A mulher sem papas na língua

In Memoriam banaliza-se progressivamente em direcção ao filme inspiracional e à lição de vida. Mas há Shirley MacLaine...

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In Memoriam: uma senhora actriz, Shirley MacLaine
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In Memoriam: uma senhora actriz, Shirley MacLaine

Tínhamos perdido o rasto a Mark Pellington, contemporâneo de David Fincher, Mark Romanek e Michel Gondry numa geração oriunda da publicidade e do teledisco, depois de dois bons thrillers paredes meias com o fantástico, O Suspeito da Rua Arlington (1998) e A Profecia das Sombras (2001). In Memoriam nada tem a ver com esses filmes, embora se reconheça a capacidade do cineasta desenhar ambientes e definir personagens em meia-dúzia de cenas e, sobretudo, o seu enorme amor pelos actores. Ou, neste caso, por uma senhora actriz — Shirley MacLaine, para quem esta personagem de publicitária reformada, picuinhas, mal-educada, controladora, bulldozer que empurra tudo à frente, parece ter sido feita à medida.

A premissa é óptima e a primeira meia hora de filme é boa: MacLaine decide encomendar a redacção do seu obituário, enquanto ainda está viva e de acordo com as suas próprias indicações. A “vítima” a quem sai a “sorte grande” é Amanda Seyfried, aspirante a escritora que ganha a vida a fazer obituários no jornal local e que descobre que ninguém tem nada de simpático a dizer sobre a “patroa”. Daqui para a frente, In Memoriam banaliza-se progressivamente em direcção ao filme inspiracional e à lição de vida, mesmo que as guinadas para lá chegar não sejam desinteressantes e brinquem até com as próprias convenções do género. Mas há Shirley MacLaine, que faz valer as suas décadas de experiência como comediante para criar, mais do que uma personagem, uma mulher que não tem papas na língua e não pede desculpa por nada, sem escorregões nem cabotinismos desnecessários. Chama-se a isto classe, não se vê por aí todos os dias, e basta vê-la a levar tudo à frente (e Pellington a deixá-la) para In Memoriam transcender as suas limitações e se tornar em fita bem simpática. 

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