“Salazar era um homem astuto e escorregadio”

Em A Toca do Lobo a cidade de Lisboa e o Estoril quase funcionam como uma personagem, ou cenário vivo.

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Enric Vives-Rubio

O americano Larry Loftis, advogado, é autor de livros de não-ficção. Mas decidiu escrever um thriller de espionagem e começou a investigar sobre agentes secretos durante a última guerra mundial. Encontrou o nome de um sérvio, Dusko Popov, doutorado em Direito na Alemanha, que falava cinco línguas, com um savoir faire que lhe permitia adaptar-se a quase tudo, e era sempre referida a sua elegância e charme, e o seu inevitável sucesso com as mulheres. Pelo meio das leituras aparece o nome do escritor inglês Ian Fleming, criador da figura de James Bond, e que esteve destacado em Lisboa na mesma altura em que Popov se hospedava no hotel Palácio, no Estoril. Larry Loftis leu mais sobre o sérvio, investigou, e ficou fascinado com os episódios da sua vida durante a Segunda Guerra Mundial.

Com tanto material acumulado, o thriller passou a uma biografia de Dusko Popov, não sem a sua dose de acção, história, segredos e conspirações internacionais. “A investigação e a escrita do livro [Na Toca do Lobo] demoraram cerca de três anos e decorreu em vários lugares”, disse Loftis em conversa com o PÚBLICO no hall do hotel Palácio, no Estoril, um dos cenários das acções de espionagem e de contra-espionagem mais referidos no livro. Foi a primeira vez que Larry Loftis veio a Lisboa [a investigação nos arquivos de Cascais e da PIDE foi feita por outra pessoa], e ele conhecia os locais apenas por fotografias. Assim que chegou deslocou-se de imediato ao hotel onde esteve Popov e ao casino. “Foi surreal visitar estes lugares por onde andei virtualmente durante os três anos de escrita. No hotel encontrei ainda um dos funcionários daquele tempo, já está reformado mas continua a vir aqui”, disse Loftis, visivelmente entusiasmado. “Fui também ao casino, claro, e lembrei-me das descrições que Popov faz nas suas memórias, dos lugares onde mantinha os encontros amorosos. E andei por estes jardins, que ainda existem, e em que se deu uma cena de luta com uns alemães, e uma mulher pelo meio, que trazia um envelope, que se tivesse ido parar às mãos dos germânicos provaria que ele era um agente duplo, e seria a sua morte. E descobri também uma casa que julgava já não existir, mas que agora não tenho dúvidas que é o palácio onde Popov quase ia sendo abatido pelo major von Karsthoff. É uma ruína abandonada.”

Em A Toca do Lobo a cidade de Lisboa e o Estoril quase funcionam como uma personagem, ou cenário vivo. Quisemos saber da importância destes lugares na vida dos agentes secretos. “Tudo passava por aqui, isto era um ninho de víboras domesticadas, conviviam socialmente mas todos sabiam que não havia perdão. Aturavam-se enquanto fossem úteis uns aos outros. Portugal, com a sua política de neutralidade, foi o único país que ganhou com a guerra. As reservas de ouro – ouro vindo da Alemanha por pagamento do volfrâmio exportado – eram colossais. Salazar era um homem astuto e muito escorregadio”.

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