PS apresenta propostas para evitar novos casos como o dos lesados do BES

Trabalhadores de instituições financeiras vão perder os prémios salariais por atingirem objectivos de venda de produtos financeiros. PS quer que cliente escreva pelo próprio punho que aceita correr riscos no investimento. Objectivo é evitar novos lesados.

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Lesados do BES LUSA/Gregório Cunha

Os socialistas vão apresentar esta terça-feira vários projectos de lei e recomendações que têm como principal objectivo travar práticas agressivas de vendas de produtos financeiros com papel comercial e depósitos complexos aos balcões dos bancos. As medidas visam responsabilizar não só as entidades bancárias mas também os clientes particulares.

Os clientes vão ter de escrever, pelo próprio punho, que foram informados e aceitam o risco dos produtos a subscrever. Até agora, uma simples cruz na declaração de que foi prestada informação sobre o risco do produto, seguida da assinatura do cliente, servia para ilibar de responsabilidades a instituição financeira. 

Esta é uma das 22 propostas que os socialistas vão apresentar na conferência sobre a "implementação das recomendações das comissões parlamentares de inquérito à banca". No pacote de medidas, a que o PÚBLICO teve acesso, o PS propõe alguns mecanismos para que os investidores tenham uma maior percepção do risco que correm com determinados produtos financeiros, numa tentativa de evitar novos casos como os lesados do BES ou do Banif.

O PS propõe não só uma melhoria do questionário que cada banco faz para determinar a adequação do perfil do investidor, como obriga a que seja o cliente, no caso de recusa de preenchimento deste questionário, a assumi-lo pelo próprio punho. Estas propostas são um acrescento à transposição da directiva europeia sobre o assunto, que deverá chegar ao Parlamento depois do Verão, mas da qual já se conhecem algumas propostas. A directiva já pede (no ante-projecto de transposição a que o PÚBLICO teve acesso), que os bancos criem um perfil do cliente e que guardem todas as informações sobre as comunicações e contratos feitos com cada um.

Outra das alterações prende-se com a obrigatoriedade de o cliente declarar (novamente escrito pelo próprio punho), que aceita determinado risco, sobretudo, diz a proposta, em situações em que não tenha o perfil adequado à subscrição de um certo produto financeiro. Este é o caso de muitos dos lesados do BES e do Banif, que não era investidores qualificados e que, além disso, garantem que compraram papel comercial e produtos financeiros que lhes eram vendidos como produtos de poupança. 

Na prática, esta proposta tem dois efeitos: avaliar da literacia financeira do investidor tentando dificultar a venda e responsabilizar quem aceita  investir num produto de risco mesmo não tendo perfil para isso. Se a legislação for adiante, será mais difícil a um investidor particular comprar um produto de alto risco e será mais difícil à entidade bancária vendê-lo. Contudo, há um efeito posterior. Se algo correr mal e o investidor sair lesado, será mais difícil ao investidor alegar desconhecimento do risco que correu. Para aumentar essa percepção do risco, o PS propõe ainda, por exemplo, uma coloração dos produtos segundo o seu grau de risco: de verde a vermelho, para que fique evidente que um produto a vermelho é de elevado grau de risco. 

Trabalhadores dos bancos perdem prémio variável por venda de produtos

Os projectos de lei dos socialistas contemplam ainda medidas para os trabalhadores das instituições financeiras. Se as propostas forem aprovadas, um banco deixará de poder conceder crédito a um trabalhador para que este compre títulos de dívida ou de capital do próprio banco ou de uma entidade do mesmo grupo. Este foi um caso que aconteceu no Banif, com vários trabalhadores que estão neste momento com dívidas por terem adquirido títulos de dívida do próprio banco com crédito concedido pelo Banif.

No entanto, a proposta que mais vai afectar os trabalhadores dos bancos será o fim da remuneração variável que está dependente da venda de produtos de risco. Neste momento, alguns trabalhadores têm um prémio variável associado ao salário que depende de alcançarem ou não os objectivos de venda de produtos financeiros a clientes. Se esta proposta for aprovada, deixará de haver mais esse incentivo a uma venda agressiva. O ante-projecto de transposição da directiva europeia, noticiado em Abril, já pretendia "limitar" estes prémios para que os objectivos de venda não fossem "susceptíveis de incentivar as pessoas em causa a privilegiar os seus próprios interesses ou os interesses das instituições de crédito em detrimento dos interesses dos clientes". A intenção é minorar os conflitos de interesses dos próprios trabalhadores. 

Além destas propostas, os socialistas apresentam ainda quatro recomendações ao Governo, que não passam para letra de lei, mas deixam pistas do que querem ver legislado pelo Governo. É sugerida a criação de um mecanismo imediato e directo de ressarcimento dos clientes bancários quando os bancos cobrem comissões bancárias indevidas, mas só nos casos em que essa prática tenha sido sujeita a contra-ordenações pelo regulador. Agora, mesmo que certas comissões sejam consideradas indevidas, os clientes não são ressarcidos das perdas patrimoniais que tenham tido.  

Nas recomendações, o PS pede ainda um modelo de supervisão diferente para as associações mutualistas, como o Montepio, e terminam a pedir ao Governo que faça pressão na Europa para que seja possível um maior "escrutínio", por parte da Assembleia da República, das entidades europeias que decidam sobre matérias envolvendo recursos financeiros nacionais. Esta é uma das propostas que une vários partidos, uma vez que nas diferentes comissões de inquérito, à resolução do BES, à resolução do Banif, mas também à própria gestão da Caixa, as entidades europeias como o BCE nunca deram justificações ao Parlamento português, não explicando decisões que implicaram a injecção de dinheiro público.

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