Dar nas vistas

Os Olhos da Minha Mãe é uma homenagem, cheia de pose, à aristocracia cinematográfica do gótico e do macabro - cheia de pose, e cheia de mais coisa nenhuma.

Mera compilação de situações do cinema de terror – <i>torture porn, psycho killers</i>
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Já perto do fim, o som de um televisor ligado na casa dos protagonistas deixa ouvir a voz de Vincent Price (num filme de William Castle, House on Haunted Hill). Os televisores ligados já vinham a “comentar” a acção de Os Olhos da Minha Mãe desde o princípio mas esse é o momento em que, convocando aquela linhagem do cinema de horror (os filmes de Castle, de Roger Corman, os primeiros Tim Burtons…) de que Price se tornou um símbolo, Nicolas Pesce denuncia ao que vem: a homenagem, cheia de pose, à aristocracia cinematográfica do gótico e do macabro. Cheia de pose, e cheia de mais coisa nenhuma, porque o filme é dum exibicionismo juvenil e liceal, apenas uma enorme e muito fotogénica superfície (a preto e branco, evidentemente) que parece guardar sempre a esperança (vã) de que tanta fotogenia, tanto enquadramento milimetricamente calculado (incluindo uns quantos picados a 180º, ostensivos e gratuitos, mas de efeito sempre “belíssimo”), tanto movimento de câmara vagaroso (porque se nota melhor assim, e sempre dá para que os críticos se ponham a falar de “slow cinema”), esconda o irremediável vazio por baixo de toda a pompa. Um vazio que é uma mera compilação de situações e lugares comuns do cinema de terror – um bocadinho de torture porn, um bocadinho de psycho killers, e como protagonista uma pobre menina tresloucada que guarda com afecto os cadáveres do pai e da mãe (Psico! Hitchcock! Wow!), numa chave de loucura psicanalítica que explica a sua “fixação ocular”.

Depois, a cereja em cima do bolo, por certo especialmente apreciada em Portugal: a única coisa que define (?) as personagens é a sua origem portuguesa, completa com frases ditas em português (embora num sotaque esquisito), fado na banda sonora (Amália) e imagens de Nossa Senhora de Fátima – enfim, falta Eusébio e o futebol, esquecimento que só não consideraremos aviltante da identidade nacional porque apesar dos progressos dos últimos tempos ainda não se trata de um desporto muito conhecido nos EUA. Não são estes clichés simplórios que fazem o filme mau, mas francamente também não ajudam nada a levantá-lo da sua pobreza exibicionista.

É uma primeira obra, tem padrinhos com pedigree (Antonio Campos é um dos produtores), e a julgar pelo frisson – é ver o rasto de admiração que tem deixado na net, por exemplo – deve estar a cumprir bem o seu papel de anúncio da chegada de mais um “prodígio”. Compreende-se a necessidade e a vontade de dar nas vistas, mas não era preciso levar a expressão à letra: não se devia dar assim nas vistas dos espectadores.

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