Uma declaração de circunstância

Apesar da profunda crise de identidade, a EU ainda reúne um surpreendente capital de esperança – e é aí que os líderes do continente podem e devem procurar inspiração para construir um futuro comum.

A União Europeia celebrou formalmente o aniversário com uma declaração de compromisso para o futuro. Mas a Declaração de Roma é um texto redondo que, à força dos compromissos estabelecidos, quase só afirma generalidades em boa linguagem tecnocrática europeia. Vale a pena dissecar os quatro temas que na prática funcionam como o mínimo denominador comum desta Europa alargada.

A aposta na segurança e na proteção deseja tranquilizar os cidadãos que hoje vivem com medo – mas a verdade é que não há grande coisa que se possa fazer face a actos de terror como o que esta semana ocorreu em Londres. E prometer algo que não se pode cumprir e meio caminho andado para a insatisfação generalizada.

A prosperidade será a maior exigência dos europeus, que lidam ainda com as consequências de uma crise económica que não parece ter fim à vista – e o pior é que não há acordo na forma para sair da crise, apesar de a receita da austeridade ser reconhecidamente errada. E se a UE falha na melhoria das condições de vida dos seus habitantes pode até acertar em tudo o resto, mas nunca deixará de ser um fracasso.

O compromisso da Europa social é suficientemente genérico para ser reconhecido como um sucesso, até porque é o que mais assume as diferenças nacionais e permite maior margem de manobra.

Já o último pilar da declaração, que apela a uma maior força no mundo, exigiria um esforço que hoje os membros não quererão colocar. Com a revisão orçamental que a saída do Reino Unido implica, será difícil encontrar folga para aumentar as responsabilidades civis e militares da união Europeia no mundo, algo que nem tem conseguido na sua vizinhança – como as relações com a Turquia e a crise dos migrantes comprovam.

Pelo menos a União mantém a virtude de não deixar ninguém indiferente: Roma teve na rua manifestações a favor e contra a União Europeia; Bruxelas idem; e até Londres, prestes a afastar-se da União, teve na rua os desiludidos do Brexit. E ao mesmo tempo as sondagens dizem que o sentimento pró-europeu recupera lentamente em vários países. Porquê? Porque apesar da profunda crise de identidade, a EU ainda reúne um surpreendente capital de esperança – e é aí que os líderes do continente podem e devem procurar inspiração para construir um futuro comum.

Até Outubro, nada vai acontecer. Depois das eleições francesas e alemãs, quem estiver no poder vai decidir quais são as cenas dos próximos capítulos.

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