja Paroquial de Pousade) e em Monchique (dia 31, na Igreja Matriz). Em palco estão César Prata (voz, guitarra, kalimba, sanfona, adufe e outros instrumentos) e Sara Vidal (voz, harpa celta e adufe), os dois rostos deste projecto, ligados a vários outros: César Prata aos Chuchurumel, Assobio e Ai!, entre muitos; e Sara Vidal a O Diabo a Sete, A Presença das Formigas e, em tempos mais recuados, aos galegos Luar na Lubre.

“Isto vem da minha ideia de ir metendo a tradição em caixinhas”, diz César. “Aos poucos fui reunindo coisas. Por exemplo: fiz um disco de cantos de trabalho, reuni romances (não é novidade, muita gente tem feito isso), cantos de Natal da Galiza e de Portugal (em 2017 fizemos um espectáculo) e surgiram, noutra caixinha, estes cantos da Quaresma.” Quando a “caixinha” ficou cheia, César desafiou Sara a trabalhar com ele. “Houve pessoas que viram e acharam interessante levá-lo para palco. Mas, no fundo, isto não é espectáculo, eram cantos comunitários que as pessoas faziam sem espectadores.”

A estreia fez-se no antigo convento de Trancoso, em 13 de Abril de 2017, e na audiência estava Domingos Morais, professor e etnomusicólogo. “Foi ele que nos estimulou a gravarmos o disco”, diz Sara. Não só. Também escreveu, para o disco, um texto de apreciação e incentivo. Reconhecendo “o risco da procura de equilíbrio” num trabalho como este, vê-o como um “processo ainda em curso”, desejando que continue “a reservar às vozes o protagonismo” que mais o impressionou “pela qualidade interpretativa e pelo respeito da prosódia própria de cada tema, nos seus particularismos regionais.”

“Militância cultural”

Editado pela Sons Vadios, o disco é apresentado com as necessárias adaptações. Sara: “No disco nós fazemos uma espécie de cronologia: as encomendações das almas, os martírios e depois as alvíssaras e no final as aleluias, com a ressurreição. Mas como na Guarda vamos apresentá-lo na sexta-feira santa, cantar uma aleluia era um sacrilégio. Portanto, aí vamos ter de adaptar o repertório, apesar de isto não pretender ser um momento religioso.”

César e Sara, que já conheciam os projectos um do outro mas nunca tinham trabalhado juntos, identificam-se na mesma “militância cultural” de, como diz Sara, trabalharem este repertório específico e “nada comercial”, mas que faz parte da identidade cultural comum. “Para que ele vá perdurando e consigamos passar um legado às novas gerações.” E que foi também herdado das gerações anteriores. César cita, como fontes, os trabalhos de Michel Giacometti, Ernesto Veiga de Oliveira, um conjunto de CD editados pela Câmara da Idanha e recolhas pessoais, que ele próprio foi gravando. “Neste repertório há um género que me é especialmente caro, as encomendações das almas. Tenho muitas gravadas, em 2005 e 2007. Destas, algumas ainda se mantêm. Mas as outras desapareceram.”

O disco contribui para a fixação deste repertório. Com uma leitura própria, mas, como escreve Domingos Morais, com “soluções performativas de grande beleza e equilíbrio.”

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